Atualmente em fase de consultas públicas para definir aspectos da regulamentação, o marco civil da internet enfrenta um debate mais focado em neutralidade de rede. Na visão do relator do projeto, o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), as exceções que serão regulamentadas na Lei nº 12.965/14 têm de ser feitas com parcimônia. "Se é uma exceção, tem que ser pouco, raro. Se são exceções à neutralidade, não podemos ter oito ou dez, se não vira regra, e a regra é a neutralidade", disse ele em palestra durante a Campus Party 2015 nesta sexta, 6, em São Paulo.
Na visão dele, as exceções já estão previstas nos dois incisos do primeiro parágrafo do Art. 9º da Lei, que prevê a priorização de tráfego para serviços de emergência e excessões técnicas ao funcionamento da rede. O deputado acredita que o mesmo tratamento deve ser dado em relação à guarda de dados. "Como a tecnologia hoje permite que se guarde tudo, a lei tem que prever que a regra é não guardar, e só guardar o que for necessário, se não vão violar nossa privacidade".
Molon cita o recente movimento do diretor da agência reguladora dos Estados Unidos, a Federal Communications Commission (FCC), que propôs princípios semelhantes, mas sem ser específico demais para não deixar o texto datado. "Tom Wheeler está propondo uma regra de neutralidade que diz que está tendo o cuidado de não colocar algo que impeça o desenvolvimento posterior. Foi o que a gente fez, para não tronar a lei velha e que impeça a inovação", destaca.
Navegação gratuita
Um dos pontos polêmicos da regulamentação, no entanto, é a exceção para novos modelos de negócios para operadoras. Isto é, permitir a existência de acordos comerciais que promovam a navegação patrocinada, ou o "zero rate" – como o acesso gratuito a redes sociais a partir de um plano pré-pago de smartphone, por exemplo. Para o professor e consultor para sociedade da informação, Marcelo Branco, essa prática não deveria ser aceita. "Na minha opinião e na do (fundador da Web) Tim Berners-Lee, isso é uma quebra da neutralidade de rede. Não tem como ter um plano de dados que acessa só alguns serviços", defende.
Branco reconhece que essa é uma ideia difícil de defender, mas justifica: "A operadora diz que dá de graça o Facebook, mas na verdade ela te vende um plano (de dados) que você só pode acessar determinados serviços que têm acordo comercial com a operadora, e isso quebra o princípio de neutralidade". Ele criticou ainda a Anatel, dizendo que a agência "não representa os interesses dos usuários", e pediu que o debate sobre a regulamentação do Marco Civil não envolva disputas partidárias.
A visão da advogada e membro do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Veridiana Alimonti, é semelhante a de Marcelo Branco. "Na medida em que você permite que uma determinada aplicação comercial tenha tratamento diferencial em termos de descontos de plano em relação a todas as outras (aplicações) que podem fazer exatamente o mesmo que ela faz, isso vai de encontro justamente às preocupações do marco civil de não existirem condutas anticomerciais", destaca. Ela defende, por outro lado, o debate para que serviços públicos possam ser contemplados com esse tipo de modelo.