A audiência pública realizada em sessão conjunta pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática) do Senado Federal nesta quarta-feira (4/7) para debater o projeto de lei de crimes digitais foi marcada por críticas dos especialistas presentes.
O consultor jurídico Marcelo Bechara de Souza Hobaika, representante do Ministério das Comunicações no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), criticou duramente o substitutivo do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) aos projetos que tratam de crimes cibernéticos. Entre os defeitos, ele apontou a falta de clareza na tipificação dos crimes previstos no projeto, o que poderia trazer prejuízos quando o caso chegasse à Justiça.
A punição para o internauta que propaga códigos maliciosos involuntariamente também foi alvo de críticas do consultor jurídico. "Difundir códigos maliciosos pode acontecer com qualquer um de nós. Isso é extremamente temerário. O foco tem que ser no internauta que teve dolo e não na vítima", ressaltou.
Na opinião de Bechara, o artigo 21 ? que trata das responsabilidades dos provedores de acesso ? deveria ser retirado do projeto. Ele diz que não houve debate com a sociedade sobre a questão dos provedores. Além disso, frisou que já existe no Direito Civil responsabilidades suficientes. ?Os textos do projeto estão extensos e isso pode causar confusão", disse.
Para o presidente da Associação Brasileira de Provedores de Internet (Abranet), Eduardo Fumes Parajo, a inclusão digital ficará prejudicada se houver punição aos internautas que propagarem códigos maliciosos, em razão dos aumentos de custos que o usuário terá caso o projeto de lei de crimes digitais for aprovado da maneira como está. Ele também criticou o artigo que obriga os provedores de internet a denunciarem à polícia crimes cometidos por usuários. "Não vejo nos provedores o papel de polícia para canalizar denúncia e repassar à polícia. Não é um ônus que nos compete", afirmou.
Já o juiz Fernando Neto Botelho defendeu a proposta do senador Eduardo Azeredo, e disse que as penas previstas para os infratores não devem ser motivo de preocupação. "Não podemos nos espantar com penas de prisão máximas e mínimas porque não levarão os infratores ao recolhimento, sendo réu primário eles vão ter a sua privação da liberdade convertida em multa ou indenização", declarou.
Segundo Botelho, que é membro da Comissão de Tecnologia da Informação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, delitos como o phishing [pescaria eletrônica, em tradução livre] para a obtenção de senhas bancárias cresceram mais de 50% no ano passado. E atividades como o comércio de drogas são desenvolvidas por meio do site de relacionamentos Orkut. ?Fatos como esses começam a chegar aos tribunais sob intensa discussão da tipicidade penal. Diante da ausência de uma lei expressa não se pode impor pena, pois não há crime sem lei anterior que o defina.?
Outro que defendeu o projeto foi o perito criminal Paulo Quintiliano da Silva, do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, ao dizer que uma lei sobre crimes digitais é bem-vinda. "Hoje existem muitas condutas que não podemos fazer nada", afirmou. Ele disse que desde 1996 a PF espera por uma lei que trate dos crimes cibernéticos, como já existe em vários países.
Um dos grandes problemas para a punição dos crimes cibernéticos, segundo o presidente da Safernet Brasil, Thiago Tavares, é o fato de que muitos crimes são praticados por pessoas que estão fora das fronteiras brasileiras. A Safernet é uma rede que engloba 26 países em torno do combate à pornografia infantil e dos crimes de ódio racial.
O diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação (NIC.br), Demi Getschko, também mencionou a dificuldade de se legislar sobre crimes internacionais. Ele recordou que os responsáveis pelos sites registrados com a expressão .br apresentam seus dados para obter o registro. Caso as exigências cresçam muito, alertou, os interessados poderão registrar seus sites em outros países.
O presidente da Associação Brasileira de Provedores de Acesso, Serviços e Informações da Rede Internet (Abranet), Eduardo Fumes Parajo, informou que as empresas do setor investirão R$ 13,2 milhões por ano para armazenar os logs, informações de cadastro dos usuários, conforme estabelece o artigo 21 do projeto.
O senador Eduardo Azeredo disse estar pronto a aceitar críticas e sugestões ao seu substitutivo. Mas observou que o país precisa de uma legislação sobre o tema, como já existe em diversos países do mundo. ?Chega o momento em que temos que votar ?, afirmou Azeredo, que assinou o requerimento de realização da audiência, presidida pelo senador Valter pereira (PMDB-MS), juntamente com os senadores Wellington Salgado (PMDB-MG), presidente da CCT, e Pedro Simon (PMDB-RS).
Com informações da Agência Senado.