A padaria e o cliente: um episódio que abre diálogo sobre o trabalho remoto

0

Nos últimos anos, a sociedade tem testemunhado uma revolução no modo como as pessoas trabalham, impulsionada pela ascensão do trabalho remoto. Entretanto, incidentes como o ocorrido recentemente em uma padaria em Alphaville, São Paulo, demonstram que ainda existe um longo caminho a percorrer para que a sociedade compreenda plenamente essa forma de trabalho e suas implicações.

Em 31 de janeiro de 2024, um cliente foi expulso de uma padaria por simplesmente usar o Wi-Fi e abrir seu notebook do local para desempenhar suas atividades profissionais. O incidente rapidamente se tornou viral nas redes sociais, chamando a atenção para um debate mais amplo sobre a compreensão e aceitação do trabalho remoto em nossa sociedade.

O vídeo da discussão entre o cliente e o dono da padaria revela o cerne da questão: a resistência em aceitar que o trabalho remoto é uma realidade cada vez mais presente. O cliente argumentou que estava utilizando o Wi-Fi com o seu notebook para trabalhar, sem perturbar ninguém, mas mesmo assim foi convidado a deixar o local. Esse episódio demonstra que muitos ainda não compreendem a natureza do trabalho remoto e suas nuances.

O debate nas redes sociais revelou opiniões divergentes. Alguns apoiaram o cliente, argumentando que ele estava no direito de utilizar o Wi-Fi e abrir seu notebook no estabelecimento, enquanto outros defenderam a prerrogativa do dono da padaria de estabelecer regras em seu negócio. Esse confronto de opiniões mostra que ainda há uma falta de consenso sobre o que é aceitável quando se trata de trabalho remoto em lugares públicos.

É importante ressaltar que, no Brasil, a legislação também não está completamente alinhada com a realidade do trabalho remoto em lugares abertos. A CLT não faz menção explícita a essa modalidade de trabalho, deixando margem para interpretações. A Reforma Trabalhista de 2017 definiu o teletrabalho, mas deixou muitas questões em aberto, como a necessidade de acordo entre empregador e empregado.

A Portaria MTP nº 677/2021 trouxe alguma clareza ao estabelecer que o teletrabalho pode ser realizado em qualquer local, inclusive em lugares abertos. No entanto, a falta de regulamentação específica em relação a lugares públicos e a resistência cultural ainda persistem.

Para evoluir em relação ao entendimento do trabalho remoto, a sociedade precisa adotar uma abordagem mais aberta e inclusiva. É crucial que os estabelecimentos comerciais, como a padaria em questão, e seus clientes estejam dispostos a dialogar e encontrar soluções que beneficiem ambas as partes. Além disso, a legislação deve ser atualizada para refletir as necessidades e realidades do trabalho remoto moderno.

Este tipo de trabalho é comum em países como os Estados Unidos e Inglaterra, muito antes da pandemia. Os estabelecimentos não são obrigados a acomodar todos os clientes, mas podem reservar algumas mesas para aqueles que desejam trabalhar, sem prejudicar os clientes que desejam apenas almoçar. Além disso, muitos cafés estão equipados com tomadas e Wi-Fi para atender às necessidades dos trabalhadores remotos.

O estudo intitulado "Remote Working in Cafés and Public Spaces: An Exploratory Study of Workers' Experiences and Needs" publicado no Journal of Business and Psychology, investigou as experiências e necessidades dos trabalhadores remotos que optam por utilizar cafés e espaços públicos como local de trabalho. Por meio de entrevistas qualitativas com trabalhadores remotos revelou que esses indivíduos escolhem esses locais devido à conveniência, a busca por um ambiente diferente e a oportunidade de interação social.

Em última análise, a sociedade ainda precisa evoluir em sua compreensão do trabalho remoto. Este incidente na padaria em Alphaville é um lembrete de que, à medida que novas formas de trabalho surgem, devemos estar dispostos a adaptar nossas mentalidades e criar um ambiente onde o trabalho remoto seja aceito e respeitado por todos e seja natural. A evolução é inevitável, e é hora de abraçar plenamente o potencial do trabalho remoto em nossa sociedade.

Fernanda Mourão, CEO da Futuro Labs.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.