União é condenada por omissão na defesa dos consumidores em processo do MPF contra a Microsoft

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A Justiça Federal condenou a União por ter se omitido em apurar e reprimir violações aos direitos do consumidor cometidas pela Microsoft. Em 2018, o ente federal e a empresa haviam sido processados após o Ministério Público Federal (MPF) constatar que a licença do Windows 10 permitia à Microsoft coletar grande número de dados pessoais de seus usuários, sem seu consentimento expresso e informado. Após ser acionada, a Microsoft fechou acordo com o MPF para adequação do sistema operacional aos requisitos de privacidade da lei brasileira. Mas a União seguiu respondendo ao processo, por não cumprir o seu dever de fiscalizar a empresa e por ter sido negligente na defesa dos consumidores do Windows 10. Nesta semana, a Justiça Federal reconheceu a omissão da União, impondo o pagamento de R$ 100 mil como indenização pelos danos morais causados à coletividade.

A omissão do ente federal já havia sido percebida durante o inquérito civil instaurado pelo MPF para apurar o caso. Ainda em 2016, a Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor (Senacom) foi questionada sobre se havia adotado providências para coibir a invasão de privacidade promovida pela coleta indiscriminada de informações viabilizada a partir do uso do Windows 10. Na ocasião, porém, o órgão informou que "a questão era complexa" e se limitou a "propor" à Microsoft que "reforçasse as ações nesse sentido", sem instaurar qualquer procedimento para investigar o caso e aplicar eventuais sanções administrativas.

No processo, a Senacom mencionava expressamente que "não se furtou a atuar na defesa do consumidor", mas "apenas não o fez por meio de processo administrativo sancionatório". Mas para a Justiça Federal, ao adotar simples recomendação à Microsoft, sem a instauração de processo para apuração dos fatos, o órgão da União de proteção e defesa ao consumidor "praticamente se isentou de atuar", em uma atitude absolutamente desproporcional às suas competências e atribuições diante da gravidade dos fatos.

A sentença também destaca que, se não fosse a ação do MPF, nenhuma das melhorias que a Microsoft implementou após fechar o acordo teria ocorrido, e a intervenção sobre a privacidade dos usuários do Windows 10 seguiria até hoje. "Efetivamente, a atuação do Departamento Nacional de Proteção ao Consumidor, no caso, restou aquém do esperado, de forma a caracterizar efetiva omissão no tocante à apuração e cobrança de atuação da Microsoft", afirmou a juíza federal Cristiane Farias Rodrigues dos Santos.

Para o procurador da República Yuri Corrêa da Luz, hoje responsável pelo caso, a sentença é um precedente importante que confirma que a União, por meio de diferentes órgãos, tem o dever de fiscalizar, prevenir e reprimir, com efetividade, práticas indevidas que violem a privacidade de usuários do mercado de aplicações digitais. Ao condenar a União por sua omissão em relação ao Windows 10, a Justiça Federal aponta para a importância do engajamento do Poder Público federal na garantia de um direito cada vez mais importante na atualidade: o de proteção de dados pessoais dos cidadãos e das cidadãs.

Entenda o acordo celebrado após ação do MPF – Depois de ter sido acionada na Justiça Federal, a Microsoft celebrou, em 2020, um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público Federal. Com o acordo, a empresa se comprometeu a tornar mais transparentes os procedimentos de coleta de informações, tratando os dados pessoais dos usuários do Windows 10 conforme a legislação brasileira. Entre as obrigações assumidas no TAC, está a de apenas coletar dados dos consumidores quando eles, de maneira informada e expressa, o autorizarem, salvo quando a coleta for estritamente necessária à correção de falhas no sistema operacional.

A empresa também assumiu a obrigação de modificar, ainda em 2020, a interface de instalação do Windows 10, permitindo aos usuários escolherem entre modos de fornecimento mais ou menos restritos de seus dados. Além disso, se comprometeu a comunicar, de forma clara, precisa e acessível, quais são as informações pessoais recolhidas pelo software e qual seria o propósito da coleta, devendo o tratamento dos dados ser limitado ao mínimo necessário para o alcance dessa finalidade. O objetivo, com isso, era deixar claro que as diversas informações sobre os usuários, como geolocalização, hábitos de navegação e histórico de buscas realizadas na internet, somente podem ser utilizadas ou coletadas com seu expresso consentimento. Assim, as violações imputadas à empresa passaram a ser corrigidas por meio do TAC celebrado, que segue sob fiscalização.

A ação civil pública que deu origem ao acordo foi ajuizada pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo.

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