Não é novidade que cada vez mais as soluções voltadas para o atendimento ao cliente (Customer Experience, ou CX, na sigla em inglês) estejam integradas à Inteligência Artificial. Mas isso, necessariamente, não significa que em breve não teremos mais o atendimento humano no call center. Pelo contrário: quanto mais a área de CX se aproxima da IA, mais teremos o atendimento humano como o principal vetor de qualidade para o cliente.
A ideia de que a IA vai substituir o atendimento humano provavelmente vem do fato de que CX foi uma das primeiras indústrias a incorporar a tecnologia na rotina de trabalho – e é fácil entender que esse movimento não aconteceu com o objetivo de substituir o atendimento das pessoas pela IA.
A implementação da IA em CX aconteceu porque essa é uma das áreas que mais envolvem tarefas repetitivas e que podem ser facilmente automatizadas. Além disso, o grande volume de interações permite que pequenas melhorias, proporcionadas pela IA, se transformem em um diferencial significativo. Em um call center, automatizações simples podem economizar minutos preciosos, permitindo que os agentes foquem no que realmente importa: ouvir o cliente, em vez de perder tempo preenchendo telas no sistema, por exemplo.
No que tange ao comportamento do consumidor, a pandemia acelerou a integração da IA – agentes remotos e um volume enorme de atendimentos, disparados pela mudança drástica de hábitos na época, fez com que contact centers em todo o mundo tivessem um aumento de 48% no volume de interações, segundo dados do Google, incluindo telefone, chat, e-mail, redes sociais e SMS. A saída foi agregar mais tecnologia – não só no atendimento ao cliente, como em várias outras áreas. Ademais, o uso da IA no atendimento ao cliente proporcionou uma redução nos custos de 30%, o que é extremamente relevante num mercado tão competitivo.
E, hoje, a IA tem um valor inestimável para CX que vai além do atendimento ao cliente: a tecnologia possibilita o tratamento massivo de dados, para a descoberta de insights para o negócio que até poucos anos atrás não seriam visíveis tão facilmente.
Os dados são a chave
Para além da questão da automação, há um outro fator em um call center que faz com que haja um terreno fértil para o uso da Inteligência Artificial: os dados. Imagine que, além do seu histórico de interações, de informações sobre compras, um call center pode ter vários outros dados, como o lugar onde você mora, números de documento, sua idade, gênero, entre outros aspectos mais comuns.
Também não é incomum as empresas de call center utilizarem sistemas que capturam o sentimento do cliente por telefone, ou pelo tom de mensagens escritas. A tecnologia, na realidade, existe há anos – e o problema sempre foi cruzar essas informações de maneira que fosse possível ter insights que fizessem diferença ao negócio.
E justamente um dos grandes avanços da IA em CX tem sido a análise preditiva com base na coleta de dados, que permite um suporte proativo ao antecipar necessidades futuras dos consumidores.
Examinando dados históricos, padrões de comportamento e feedbacks dos clientes, a IA consegue prever suas futuras demandas, possibilitando às empresas um atendimento proativo. Trata-se da tecnologia antecipando problemas e oferecendo soluções antes mesmo do cliente manifestar uma necessidade.
Essa gestão da base de dados, feita pela IA durante o atendimento, proporciona uma jornada mais fluida do cliente, além de gerar dados que vão pautar as estratégias de marketing. E aqui, novamente, estamos falando de uma comunicação que vai ser criada por pessoas, para pessoas.
IA versus atendimento humano
Se a integração da IA ao call center é um caminho sem volta, também é consenso no mercado que a tecnologia continuará a ser usada sim, mas sem eliminar a interação humana.
Uma pesquisa da consultoria Gartner, feita no fim de 2023 com 5,7 mil pessoas, evidencia que 64% dos consumidores preferem atendimento humano e 53% trocariam de empresa por uma concorrente se soubessem do uso de IA no atendimento ao cliente. Dos entrevistados, 60% declararam a dificuldade para serem atendidos por um humano como principal motivo de rejeição à IA, seguido por desemprego (46%), respostas incorretas (42%), segurança de dados (34%) e discriminação de tratamento entre diferentes consumidores (25%).
Apesar do avanço da IA, certas habilidades humanas ainda são consideradas insubstituíveis como a empatia e a comunicação. As melhores empresas do mundo estão usando IA para tarefas repetitivas e deixando as interações mais complexas e emocionais para os humanos, resultando em clientes satisfeitos e funcionários realizados, quando este procedimento é feito corretamente.
O grande diferencial competitivo está na responsabilidade colaborativa, ou seja, no equilíbrio entre a eficiência da IA e o contato humano. As interações humanizadas continuam sendo fundamentais para a edificação de relacionamentos de confiança com os clientes, aspecto que a IA ainda não consegue imitar.
Em resumo, a IA agrega velocidade, eficiência e a capacidade de trazer à tona informações que somam às estratégias de atendimento ao cliente, mas estão muito distantes de substituir totalmente os humanos nessa jornada. Por mais que a máquina tenha aprendido a imitar o homem, lhe falta um componente essencial: a consciência sobre suas próprias ações, e a capacidade de tomar decisões baseadas não só em dados, mas também em emoções.
Rafael Brych, Gerente de Inovação e Marketing da Selbetti Tecnologia.