A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) caminha a passos lentos, envolta em problemas relativos a infraestrutura, normatização e educação da sociedade brasileira. Este foi o cenário traçado por representantes da indústria eletroeletrônica, de empresas de reciclagem e membros do setor público durante o Forum Green Tech, evento promovido pela revista TI INSIDE e organizado pela Converge Comunicações, que aconteceu nesta terça-feira, 30, em São Paulo.
Um dos pequenos avanços, segundo o pesquisador e coordenador de projetos do CTI do MInistério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), José Rocha Andrade da Silva, foi a criação da Norma 03:111.01-009, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que será aberta para consulta pública na internet na próxima quinta-feira, 1º de novembro. O objetivo é criar requisitos para proteger o meio ambiente e, ao mesmo tempo, controlar os riscos de segurança para pessoas e ecossistemas no manejo de resíduos de produtos eletroeletrônicos. "Após três meses disponível para sugestões, a ABNT irá produzir um guia de implantação, favorecendo a criação de documentos e tecnologias operacionais complementares", explicou Andrade da Silva.
A partir dessas diretrizes, ele acredita que será possível avançar no estabelecimento de deveres e direitos de empresas que compõem a cadeia eletroeletrônica. Além disso, a criação de uma certificação e exibição de informações precisas sobre responsabilidade socioambiental de fabricantes melhorará a informação do consumidor e de empresas na compra bens eletrônicos. Munidos desses dados, espera-se que as pessoas deixem de olhar apenas o preço de produtos para determinar a escolha de compra, mas considerar o impacto socioambiental que eles causam — calculando sua vida útil e pensando nas possibilidades de descarte.
Embora seja consenso a necessidade de uma legislação que contemple o descarte dos produtos, diversas incertezas relacionadas à lei dificultam a sua efetivação. "A lei estabelece a necessidade de incluir 'catadores' e outras atividades de coleta, importantes para reciclagem. Ao mesmo tempo, o lixo eletrônico é tóxico é pode ser considerado perigoso. Então, cria-se uma situação de risco na própria redação da lei", observa André Luis Saraiva, diretor de responsabilidade socioambiental da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Além disso, ele menciona a falta de tecnologia brasileira para lidar com a extração de metais de placas de circuitos integrados, falta de política fiscal, de regulamentação de empresas de reciclagem, entre outros problemas.
Saraiva criticou também a velocidade com que a lei foi aprovada e teve seu decreto de regulamentação publicado (Decreto nº 7.404, de 23 de dezembro de 2010). "Uma lei que levou 19 anos para ser construída, em quatro meses foi publicada, visando o legado político de sua aprovação. Quem aprovasse o decreto iria colher os louros, e isso prejudicou o projeto porque não foi contemplada a complexidade do cenário nacional, nem treinados os agentes envolvidos no processo", critica.
Outro avanço apontado pelos especialistas foi o início da atuação de duas entidades para defender os interesses de outros segmentos envolvidos no descarte e manejo dos resíduos sólidos provenientes de computadores, baterias, celulares, entre outros equipamentos, e ao mesmo tempo tentar evoluir com a Política Nacional de Resíduos Sólidos. São elas a Associação Brasileira de Reciclagem de Eletrônicos e Eletrodomésticos (Abree) e a Associação Brasileira de Empresas de Reciclagem de Eletroeletrônicos (Abere). Mesmo assim, encontram dificuldades para operar plenamente.
Segundo o diretor de sustentabilidade da Abere, Marcus Oliveira, o primeiro passo para fazer com que a legislação, de fato, se cumpra reside em resolver um problema estrutural do país: a logística. "Como eu vou reivindicar a criação de uma tecnologia nacional, em parceria com universidades, por exemplo, para reciclar placas e monitores, se terei problemas para direcionar resíduos de todo o país para uma única localidade? Nesse caso, só o transporte já acarreta em emissão de gás carbônico e afeta negativamente o meio ambiente", observa, evidenciando a complexidade do sistema nacional e a falta de perspectiva para implantação no médio prazo da Política Nacional de Resíduos Sólidos.