A nova redação do marco civil da internet (PL 2.126/2011), divulgada nesta terça-feira, 5, pelo deputado Alessandro Molon (PT-RJ), traz como o principal ponto a neutralidade de rede, agora com algumas pequenas modificações, mas nada próximo daquelas desejadas pelas teles que queriam, por exemplo, que ficasse explícita no texto a possibilidade de planos de serviços com franquia de dados. Segundo o relator, o marco civil é uma lei "principiológica", por isso, não vai tocar em modelos de negócios.
O texto foi negociado junto ao Palácio do Planalto e, segundo Molon, a presidente Dilma Rousseff apoia o texto "na íntegra".
Teles e radiodifusão chegaram a costurar entre si um texto de consenso, que foi rejeitado por Molon. Basicamente, o acordo entre os dois setores incluía a possibilidade de planos por franquia de dados, o que agradava às teles, e mantinha a redação sobre a retirada de conteúdo protegido por direitos autorais. Mas, segundo apurou este noticiário, as empresas de mídia não fizeram esforço para assegurar a aceitação da proposta comum alinhavada porque ficaram incomodadas com os vazamentos das negociações.
Molon não acredita que o projeto será votado nesta semana. Na semana passada, falava-se que seria possível votar o projeto após a comissão geral, que acontece nesta quarta-feira, 6. "Eu tenho dúvidas se amanhã, após a comissão geral, os líderes se sentirão suficientemente seguros para votar. Tenho ouvido de alguns líderes que seria melhor votar na semana que vem, até para absorver o debate da comissão geral", disse ele.
Neutralidade
O novo texto determina que, na hipótese de degradação ou discriminação de tráfego, o responsável não deverá causar danos aos usuários na forma do artigo 927 do Código Civil (inciso I). Além disso, deve agir com proporcionalidade, transparência e isonomia (inciso II). O texto final mantém o inciso IV, que na versão que foi divulgada pela Agência Câmara havia sido suprimido: oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.
No parágrafo terceiro foi retirada a palavra "fiscalizar". "Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados". "O projeto não abre brecha nenhuma à quebra da neutralidade. Ao contrário, torna ainda mais forte a proteção. Este é o coração do projeto e nós vamos lutar com todas as forças para que ele não seja modificado no plenário", disse o deputado em coletiva com a imprensa.
Proteção de dados pessoais
Em relação à proteção de dados pessoais, tema que virou prioridade na agenda do governo após as denúncias de espionagem, o texto ficou muito mais completo e abrangente. O texto estabelece que em qualquer operação de "coleta, armazenamento e tratamento" de dados pessoais ou de comunicação em que pelo menos um dos terminais esteja em território nacional, deve ser respeitada a legislação brasileira, o direito à privacidade e o sigilo da comunicação (artigo 11). Tanto as teles quanto os provedores de aplicações estão sujeitos ao disposto no artigo e está previsto um decreto para regulamentar o procedimento para apuração do disposto no artigo. Além disso, as cláusulas dos contratos de adesão que não informem os termos que envolvem a coleta de dados e que estabeleçam outro foro para resolução de conflitos que não o Brasil, serão consideradas "nulas de pleno direito". "Havia a possibilidade de tratarmos na lei de proteção de dados pessoais, mas como o processo legislativo no Brasil é demorado, havia a possibilidade de essa resposta ser um silêncio", afirma o deputado.
Molon também acatou a sugestão do governo de obrigar a instalação de data centers no País. A medida, entretanto, por enquanto é branda. O texto estabelece que um decreto "poderá obrigar" os provedores que exercem atividade econômica, considerando o seu faturamento e amplitude dos seus serviços, a armazenarem os dados no Brasil. Com essa redação, Molon entende que ficarão de fora as pequenas e médias empresas, os blogueiros etc.
Guarda de dados
Foi acrescentado que os provedores de aplicações não poderão guardar dados pessoais que sejam "excessivos" em relação à finalidade para a qual foi dado o consentimento. Outra mudança foi proibi-los de guardar os dados de acesso a outras aplicações.
Direito autoral
Molon não estabeleceu o direito de retirada de conteúdo que infringe direitos autorais dos serviços de Internet. Em princípio, vale a regra de que só saem os conteúdos determinados por ordem judicial, e no caso de conteúdos com direitos, haverá uma legislação específica. O polêmico parágrafo 2º do artigo 5º (agora do artigo 20) foi reformulado para: "A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a diretos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal".
De acordo com o deputado, a nova redação foi "pactuada" com a sociedade civil. A redação anterior era criticada pelas entidades que militam pela liberdade de expressão. Antes o texto dizia apenas que o disposto no caput não se aplicava ao conteúdo que infringe direito de autor, o que dava a entender que a retirada poderia ser imediata.
Veja a íntegra do relatório, assim como uma tabela comparativa entre o texto atual e a versão que veio do Executivo.