Nos EUA, desenvolvimento veio pelas ferrovias; no Brasil, deve vir pela tecnologia e educação

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Há um ano, a Semana de Arte Moderna no Brasil completou 100 anos. Os artistas buscavam naquela época estabelecer o que seria uma identidade nacional. Em 100 anos, muita coisa aconteceu. De lá para cá, tivemos a Tropicália, a Bossa Nova, o Chacrinha, o Pagode, o Axé, o Funk e o Sertanejo. Me pergunto se é possível que alguma destas coisas isoladamente possa se constituir numa identidade nacional, considerando que ainda temos a gauchada, o peão de boiadeiro, os bois, o maracatu, o forró e os diversos tipos de sambas. Entendo que não. Como já disse a nossa Fernanda Montenegro, "o Brasil não tem uma cultura, tem culturas".

Se no passado a expressão cultural brasileira estava apoiada na massificação dos símbolos culturais do eixo Rio-São Paulo, hoje o Brasil enxerga suas diferenças regionais, étnicas e ancestrais. Hábitos, marcas, formas de consumir, de se expressar não estão mais à parte do crescimento econômico das empresas e do país. Tudo isso acelerado pela tecnologia, que deu voz a todos que não a tinham. No alcance das forças regionais, a tecnologia deveria ser ainda mais importante para seu desenvolvimento.

Sendo um dos povos mais conectados do mundo, ainda falta ao Brasil dar grandes saltos para que a modernidade esteja acessível a todos. Em 2023, o acesso à internet alcança 83% da população (NIC.br) – somos o país com terceira maior penetração de uso de redes sociais (Comscore), com 464 milhões de dispositivos digitais (FGVcia) com uso regular de internet. Mas o que estamos compartilhando nas redes? Daremos o salto para um futuro brilhante?

O Brasil, um país tão grande e formado em cima de tanta diversidade, carrega muitas contradições. Por exemplo, até temos algumas leis modernas, mas a Constituição de 1988 foi construída com base no trauma e falta de liberdade de tantos anos de ditadura militar. Estamos entre as maiores nações do mundo, mas ainda não nos livramos de algumas tristes heranças: segundo o IBGE, 72% dos brasileiros ainda têm algum nível de analfabetismo funcional. E 70% dos alunos brasileiros não concluíram o Ensino Médio (Pnad Contínua 2019). Só este dado já é um indicador que impacta muita coisa.

O Programa Nacional de Banda Larga (PNBL), criado em 2010 e que pretendia levar educação à distância aos lugares mais ermos do país, incluindo o país inteiro num salto de conhecimento, se encerrou em 2016, sem que suas metas tivessem sido atingidas. Paralelamente, voltamos a ter vergonha dos nossos atrasos e deixamos o seleto grupo das sete economias mais retumbantes do mundo. Ser um país digital deveria significar para o Brasil um crescimento de conhecimento de forma exponencial, um capital humano mais informado, mais preparado, mais apurado.

Os Estados Unidos viram seu desenvolvimento pelas ferrovias. O acesso à internet deveria ter a mesma importância, se não maior, que as ferrovias norte-americanas no século XIX. Tendo a educação como a carga que escoa pelo país, aí sim poderíamos entender a mistura da identidade brasileira e falar de uma moral brasileira. A moral do brasileiro carece de educação para poder traçar seu caminho de desenvolvimento. Falta um eixo, um eixo de ambição por ser "a Grande Nação".

Estamos meio a meio, divididos e sem trilho. Nada pode ser pior. A educação é um caminho de união porque esclarece, promove o debate e a criação de soluções para o que parece insolúvel. Trabalhemos para, quem sabe, estarmos preparados para uma próxima Semana de 1922, quando possamos discutir a relação do Brasil com as os seus próprios valores, suas próprias tradições e aspirações, dignas de uma Grande Nação. Trabalhemos para que não tenhamos que esperar 100 anos. Trabalhemos pela educação hoje.

Gal Barradas, sócia executiva da Zeka Educação Digital.

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