O futuro incerto dos ERPs nacionais após a era fiscal

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Nos últimos anos, vimos os fornecedores de sistemas de gestão (ERPs) no Brasil em ritmo acelerado para fazer com que seus softwares pudessem auxiliar seus clientes a acompanhar e atender às exigências fiscais, com particular destaque ao Sped — Sistema Público de Escrituração Digital, que apertou o cerco sobre as empresas que possuíam seus processos defasados ou que burlavam o fisco.

É fato também que o governo, com as medidas para aumentar o controle sobre a arrecadação dos impostos, se tornou um "aliado indireto" dos fabricantes de ERP para as pequenas e médias empresas (PMEs), que viram suas vendas aumentarem porque elas precisaram investir em sistemas atualizados para atender às demandas fiscais. Soma-se a isso, o chamado custo Brasil, que tem como um dos pilares a altíssima complexidade fiscal, que teve seu auge com o advento da NF-e e do Sped.

Este cenário acabou criando dois grupos de empresas na indústria nacional de ERP para PMEs:

1) As condenadas: centenas de pequenas empresas que não conseguiram acompanhar as demandas fiscais, foram perdendo seus clientes e devido a essa deficiência, foram condenadas a morte;

2) As sobreviventes: fabricantes de ERPs nacionais que tiveram um crescimento elevado ao ganhar cada vez mais mercado, devido a obrigatoriedade fiscal imposta às PMEs.

As sobreviventes comemoram hoje a dificuldade e quase impossibilidade de novos concorrentes globais entrarem no país, criando uma espécie de reserva de mercado a elas. Mas a questão para as empresas sobreviventes é: Será que toda essa comemoração não as impossibilita de enxergar o que vem pela frente? Até que ponto o excesso de preocupação concentrada nas evoluções fiscais não afetou a visão do que temos pela frente, e, com isso, condenar o próprio futuro dos ERPs brasileiros?

Explico. O que temos visto é que essa excessiva preocupação com questões fiscais vem impossibilitando os fabricantes de ERP a se preocuparem com novas tecnologias e com funcionalidades destinadas à melhoria da aplicação e do desempenho dos negócios. Todos os recursos têm sido canalizados para dar conta da alta demanda necessária para manter as questões legais em ordem, não sobrando tempo para outras evoluções tecnológicas como levar seu ERP para a nuvem, mobilidade corporativa, entre outras coisas. Também não há fôlego para evoluir o ERP em funcionalidades necessárias para melhorar a sua performance para os negócios, tais como o CRM, logística, mobilidade, BPM, por exemplo.

Parece-nos natural a estratégia do governo de aumentar a informatização para diminuir a informalidade, aumentar a arrecadação ao combater a sonegação a partir da informatização fiscal, para num segundo momento poder simplificar a complexidade fiscal e diminuir o custo Brasil, condição necessária para recolocar o país no mercado competitivo.

A simplificação da complexidade fiscal ajudará a acabar com a virtual reserva de mercado que acabou sendo criada por novos processos fiscais informatizados, poderá deixar de existir. Mas também ficará "escancarado" aos fornecedores de ERP globais, que por terem canalizado seus investimentos em evoluções de funcionalidades de negócio e tecnologia facilmente irão avançar sobre o mercado de PME, colocando os fornecedores nacionais de sistemas de gestão em desvantagem competitiva.

Faz-se necessário cumprir com as obrigações de hoje, mas é estritamente necessário projetar o campo de batalha que ocorrerá daqui a dez anos, por exemplo? Os ERPs brasileiros irão sobreviver a esta "abertura do mercado"?

*Rodney Repullo é CEO da Magic Software Brasil.

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