Quem achava que a queda-de-braço entre a indústria de tecnologia dos EUA — mais especificamente as empresas do Vale do Silício — e o FBI havia chegado ao fim com o desbloqueio do iPhone da Apple usado por um dos atiradores que mataram 14 pessoas de San Bernardino, na Califórnia, no início de dezembro do ano passado, está completamente enganado.
A nova disputa que promete acirrar os ânimos entre as partes é uma proposta do governo de mudança na lei de vigilância, conhecida como Ato de Privacidade das Comunicações Eletrônicas (ECPA – Electronic Communication Privacy Act), que daria autorização à polícia federal americana para acessar o histórico de navegação na internet e outros dados eletrônicos de cidadãos americanos, sem a necessidade de um mandato de busca expedido pela Justiça.
A emenda, que será avaliada pelo Comitê Judiciário da Câmara dos Deputados dos EUA, valeria para investigações em casos de terrorismo e espionagem. Se aprovada, significa que o Departamento de Justiça poderá ter acesso aos dados eletrônicos apenas por meio da chamada "carta de segurança nacional" (cuja sigla em inglês é NSL), ou seja, um pedido que pode ser assinado por um agente do FBI no comando da determinada unidade, sem a necessidade de autorização judicial.
Os registros, além do histórico de navegação na web de qualquer cidadão, poderiam incluir dados de localização, o endereço IP do computador da pessoa, quanto tempo ela passa em cada página da internet e alguns registros de e-mail. A autorização, porém, não envolveria conteúdo, como textos de um e-mail ou buscas no Google.
Para o diretor do FBI, James Comey, a mudança na ECPA para que o FBI possa acessar o histórico de navegação web contemplaria o que já ocorre com os registros telefônicos. Segundo ele, tais dados são cobertos implicitamente pela lei atual, que foi escrita em 1986, e só explicitamente abrange dados normalmente associados a registros telefônicos. "Seria apenas a correção de um erro de digitação", disse ele ao jornal The Washington Post.
Limites à privacidade
Na noite de segunda-feira, 6, as empresas de tecnologia, incluindo Google, Facebook e Yahoo, e grupos da sociedade civil enviaram uma carta conjunta à Câmara criticando a proposta de mudança, dizendo que irão se opor fortemente a qualquer tentativa de reescrever a lei, que, segundo elas, "aumentaria o poder de vigilância do FBI e infringiria limites à privacidade dos americanos".
O texto do documento diz que a "essa tentativa de rever a NSL tem sido caracterizada por alguns funcionários do governo como mera correção de um erro de digitação na lei. Mas, na realidade, ela expandiria dramaticamente o poder do FBI de coletar informações confidenciais sobre as atividades online dos usuários, sem supervisão judicial".
A proposta de revisão da lei de vigilância é reflexo de outra batalha sobre uma pequena cláusula na lei federal, que pode afetar dramaticamente a maneira como os EUA conduzem investigações sobre terrorismo. Durante anos, o Departamento de Justiça tem contado com as controversas cartas de segurança nacional para obter certos tipos de dados rapidamente a partir de empresas de tecnologia. Estas cartas não necessitam de um mandado e muitas vezes vêm com uma ordem de "mordaça" que proíbe discuti-las.
As empresas de tecnologia reclamam que o FBI tornou-se demasiadamente dependente delas, enquanto o FBI se queixa de que as resoluções dos casos estão ficando mais lentas porque algumas empresas têm deixado de cooperar. Com imprensa internacional e agências de notícias.