Do jeito que está redigido, o projeto de lei (PL) de proteção de dados pessoais posto em consulta pública pelo Ministério da Justiça pode inviabilizar o modelo de negócios de serviços digitais gratuitos bancados por publicidade ou cruzamento de dados, como Gmail, Facebook, WhatsApp, Waze, Foursquare e tantos outros. A opinião é de Rafael Pellon, diretor da Associação Brasileira de Direito da Tecnologia da Informação e das Comunicações (ABDTIC) e sócio da FAS Advogados. “Ficaria inviabilizado o trade off. Esses serviços teriam que adotar um modelo de cobrança do usuário”, avalia.
“O projeto de lei procura estabelecer uma gradação entre dados mais e menos sensíveis. Isso está correto. Mas falta explicar melhor o que são esses dados sensíveis. Se não for definido direito, tudo vira dado sensível”, critica Pellon. Ele cita como exemplo o fato de a minuta do PL considerar como dado sensível informações de cunho “filosófico-moral”, o que é muito subjetivo. Por outro lado, ele concorda com a classificação como sensível de dados pessoais de caráter religioso, político e sexual.
Ao mesmo tempo, na minuta posta em consulta pública não se fala em dados de geolocalização, tão comuns hoje com os celulares e capturados por vários apps populares. “Parece ser uma lei voltada para os grandes players de Internet, especialmente redes sociais, como Facebook e Twitter. Mas deixa de lado todo o resto da vida on-line”, analisa.
Todos os serviços digitais que coletam dados pessoais precisariam exigir um consentimento prévio e expresso dos usuários para tal, mas o PL não detalha como isso deve ser feito. “Um checkbox é expresso o suficiente? Há dúvidas sobre isso”, comenta.
Pelo PL, a transferência internacional de dados pessoais também exigiria consentimento do usuário. Essa transferência acontece corriqueiramente com vários serviços na nuvem, e geralmente atende a critérios técnicos e econômicos. O tema traz de volta a discussão sobre a obrigatoriedade de uso de data centers nacionais, abordada durante o debate sobre o Marco Civil da Internet.
A consulta pública sobre o PL está aberta e vai até o fim de fevereiro. Qualquer cidadão pode participar e dar a sua opinião, através do site do Ministério da Justiça.