A inteligência artificial foi um dos temas mais transversais da programação do South by Southwest (SXSW) Londres 2025, como de costume nos eventos de economia criativa. Estava nos palcos de tecnologia, claro, mas também nos debates sobre cultura, sustentabilidade, futuro do trabalho, mídia, política, ciência e até espiritualidade. Em meio a essa multiplicidade de olhares, escolhi fazer um recorte para olhar para o impacto da IA no mercado de agências de comunicação. Já no Brasil e alguns dias depois do evento, ainda tento amarrar os conteúdos.
Num dos painéis mais prestigiados, o pensador e investidor Azeem Azhar, autor do livro Exponential, afirmou que a IA deixará de ser uma ferramenta opcional para se tornar uma infraestrutura básica da sociedade – algo tão presente quanto a eletricidade ou a internet.
Segundo ele, estamos caminhando para uma era de inteligência sob demanda: um tempo em que todo indivíduo e toda organização poderá acionar raciocínios complexos, análises e decisões em segundos, como quem acende a luz de um cômodo. Essa lógica muda tudo: o tempo da criatividade, a forma de tomar decisões e o próprio conceito de agência.
Voltando ao nosso setor, Mark Read, CEO global da WPP, foi direto ao dizer que menos pessoas farão o trabalho que fazemos hoje. Mas também foi claro ao afirmar que novos empregos surgirão e, com eles, novas formas de valor, entrega e remuneração. A própria WPP está liderando essa virada com investimentos de mais de US$ 400 milhões anuais em IA, reconfigurando a lógica de criação e mídia por meio da plataforma WPP Open. Não é só uma mudança de ferramenta, mas uma mudança de cultura e de estratégia, com investimentos robustos e direcionados.
No Brasil, essa transição também já começou, impulsionada pelos grupos globais ou não. Muitas agências têm buscado consultorias especializadas para acelerar a virada de cultura, processos e competências. Estão em busca de se reposicionar como IA-first, não apenas para implementar tecnologias, mas para reestruturar seu modo de pensar, operar e entregar valor.
Enxergo que essa virada só se concretizará de forma coletiva. Nenhuma agência fará essa travessia sozinha. Será preciso colaboração setorial, compartilhamento de aprendizados, criação de novos pactos de mercado e um esforço conjunto para transformar a lógica competitiva em uma lógica de ecossistema. A IA desafia o modelo de agência isolada e exige uma construção conjunta de inteligência, ética e inovação.
Na prática, o que estamos vivendo é uma transição profunda. Antes, trabalhávamos com planejamentos anuais, grandes escopos fechados e um workflow linear: briefing, criação, entrega e resultados. Agora, a IA nos empurra para ciclos muito mais curtos e iterativos, com análises preditivas em tempo real. O planejamento mensal ou anual virou um organismo vivo e adaptável que aprende com a jornada guiada por dados.
As áreas antes estanques como criação, mídia e estratégia agora precisam operar de forma integrada, com times modulares e orientados por dados e propósito. A ideação, que antes era quase exclusivamente fruto de brainstorms presenciais, passa a incorporar IA generativa, simulações rápidas e testes A/B contínuos que otimizam o conceito em tempo real.
O mesmo vale para as métricas: saímos de uma lógica de vaidade, baseada apenas em alcance e impressões, e passamos a olhar para impacto reputacional, influência real e valor social gerado. Isso muda também o modelo de remuneração: se antes cobrava-se por hora ou por entrega pontual, agora cresce a cobrança por valor gerado, por transformação percebida, por construção contínua de reputação. Novos KPIs estão sendo desenhados sob medida para cada objetivo do negócio.
Até mesmo o processo criativo foi ressignificado. Aquela criação artesanal, isolada, que levava semanas para se consolidar, agora divide espaço com a cocriação entre humanos e máquinas, sendo mais veloz, mais responsiva, mais personalizada em escala. O fluxo linear foi substituído por um fluxo em rede: mais colaborativo, mais sensível aos contextos, mais aberto ao refinamento contínuo.
Entendendo que essa travessia exige colaboração. Na Oficina, já começamos a operar essa transição. Lançamos uma Rede de Reputação e Influência, um modelo community as a service, em que especialistas, dados e tecnologia trabalham juntos sob medida para os objetivos de cada cliente. Inspirado pela nova economia, esse modelo entende que a entrega de valor hoje é compartilhada nesse mundo disruptivo.
Mas nenhuma tecnologia será suficiente se não houver líderes dispostos a colidir ideias, provocar o pensamento e reconectar a comunicação com aquilo que ela tem de mais potente: o poder de criar vínculos reais e genuínos.
Liliane Pinheiro, CEO da Oficina Consultoria.
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