O Idec (Instituto de Defesa de Consumidores) manifesta preocupação com as análises da nova publicação da pesquisa TIC Domicílios 2024, que escancaram a persistência de profundas desigualdades no acesso à internet no Brasil. As disparidades por região, renda, raça e gênero continuam a limitar o exercício pleno de direitos no ambiente digital, afetando de forma desproporcional mulheres, pessoas negras e famílias de baixa renda.
Embora o acesso à internet tenha se expandido nos últimos anos, o crescimento é marcado por assimetrias estruturais. A pesquisa mostra que enquanto a conectividade é quase universal entre os mais ricos, entre os domicílios mais pobres ainda há um número significativo de desconectados ou conectados apenas por celular, com pacotes limitados e com uso restrito e direcionado às grandes plataformas digitais. Entre pessoas negras e mulheres, especialmente nas periferias urbanas e em áreas rurais, o acesso também é mais precário e restrito — o que revela a dimensão interseccional da exclusão digital no país.
A nova edição da pesquisa aponta que 83% dos domicílios brasileiros tinham acesso à internet em 2024, um número que soa otimista, mas é enganador, pois a pesquisa também mostra que apenas 22% da população brasileira alcança o nível mais alto de conectividade significativa. Ou seja, ainda que tenhamos muitas pessoas conectadas, esse acesso acontece de maneira precária.
Diante desse cenário, o Idec lamenta a demora do governo federal em apresentar um Plano Nacional de Inclusão Digital que seja robusto, articulado entre ministérios, com participação social e com foco em qualidade e direitos. O Brasil segue sem uma diretriz para universalizar o acesso à internet de forma significativa, apesar da inclusão digital ser reconhecida como essencial para o acesso à educação, saúde, trabalho e participação política.
Além disso, autoridades como Anatel, Senacon e Cade seguem permissivas com práticas que aprofundam essas desigualdades, como os planos com zero-rating, que oferecem acesso "gratuito" a poucos aplicativos em detrimento da internet plena. Essas ofertas não apenas restringem a liberdade de escolha dos consumidores, como também comprometem a neutralidade de rede e limitam a experiência digital de milhões de pessoas, consolidando uma internet de segunda classe para os mais pobres.
A manutenção dessas práticas, somada à ausência de uma política pública estruturada e ambiciosa, revela a falta de compromisso do Estado e de órgãos reguladores com a redução das desigualdades digitais. A inclusão digital não pode ser tratada como uma externalidade de mercado ou como um favor das operadoras. É uma política de direitos, que exige financiamento público, regulação eficaz e compromisso com a justiça social.
O Idec seguirá monitorando e denunciando os retrocessos na agenda de conectividade significativa e cobrando dos poderes públicos a construção de um modelo de inclusão digital que seja universal, igualitário e centrado no interesse público.