Em um mundo onde a informação flui mais rápido do que a capacidade de muitos em digeri-la, o Projeto de Lei 1354/21, que tramita na Câmara dos Deputados, surge como um ator coadjuvante em uma peça teatral cujo enredo se baseia na ironia e na tentativa de controlar o incontrolável. A proposta, que visa exigir que criadores de conteúdo jornalístico na internet paguem aos veículos tradicionais, poderia ser confundida com um roteiro de uma comédia satírica, não fosse a sua real intenção.
Aparentemente, o legislativo federal parece estar em uma cruzada para garantir que os brasileiros comuns se mantenham na linha, acessando apenas o conteúdo produzido e compartilhado por seus "conterrâneos autorizados", ou seja, os veículos de mídia que passaram pelo sagrado ritual da licitação. Afinal, quem melhor para decidir o que é bom para os brasileiros do que o próprio Governo, certo?
Nesse cenário, plataformas como Mídia Ninja e Brasil Paralelo, com seus milhões de seguidores, parecem ser verdadeiros hereges digitais, desafiando a ordem estabelecida pelos titãs da mídia tradicional. É quase como se estivéssemos assistindo a uma versão moderna da Davi contra Golias, onde Davi trocou sua funda por uma câmera e uma conexão de internet.
Mas qual seria o verdadeiro risco de deixar que as notícias circulem livremente? Será que o espectro das fake news é realmente tão perigoso para a democracia, ou será apenas mais um bicho-papão criado por aqueles que desejam manter o controle sobre o fluxo de informações? Estudos indicam que as pessoas não são totalmente crédulas diante de notícias falsas e que a conscientização sobre a existência de fake news promove a verificação de informações.
Portanto, talvez o problema não esteja na liberdade de informação, mas na subestimação da capacidade crítica do cidadão comum. É uma visão paternalista e antiquada, que vê o público como massa de manobra, facilmente manipulável, quando, na verdade, a disseminação de informações e o debate aberto poderiam fortalecer a democracia, em vez de enfraquecê-la.
Em suma, o Projeto de Lei 1354/21 parece ser um reflexo do desconforto de uma elite frente à democratização da informação. Em vez de abraçar a mudança e buscar meios de coexistir e aproveitar as novas formas de jornalismo, escolhe-se o caminho da restrição e do controle. No entanto, como a história nos mostra, tentar conter o fluxo de informação é como tentar segurar água com as mãos: ineficaz e fadado ao fracasso. Talvez seja hora de nossos legisladores reconhecerem que a informação, assim como a água, encontrará seu caminho, com ou sem a sua benção.
Lilian Carvalho, PhD em Marketing e coordenadora do Centro de Estudos em Marketing Digital da FGV/EAESP.