Novo Cadastro Positivo não garante queda do spread bancário, dizem especialistas

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O Projeto de Lei Complementar 441/17, que trata sobre o Cadastro Positivo fará com que todas as instituições financeiras tenham de enviar os históricos de operações de crédito de seus clientes para bureaux de crédito, como Serasa, SPC e Boa Vista, sem a necessidade de autorização específica. Para ser excluído, cada correntista terá de encaminhar uma solicitação nesse sentido. Na versão atual da lei, a inclusão se dava mediante pedido do consumidor.

A justificativa apresentada pelo relator da medida na Câmara, deputado Walter Ihoshi (PSD-SP), é que, por meio do fornecimento do score (classificação de risco do cidadão) pelos bureaux às instituições, bons pagadores tenham acesso a crédito mais barato.

"O cadastro positivo é uma grande ferramenta já usada em países desenvolvidos. No entanto ele só vai surtir um efeito benéfico se o sistema financeiro o usar de forma apropriada. Há o medo de que isso não sirva para a redução do spread bancário por não ser usado do modo correto.", diz Domingos Monteiro, CEO da Neurotech, empresa que utiliza Inteligência Artificial para mensuração de risco de crédito.

"Há a separação do joio do trigo, mas o trigo pagará a mesma taxa do joio?", questiona. Segundo ele, o sistema financeiro dispõe de várias ferramentas para identificar o perfil do tomador de crédito e continuam ampliando os investimentos em análise de dados. "Isso é irreversível. Quem não investir vai ficar para trás. Essas soluções, porém, não são utilizadas hoje para a redução da taxa de juros. Servem, somente, para a garantia de concessão de crédito, o que acaba levando o bom pagador para a vala comum no que se refere aos juros", observa.

Monteiro considera que o Cadastro Positivo pode resultar em redução do spread, mas não a partir de bancos e financeiras. Para ele, serão as fintechs de crédito – que acabam de ser reguladas pelo Banco Central – que poderão capitanear esse movimento. "A partir de uma análise mais completa, poderão surgir fintechs dispostas a trabalharem com juros variáveis", avalia. "Por outro lado, os bureaux terão de se tornar mais eficientes para terem inteligência e elaborarem os scores", diz.

Se o PLP for aprovado, os bureaux receberão as informações e só estão impedidos de fornecer informações ou usarem esses dados para fins comerciais. Eles só poderão passar o score do cliente. "Quem se diferenciar no mercado será aquele que tiver mais inteligência para atribuir o score", diz o executivo.

Uso de dados pessoais

Já o advogado especialista em Direito Digital Victor Hugo Pereira Gonçalves aponta que o PLP do Cadastro Positivo vai de encontro a regulamentações já existentes e outras que estão em discussão no Congresso. "A aprovação do PLP, somado ao Marco Civil da Internet, de 2014, e ao PL 5276/2016 (que trata sobre uso de dados pessoais), criará uma panaceia de leis sobre dados pessoais, com uma contradizendo a outra, o que resultará em insegurança jurídica e desrespeito aos objetivos da Constituição quanto ao direito dos cidadãos", afirma.

Segundo Gonçalves, embora os bureaux não possam revelar o histórico de crédito dos consumidores, a divulgação da classificação dos consumidores fere o princípio constitucional da privacidade, bem como das regras protetivas previstas pela versão atual da Lei de Cadastro Positivo.

O advogado observa ainda que o PLP não exigiu cuidados quanto à segurança da informação que serão encaminhadas aos Bureaux. "Grandes empresas já tiverem seus sistemas invadidos, caso de Twitter e Facebook. Não há elementos que demonstrem o preparo dos bureaux quanto à inviolabilidade de seus sistemas", afirma. Segundo o advogado, o PLP tende a aumentar ainda mais o poder de mercado dos bureaux, que são pouco no país. "Ademais, a lei é inócua. O objetivo do cadastro positivo era reduzir o spread bancário e aumentar o número de pessoas com acesso a crédito. Isso não aconteceu. Agora, eles ampliam o acesso dos bureaux às informações sem que eles paguem por isso", conclui.

Setor financeiro terá de investir em tecnologia

"O texto, que altera a Lei de Sigilo Bancário e a Lei do Cadastro Positivo, tornará o cadastro obrigatório, afetando a forma como as instituições financeiras enviam informações de seus clientes aos órgãos reguladores", explica Heitor Moura, gerente de Sistemas da Senior Solution, empresa que desenvolve tecnologia para o setor financeiro.

A partir da nova lei, todo cidadão que realizar alguma transação financeira passa a fazer parte do Cadastro Positivo, a não ser que peça para ser retirado. Assim, os gestores de bancos de dados terão acesso a todas as informações sobre empréstimos quitados e obrigações de pagamento que estão em dia de pessoas físicas e jurídicas para formação do histórico de crédito. Como o volume de informações da instituição aumentará consideravelmente, será preciso adotar controles de informações e automatização dos processos. "Será necessário controlar o registro de compromissos financeiros, tais como pagamentos relativos às operações de crédito e obrigações de pagamento, liquidadas ou em andamento, de Pessoas Físicas ou Jurídicas", explica o executivo.

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