Uma opinião publicada no TI Inside, "Dificuldades na exportação de software: de quem é a culpa?" apontava o alto custo da mão de obra como razão da dificuldade para exportar e a importância das certificações nesse processo.
As certificações têm sem dúvida uma grande importância e teremos a ocasião de voltar nesse ponto posteriormente. A questão do alto custo da mão-de-obra é bem real também e frente a esse problema gostaríamos de lançar algumas idéias nascidas da nossa experiência em exportação de software para a Bélgica com a Sofshore. Essas idéias não pretendem ser diretamente uma solução. Têm como objetivo de suscitar a reflexão e até a controvérsia construtiva.
Ponto bem conhecido, uma importante dificuldade enfrentada pelos exportadores é o custo da mão de obra. O Brasil esta efetivamente numa posição difícil a esse respeito: os custos salariais são mais altos do que os dos concorrentes internacionais, sejam eles da Índia ou da África do Norte. Na nossa área de serviços, esse custo relativamente alto do principal fator de produção tem um impacto direto no preço – ou nas margens.
Portanto, esse custo atrapalha a competitividade brasileira no mercado internacional. E mais ainda do que essa visão estática da situação atual, o importante é a evolução futura da competitividade brasileira. Se o Brasil quiser ficar competitivo nesse mercado, a inflação dos salários deve ser limitada e ficar, no máximo, igual à dos principais concorrentes (corrigindo pela evolução do câmbio).
Competitividade: o exemplo belga
A Bélgica é um pequeno país economicamente muito dependente das suas relações com paises vizinhos (França, Alemanha, Holanda). Para proteger o emprego através da sua competitividade, o governo Belga votou uma lei "Loi relative à la promotion de l'emploi et à la sauvegarde préventive de la compétitivité" (Lei relativa à promoção do emprego e a defesa preventiva da competitividade) que limita a evolução salarial na Bélgica à evolução nos seus principais parceiros comerciais.
Concretamente (e simplificando), um "conselho superior da economia" publica anualmente um relatório técnico sobre a margem máxima disponível a priori para a evolução do custo salarial, tendo como base a evolução esperada nos paises de referência. A partir desse relatório, os parceiros sociais fixam a cada dois anos no quadro de acordos setoriais a margem máxima para a evolução do custo salarial. A suma da indexação, dos aumentos salariais e outros benefícios não podem ultrapassar esse limite. Se os parceiros sociais não conseguirem um acordo, o governo faz uma proposta de mediação e eventualmente decide.
Mais do que provavelmente, tal lei não poderia existir dessa mesma forma no Brasil. Primeiro porque o modelo de concentração social Belga no qual as negociações salariais setoriais são centralizadas entre os "parceiros sociais", que são os sindicatos. Representantes do patronato e governo não existem dessa forma no Brasil. Segundo porque a abertura da economia brasileira é bem menor do que na Bélgica – a parte do comércio exterior no produto interior é muito menor e, portanto o interesse de limitar os aumentos salariais de um setor inteiro apenas por causa da competitividade exterior faz menos sentido.
Contudo, e mesmo se a implementação for diferente, duas idéias são interessantes. A primeira é de dispor de uma ferramenta rigorosa de medida e monitoramento da posição do Brasil em relação aos seus principais concorrentes. A segunda é de usar esse valor nas negociações salariais no objetivo de proteger a posição dos exportadores.
Achille Carette é diretor executivo da Sofshore, consultoria de TI especializada em desenvolvimento de soluções offshore