A inteligência artificial tem gerado diversos debates e projeções – algumas positivas, outras fatalistas – e também incertezas sobre seu real impacto nas pessoas. Quando o assunto é trabalho, os temores acerca da "substituição" do homem pela máquina podem gerar desengajamento dos colaboradores. Mas tudo indica que essa talvez não seja a principal mudança que a IA trará para a sociedade. Li recentemente que o MIT já sinalizou que apenas 23% das tarefas manuais seriam economicamente atraentes para serem automatizadas com IA, ao menos no curto prazo.
Por outro lado, há consenso em duas tendências específicas. Uma delas é a ampliação da produtividade, sobretudo pela possibilidade de automação de tarefas repetitivas e pelo auxílio na tomada de decisão – ou seja, tendemos a economizar tempo com o que nos "robotiza". A outra diz respeito ao papel relevante da IA na área da saúde, que já utiliza aplicações voltadas para o enfrentamento do câncer.
Um estudo global da AI Snapshot sobre a relação entre IA e produtividade no trabalho mostrou que, no Brasil, a percepção de ganhos com a tecnologia já é maior que em outros países. Cerca de 81% dos brasileiros afirmam que a IA aumentou sua produtividade – número que supera a média global, de 71%.
O que ninguém sabe ainda é como a IA vai impactar as oportunidades de trabalho, especialmente entre diferentes classes sociais, assim como as consequências que isso trará. Por exemplo: a "engenharia de prompt" poderá substituir analistas e especialistas? As decisões estratégicas passarão a ser tomadas com base em IA
Embora substituir pessoas por algoritmos – onde isto for possível – possa parecer técnica e economicamente tentador, ao mesmo tempo isso também poderá reduzir a capacidade de consumo da sociedade e trazer prejuízos à economia.
Há, ainda, vários outros pontos a discutir, como privacidade, necessidade de defesa contra a desinformação gerada por IA, ampliação da desigualdade social, os impactos ambientais do alto consumo de energia, indefinições sobre direitos autorais, entre outros. Certamente, esses temas estarão em pauta nos próximos anos.
Em resumo, diria que essas informações nos levam a um grande indicativo: com a evolução da IA no âmbito do trabalho e da medicina, tendemos a ter mais tempo "livre" e, provavelmente, mais anos de vida no futuro. Se isso será bom ou ruim, é cedo para afirmar. Vai depender de nós e do que faremos com esse tempo.
Nos ocuparemos trabalhando mais? Ou será que aproveitaremos esses momentos com amigos e família? Não tenho a pretensão de ter respostas, mas, como entusiasta dos estudos sobre longevidade, torço para que os brasileiros compreendam que mais tempo pode significar mais oportunidades para se planejar o amanhã, da saúde às finanças.
Cesar Gon, executivo de TI e expoente brasileiro nesse debate em escala global, aponta que a IA pode ter um papel na sociedade que parece contraditório: torná-la mais humana. Segundo ele, as habilidades técnicas se tornariam uma "commodity" tecnológica, atribuídas às máquinas, enquanto habilidades mais humanas seriam cada vez mais exigidas pelas lideranças, como criatividade, empatia e capacidade de gerar propósito compartilhado. Faz sentido.
Penso que esse "empurrão" rumo a trocas e experiências mais humanas traz consigo a oportunidade de solucionarmos um grande desafio: sabemos que vamos viver mais, mas ainda não encontramos o ritmo para trazer mais qualidade para esses anos "extras".
Desvendar esse segredo passa por entender que estamos caminhando para um futuro em que não precisaremos mais performar como robôs o tempo todo. Deixar que as máquinas façam o trabalho das máquinas talvez seja o caminho para alcançarmos o tão sonhado equilíbrio.
Afinal, o que é ser humano além de saber equilibrar e ponderar o imponderável? E saber equilibrar é ter a chance não apenas de viver mais, mas também de viver melhor. Se a IA ajudar a humanidade a entender isso, terá cumprido seu maior papel.
Alexandre Vilardi, Vice-Presidente Corporativo da Icatu Seguros.