O ministro das Comunicações Hélio Costa esteve nesta terça, 31/1, na Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados, em Brasília, para falar sobre TV digital. Passou o seu recado: o modelo tecnológico para a TV digital é prioritário, precisa ser decidido rapidamente e a discussão sobre um novo modelo para o setor, se tiver que ser buscado, é função do Congresso Nacional.
Hélio Costa foi claro em relação às suas prioridades. Para ele, todo o trabalho de definição do Sistema Brasileiro de TV Digital segue o que está definido, inclusive em relação aos prazos, pelo Decreto 4.901/2003, que estabeleceu o que o sistema nacional deveria ter.
O ministro foi enfático em relação à necessidade de uma televisão aberta e gratuita que ofereça as mesmas coisas hoje disponíveis pela TV por assinatura por cabo e satélites, "hoje já digitais". Segundo Costa, "a sociedade como um todo não pode ser privada destes benefícios", relembrando que ninguém discutiu os mesmos pontos quando a telefonia celular passou de analógica para digital.
Em diversos momentos, o ministro defendeu a tese de que houve um grande debate sobre o tema, "e só não participou quem não quis".
Citou as reuniões dos diferentes comitês, o trabalho das universidades e o trabalho político realizado agora. "O melhor padrão para o Brasil é o que atende o decreto", disse, lembrando que essa é uma decisão do presidente Lula, "que pode fazer um gol de placa, um gol devagar, que ninguém vai ver, ou chutar para fora".
Exportação não é prioridade
Costa disse que o único ponto de divergência em relação ao padrão a ser adotado no Brasil diz respeito à modulação. Segundo ele, há uma solução ainda distante apresentada pelos pesquisadores da PUC do Rio Grande do Sul, a modulação do padrão japonês e a modulação COFDM. Ele ressaltou que os estudos não apresentaram divergências em relação à camada de transporte e conversão.
A camada do middleware será provavelmente baseada em uma solução brasileira e a camada de aplicativos é livre em todos os países, cada qual escolhendo as aplicações que desejar. Ele ressaltou o problema dos prazos. "Estamos ficando atrasados nessa questão".
Costa rechaçou as críticas de que faltaria uma definição sobre política industrial com uma declaração no mínimo polêmica: "É preciso acabar com o mito de que a TV digital vai influenciar na produção de equipamentos", disse.
"Ao contrário de alguns setores do governo, acho que não seremos grandes exportadores de televisores", afirmou o ministro, ressaltando que esta função caberá à China. Além disso, diz Costa, qualquer que seja o padrão adotado, a diferença de custo entre eles é de US$ 8 a US$ 10, de modo que as fábricas no Brasil poderão produzir qualquer tecnologia.
ISDB cedeu mais
Costa destacou algumas conquistas, segundo ele, conseguidas na negociação com os padrões. A oferta do DVB seria de uma linha de crédito de 300 milhões de euros pelo Banco Europeu, mais desconto de 50% nos royalties pagos e assento no conselho de decisão de tecnologia.
O ISDB sinaliza com o mesmo volume de financiamento, mas, segundo Costa, oferece também a possibilidade de transferências de tecnologia para produção de equipamentos no Brasil, sem o pagamento de royalties e também com assento no conselho de definição tecnológica.
Além disso, diz Costa, o padrão japonês estaria disposto a incorporar a solução de MPEG 4 e o middleware desenvolvidos no Brasil.
O padrão norte-americano, diz Costa, não disse ainda nada sobre financiamento, royalties e decisão tecnológica.
Sem envolver outras áreas
O deputado Ricardo Barros (PP/PR) aventou a possibilidade de que o Brasil exija contrapartidas em outros setores para definir um padrão (por exemplo, no setor agrário). Hélio Costa, contudo, deixou claro que isso não está sendo feito e nem será.
À deputada Luiza Erundina (PSB/SP), Costa respondeu a um questionamento sobre a falta de debates sobre o tema. Disse que o assunto TV digital está sendo muito debatido desde o governo FHC, que aliás poderia ter tomado a decisão e não o fez. Ele ressaltou que o governo Lula estabeleceu a TV digital como uma prioridade, "e por isso há datas no decreto a serem seguidas".
Para Hélio Costa, a discussão de uma lei, com o modelo de negócios é "função do Congresso", como em outros países, ponderou. Ele disse que os parlamentares terão que fazer a sua parte, e que o governo fez reuniões com todos os setores, em todas as instâncias, para tomar uma decisão. Costa lembrou, por exemplo, que será impossível utilizar recursos do Fust para a TV digital, a não ser que se mude a lei.
Críticas duras
As críticas mais duras ao ministro vieram dos três deputados mais ativos na Comissão de Comunicação: Jorge Bittar (PT/RJ), Walter Pinheiro (PT/BA) e Júlio Semeghini (PSDB/SP). Bittar começou seus questionamentos provocando o ministro sobre a questão da tecnologia determinar o modelo.
"Não existe tecnologia neutra", disse o deputado. "A decisão tomada agora orienta o modelo", completou, lembrando que na questão da mobilidade e da portabilidade, se o Brasil adotar a solução japonesa, poderá perder a chance de introduzir novos players no mercado para explorar, por exemplo, a possibilidade de uma rede independente de transmissão de TV digital.
Hélio Costa não respondeu a este questionamento.
Walter Pinheiro defendeu mais prazo para que se possa tomar "uma decisão de Nação, e não de governo". Ele considera que essa é a chance de "limpar o espectro, introduzir novos players e implantar um novo modelo para a televisão".
Por exemplo, pediu uma plataforma tecnológica aberta, defendeu que a solução gaúcha de modulação seja considerada e pediu para que se busque um modelo onde a TV seja uma ferramenta com "conectividade, capilaridade e universalização".
Pinheiro pede para que as conclusões sobre os estudos sejam mostradas ao Congresso Nacional, o que Hélio costa prometeu fazer, quando as tiver.
Júlio Semeghini, que vinha sendo o deputado com críticas mais duras com relação ao tema, manteve o tom. Defendeu discussões políticas com o Congresso e pediu para que os ministérios do Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia e Cultura sejam mais ouvidos.