Os debates para aprovação do marco civil da internet na Câmara dos Deputados, na semana passada, ficaram centrados nas questões da neutralidade de rede e da exclusão da exigência da guarda de dados no Brasil, mas há alguns pontos que merecem atenção e que deveriam ser modificados enquanto o projeto tramita no Senado. Essa é a avaliação do presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Eduardo Neger, que alerta especialmente para uma possível brecha no artigo 31 do texto do relator Alessandro Molon (PT-RJ). Segundo afirmou durante o 2º Congresso de Provedores de Internet em São Paulo nesta terça-feira, 1º, uma interpretação permitiria, alegando direitos autorais, praticar a censura por meio de pedidos indiscriminados de remoção de conteúdo.
Isso porque há uma falta de legislação específica de direitos autorais para responsabilizar provedores de aplicações, como o Google, Facebook e Twitter, pela gerência desses conteúdos. O texto final do Marco Civil fala que, até a entrada em vigor dessa nova lei, "a responsabilidade do provedor de aplicações de Internet por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos, continuará a ser disciplinada pela legislação autoral em vigor aplicável na data da entrada em vigor desta Lei".
"O problema é que direito autoral é uma coisa ampla, pode ser texto, pode ser um código fonte… Como o provedor vai saber (quem é o real autor)? Pode acabar gerando certa censura disfarçada na rede", diz Neger. Ou seja, isso poderia resultar em uma série de pedidos de retirada de conteúdo indiscriminados que obrigariam empresas a optar por simplesmente remover tudo para evitar maiores problemas. "Se alguém quer censurar conteúdo aproveitando uma brecha, pode ser usada como (justificativa o) direito autoral. Na dúvida, a legislação coloca o provedor como corresponsável, e ele vai remover", detalha.
O presidente da Abranet diz que disputas poderiam até ser resolvidas em instâncias superiores, mas que isso é um processo caro. "Grandes provedores de aplicações têm departamento jurídico, mas isso pode prejudicar empresas menores", declara. Na visão dele, uma melhor definição das regras poderiam resolver a questão. "Problema é detalhar. Quanto mais cutuca, mais abre brechas. É como a neutralidade: tem de ser um problema principiológico."
Neger acha difícil prever se haverá mudanças no projeto de lei no Senado – o prazo para emendas vai até a quinta-feira, 3. Ele explica que a Abranet tem um grupo de estudos jurídicos para analisar pontos visando propor melhoria na redação. "A grande preocupação são alguns detalhamentos para evitar interpretações equivocadas. É importante prever e não deixar nenhum tipo de brecha", reforça.