Que empreender no Brasil não é uma tarefa fácil todo mundo já sabe. O que muitos não têm ciência é o quanto são complexos os desafios até tornar uma startup relevante em seu mercado de atuação. Para trilhar esse caminho é preciso de inovação, foco e muito jogo de cintura do empreendedor para driblar, por exemplo, os conhecidos processos burocráticos do país e a baixa disponibilidade de crédito barato.
Diante desses problemas estruturais enfrentados pelos brasileiros, a iniciativa privada teve um papel muito importante na constituição do ecossistema, principalmente em São Paulo. A natural força econômica propiciou que todos os elos da cadeia habitual de empreendedorismo se instalassem na cidade, como investidores anjos, aceleradoras, empresas de venture capital, grupos de private equity, associações e também infraestruturas operacionais como espaços de coworking. Esse esforço de trabalho fez com que a capital paulista alcançasse a 12ª posição entre os mercados mais promissores para startups do mundo, num ranking liderado, obviamente, pela região do Vale do Silício, de acordo com a consultoria especializada A Arte da Marca.
Apesar do bom posicionamento no quadro geral de São Paulo, muito ainda precisa ser feito para que o Brasil assuma de vez o protagonismo no cenário do empreendedorismo mundial. Primeiramente, o principal déficit que precisa ser atacado de frente é a inserção da educação empreendedora nas instituições de ensino. Ao longo da vida acadêmica, os estudantes são condicionados a desenvolver competências para crescer dentro de uma grande empresa, sendo que as bases do empreendedorismo não são ensinadas e tão pouco são motivo de pesquisas e debates nas salas de aula. Com isso, perde-se a oportunidade de enraizar a cultura empreendedora entre os mais jovens e fortalecer mais rapidamente a cadeia como um todo.
Outra vertente envolve a maior participação governamental no apoio a eventos e ações em prol do empreendedorismo. Atualmente, são raras as iniciativas que visam promover o desenvolvimento do setor e quando criadas, de forma geral, não conseguem atender a maioria dos empreendedores postulantes aos benefícios. Sem sombras de dúvida, o envolvimento mais próximo do Estado, no mínimo, seria capaz de proporcionar um boom maior para o segmento, além de ser uma medida eficaz para auxiliar a médio e longo prazo o controle da taxa de desemprego.
A alta carga tributária também é um fator que complica a evolução do mercado. Estudo realizado pela Endeavor, em parceria com Sebrae/SP, revelou que a maioria dos empreendedores consideram como maior obstáculo ao sucesso do negócio a complexidade contábil e o volume de impostos presentes no Brasil. Apesar do tema ser frequentemente apontado pelos empresários como causa da baixa competitividade do país, em relação aos mercados mais desenvolvidos, o problema acaba afetando ainda mais as startups pelo fato de não terem caixa e capital de giro robusto para manter a operação em dia com tantas obrigações. Portanto, uma reforma fiscal é mais do que necessária para melhorar o ambiente de negócios do setor.
Com todas as dificuldades expostas, fica muito claro que os empreendedores brasileiros que conseguiram chegar ou estão na batalha pelo êxito tem como ponto forte a resiliência e a persistência. Mesmo sem o nível de assistência proporcionado pelo EUA, Europa e até a China, o país consegue, na medida do possível, se consolidar entre as maiores potências globais de inovação e empreendedorismo tecnológico. Mas ainda há muito o que ser aperfeiçoado e desenvolvido para que o ecossistema de startups no Brasil seja devidamente reconhecido pela comunidade internacional.
Zhen Zhang, chinês, mestre em Gestão Internacional pela FGV e Universidade Bocconi (Milan/ITA). Há quatro anos no Brasil, é fundador e CEO do grupo Mobocity, startup brasileira que cria soluções para o mercado de telecomunicação.