Do tácito ao explícito: o valor da informação com a transformação digital

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Uma das características da transformação digital é o acesso a uma série de informações, vindas das mais variadas fontes.  Essa facilidade pode ser revertida em resultado positivo ou negativo para o negócio, a depender da forma como será conduzida.

Há pouco mais de 20 anos, os professores japoneses Ikujiro Nonaka e Hirotaka Takeuchi tornaram explícito o processo tácito de transferência do saber: por meio da teoria de gestão do conhecimento, contada ao mundo na obra "The  Knowledge Creating Company", explicaram como se dá  a aprendizagem a partir de duas práticas distintas.

A primeira delas – a tácita – representa o conhecimento prático individual, baseado em experiências próprias e significados absolutamente pessoais. Repassar esse conteúdo é tarefa impossível, mas pode ser parcialmente executada se a vivência for traduzida em informação assimilável – ou explícita. Uma vez absorvido, esse entendimento se transmuta novamente, desta vez de explícito para tácito. E o processo de transferência tácito-explícito continua, no que é representado por uma espiral. Quanto mais adiante na espiral, mais aquela pessoa, empresa ou sociedade caminha para elevação da sabedoria.

Para exemplificar como o processo se dá, cabe aqui uma óbvia, porém apropriada, explicação. O que Nokana e Takeuchi fizeram ao escrever o livro sobre gestão de conhecimento foi exatamente a aplicação de sua teoria:  observaram a prática do conhecimento (tácita) e criaram uma teoria (explícita)  que resume o processo. Quase uma metalinguagem.

Ocorre que gestão do conhecimento é um tema ainda relegado pela maioria das corporações, visto como pouco estratégico frente aos demais desafios do negócio. Mas essa visão não poderia estar mais errada.

A Xerox comprovou que esse é um assunto relevante quando, no começo dos anos de 1990, lançou o programa Eureka – a mesma interjeição proferida em momentos de grandes descobertas pelo matemático grego Arquimedes, cerca de 200 anos antes de Cristo. O maior desafio da companhia, àquela época, era o de manter suas enormes máquinas copiadoras funcionando, já que os equipamentos eram alugados e a receita advinda da participação na produção. Um exército de técnicos tentava a duras penas impedir que as máquinas ficassem paradas por muito tempo.

O Eureka era uma plataforma de gestão do conhecimento para coletar e agregar informações da equipe de campo. Para que não houvesse perda de tempo na resolução de problemas diante da difícil tarefa de garantir a comunicação de uma equipe descentralizada, o conhecimento tácito dos técnicos era transformado em explícito e compartilhável entre todos. Isso serviu não somente para agilizar a manutenção, mas também de fonte de informação para o departamento de engenharia melhorar novos projetos.

A Xerox avançou na espiral do conhecimento e economizou milhares em investimentos.

A transformação digital traz um complicador a essa equação: a maior parte das informações geradas pelos mais diferentes dispositivos inteligentes – smartphones, sensores de Internet das Coisas, aplicações etc – é porcaria.

O mercado, ou a sociedade como um todo, precisa processar a informação relevante de forma correta e tempestiva para que, como a Xerox, consiga reverter a metodologia em resultados financeiros. E é aí que vem o grande x da questão: se não houver alguém que agregue valor, amparado por conhecimento de mercado e de negócios, decisões corporativas relevantíssimas serão tomadas com base em puro lixo.

Para facilitar esse caminho, é necessário  ter em mente que, com a digitalização, é preciso haver uma transformação das pessoas, feita pelas pessoas e para as pessoas. O foco tem de ser o valor gerado ao consumidor. Se uma decisão não vai ajudar ninguém a viver melhor – seja na particularidade setorial que for – não vale a pena. Essa mira diminui a margem de erro.

Hoje as empresas precisam alavancar conhecimento tácito e explícito para que a roda continue girando; a tração extra da transformação digital acelerou antiga e poderosa iniciativa, a reengenharia de processos (Hammer, 1990: Do not Automate, Obliterate !, sobre alavancar fluxos de trabalho com redesenho + tecnologia, evitando "asfaltar o caminho da roça"). Num cenário de transformações aceleradas, o perigo é ficar perdido no meio da espiral do conhecimento, que gira cada vez mais rápida.

Joel Oliveira, diretor comercial e de alianças da Sistran.

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