O estudo do "Futuro do Trabalho", publicado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF), em parceria com o Núcleo de Inovação, Inteligência Artificial e Tecnologias Digitais da Fundação Dom Cabral (FDC), tem como objetivo examinar as macrotendências que impactam os empregos, as habilidades necessárias e as estratégias que podem ser implementadas pelos empregadores em resposta a essas mudanças. O estudo se encontra em sua 5ª edição, sendo publicado a cada dois anos desde 2016 e, neste ano, analisou 55 economias para obter tendências importantes sobre o mercado de trabalho para o período 2025-2030.
De acordo com o estudo, o perfil do trabalhador está evoluindo significativamente em resposta às novas demandas do mercado de trabalho. Isto é, percebe-se uma priorização pelo desenvolvimento de habilidades tecnológicas, com um foco acentuado em competências relacionadas à inteligência artificial (IA), Big Data, e segurança cibernética pelos indivíduos.
O estudo revela que 65% dos trabalhadores consideram a requalificação, bem como a busca por novas competências como essencial para manter sua relevância no mercado e empregabilidade. Além disso, 78% dos empregados buscam oportunidades de treinamento oferecidas por seus empregadores para aprimorar suas habilidades. Nesse sentido, há um aumento no interesse por oportunidades de aprendizado contínuo em ambiente corporativo, com 70% dos trabalhadores dispostos a dedicar tempo fora do horário de expediente para cursos de aprimoramento.
A flexibilidade no trabalho continua sendo um fator crucial, com 76% dos trabalhadores preferindo empresas que oferecem opções de trabalho remoto ou híbrido. O relatório destaca que a adaptação às novas tecnologias e a capacidade de navegar em ambientes de trabalho dinâmicos são agora habilidades essenciais para os profissionais.
Aumenta também a exigência por ambientes de trabalho diversificados e inclusivos, com 63% dos trabalhadores afirmando que preferem empresas com políticas claras de diversidade e inclusão. O aumento do custo de vida e a desaceleração econômica também são preocupações crescentes entre os trabalhadores.
Tendências para o Mercado de Trabalho
Os principais fatores identificados para transformar o mercado de trabalho global até 2030, remodelando tanto os empregos quanto as habilidades necessárias, foram a significativa mudança tecnológica, fragmentação geoeconômica, incerteza econômica, mudanças demográficas e transição verde.
A ampliação do acesso digital é vista como uma das tendências mais transformadoras por 60% dos respondentes, principalmente em IA e processamento de informações (86%), robótica e automação (58%) e geração, armazenamento e distribuição de energia (41%).
Em particular, a IA Generativa tem apresentado um rápido crescimento, impulsionado tanto pelo aumento dos investimentos quanto pela adoção em diversos setores da economia, com destaque para serviços financeiros, consultoria e educacional. Esse avanço foi acompanhado pelo desenvolvimento de infraestrutura tecnológica, como servidores e usinas de energia, para atender à crescente demanda. Esse cenário também gerou um aumento expressivo na demanda por habilidades relacionadas à IA refletindo o seu potencial de aprimorar o desempenho, ganhos de produtividade e a eficiência dos trabalhadores em suas atividades. No entanto, sem estruturas adequadas de tomada de decisão, incentivos econômicos estratégicos e regulamentações governamentais, essas tecnologias podem ser utilizadas para substituir o trabalho humano, em vez de aprimorar suas capacidades, o que poderia resultar em maior desemprego e desigualdade.
A perspectiva para o panorama econômico global a partir de 2025 é marcada por um otimismo cauteloso com incertezas persistentes. Apesar da desaceleração da inflação e da adoção de políticas monetárias mais flexíveis, o crescimento lento, a volatilidade política e a pressão contínua sobre os preços ainda mantêm muitos países vulneráveis a choques econômicos. Nesse cenário, as empresas identificam essas pressões como um dos principais motores para a transformação do mercado de trabalho, especialmente pelo aumento do custo de vida, apontado por 50% dos entrevistados, e pelo crescimento econômico mais lento, com 42% dos entrevistados. Logo, a opção por qualificar a mão de obra para o uso de tecnologia que tragam ganhos de produtividade está na pauta de prioridades.
Além disso, 34% dos empregadores consideram o aumento das tensões geoeconômicas um risco para o comércio e as cadeias de suprimento globais, devido à imposição de restrições comerciais e de investimentos. A fragmentação geoeconômica tem implicações macroeconômicas significativas, com possíveis perdas na produção global, afetando principalmente as economias emergentes e em desenvolvimento, que são as mais vulneráveis. A longo prazo, isso pode comprometer a estabilidade econômica e o crescimento global, além de limitar a cooperação multilateral, especialmente em questões críticas como mudanças climáticas, questões tarifárias e até mesmo novas pandemias.
A transição verde continua sendo uma prioridade para muitas organizações, com 47% dos entrevistados prevendo o aumento dos esforços e investimentos para redução das emissões de carbono como um fator de transformação. Para tanto, é relevante associar a adoção das novas tecnologias digitais às estratégias de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Além disso, 41% dos empregadores esperam que o aumento das ações para adaptação às mudanças climáticas promova mudanças organizacionais significativas. Essas duas tendências têm impulsionado uma demanda crescente por "empregos verdes", ou seja, aqueles ligados à sustentabilidade e ao meio ambiente, evidenciando a necessidade de habilidades especificas em práticas sustentáveis.
Por último, observa-se duas mudanças demográficas predominantes que impactam diretamente a oferta global de mão de obra. Nos países de alta renda, a população em idade ativa está envelhecendo e diminuindo devido à queda nas taxas de natalidade e ao aumento da expectativa de vida. Esse fenômeno resulta em uma maior pressão sobre um número reduzido de trabalhadores, que precisam sustentar aqueles fora do mercado de trabalho, dificultando a sustentabilidade. Por outro lado, nos países de baixa renda, a população em idade ativa está crescendo, impulsionada pelas altas taxas de natalidade, o que possibilita a crescente entrada de jovens no mercado de trabalho. Essa grande quantidade de jovens pode ser aproveitada para impulsionar a economia, desde que sejam criados empregos adequados para absorvê-los. Atualmente, a distribuição de pessoas em idade ativa em países de alta renda (51%) e baixa renda (49%) é praticamente equilibrada. No entanto, espera-se que, até 2050, os países de baixa renda representem 59% da população mundial em idade ativa. Além disso, 40% dos empregadores estão sendo impactados pelo declínio da população em idade ativa, enquanto 25% pelo crescimento. Nesse sentido, os empregadores que enfrentam os efeitos do envelhecimento estão mais preocupados com a disponibilidade de talentos e esperam maiores dificuldades para atração de profissionais, o que leva a uma maior prioridade na transição de funcionários atuais para funções em crescimento e na automação de algumas atividades.
Segundo o estudo, é esperado que a criação e a substituição de empregos devido a estas tendências representem um total de 22% dos empregos formais atuais, com a criação de 170 milhões de novos postos de trabalho, o que representa 14% do total de empregos atuais. Esse crescimento deve ser compensado pela substituição de 92 milhões dos empregos atuais (8% dos empregos atuais), resultando em um crescimento de 78 milhões de empregos até 20230 (7% dos empregos atuais). Nesse sentido, o estudo identifica uma série de empregos tecnológicos em crescimento acelerado, destacando os especialistas em Big Data, na própria IA e aprendizado de máquina, como aqueles com rápida adoção, enquanto funções administrativos, secretariais e operacionais sendo aqueles com forte tendência pela substituição de tecnologias digitais.
Funções com crescimento mais rápido:
- Especialistas em Big Data.
- Engenheiros de Fintech.
- Especialistas em IA e Machine Learning.
- Desenvolvedores de Software e Aplicações.
- Especialistas em Gestão de Segurança.
- Especialistas em Armazenamento de Dados.
- Especialistas em Veículos Elétricos e Autônomos.
- Designers de Interface e Experiência do Usuário (UI e UX).
- Especialistas em Internet das Coisas (IoT).
- Motoristas de Serviços de Entrega.
- Analistas e cientistas de Dados.
- Engenheiros Ambientais.
- Analistas de Segurança da Informação.
- Engenheiro de DevOps.
- Engenheiros de Energia Renovável.
Funções com declínio mais rápido:
- Funcionários de Serviços Postais.
- Caixas bancários e cargos relacionados.
- Operadores de entrada de dados.
- Caixas e atendentes.
- Assistentes administrativos e secretárias executivas.
- Trabalhadores de impressão e cargos relacionados.
- Contadores, auxiliares de contabilidade e de folha de pagamento.
- Atendentes e condutores de transporte.
- Assistentes de registro de materiais e controle de estoque.
- Vendedores porta a porta, vendedores de jornal, ambulantes e cargos relacionados.
- Designers gráficos.
- Peritos de seguros, examinadores e investigadores.
- Oficiais jurídicos.
- Secretárias jurídicas.
- Operadores de Telemarketing.
Principais Habilidades Exigidas
Cerca de 39% das habilidades existentes deverão ser transformadas ou tornarem-se obsoletas entre 2025 e 2030, refletindo uma desaceleração na "instabilidade de habilidades" observada em relatórios anteriores. O treinamento, requalificação e aprimoramento de habilidades estão no centro das estratégias das empresas para lidar com essas mudanças, com 85% dos empregadores planejando priorizar o upskilling de sua força de trabalho. Nesse sentido, as habilidades mais demandadas incluem pensamento analítico, resiliência, flexibilidade, agilidade, liderança e influência social. Habilidades como pensamento analítico são essenciais para resolver problemas complexos, especialmente em setores como tecnologia da informação e serviços financeiros, onde a análise de grandes volumes de dados é fundamental. Resiliência e flexibilidade são cruciais em setores afetados por mudanças rápidas, como o varejo e a manufatura, permitindo que os trabalhadores se adaptem rapidamente a novas condições de mercado.
No contexto de liderança e influência social, habilidades de gestão de pessoas estão se tornando cada vez mais importantes, particularmente em setores como saúde e educação, onde a gestão eficaz de equipes diversas e o desenvolvimento de ambientes de trabalho inclusivos são prioritários. Exemplos concretos incluem a implementação de programas de liderança inclusiva em empresas de tecnologia, como a Microsoft, que promove uma cultura de diversidade e inclusão.
Além disso, a demanda por habilidades tecnológicas, como Inteligência Artificial e Big Data, está crescendo rapidamente. No Brasil, 53% dos empregadores indicam que estas serão áreas prioritárias de requalificação nos próximos cinco anos, refletindo a necessidade de preparar a força de trabalho para as inovações tecnológicas emergentes. Empresas estão investindo em parcerias com plataformas de aprendizado online para o fornecimento de treinamentos em grande escala nessas áreas, destacando a relevância de uma abordagem proativa para o desenvolvimento de habilidades.
Dentre as principais habilidades exigidas estão:
- Pensamento analítico (69%).
- Resiliência, flexibilidade e agilidade (67%).
- Liderança e influência social (61%).
- Pensamento criativo (57%).
- Motivação e autoconhecimento (52%).
- Alfabetização tecnológica (51%).
- Empatia e escuta ativa (50%).
- Curiosidade e aprendizado contínuo (50%).
- Gestão de talentos (47%).
- Orientação para o serviço e atendimento ao cliente (47%).
- IA e Big Data (45%).
- Pensamento sistêmico (42%).
- Gestão de recursos e operações (41%).
- Confiabilidade e atenção aos detalhes (37%).
- Controle de qualidade (35%).
Mercado de Trabalho Brasileiro
No Brasil, assim como em muitos outros países da América Latina e do Caribe, a principal barreira para a transformação dos negócios é a lacuna de habilidades e lacunas relacionadas a formação básica (em especial, para conhecimentos gerais em matemática, português e inglês, por exemplo).
Dessa forma, o Brasil enfrenta desafios significativos relacionados a essas lacunas, que são considerados a maior barreira para a transformação dos negócios no país até 2030. Nesse sentido, 37% das habilidades dos trabalhadores brasileiros irão mudar, com quase 9 em cada 10 empresas no país planejando aprimorar as habilidades da sua força de trabalho nos próximos 5 anos, com foco em IA, Big Data, pensamento crítico, alfabetização tecnológica e lógica geral. Nesse cenário, 58% das empresas esperam recrutar funcionários com novas habilidades e 48% planejam transitar funcionários de funções em declínio para funções em crescimento.
Para tanto, além das tradicionais demandas por profissionais mais qualificados, sobre o importante papel na formação de mão de obra nas universidades, torna-se vital uma análise sobre as políticas para investimentos em treinamento, qualificação, desenvolvimento e retenção de talentos nas organizações brasileiras.
No entanto, segundo Hugo Tadeu, Diretor do Núcleo de Inovação, Inteligência Artificial e Tecnologias Digitais da Fundação Dom Cabral, as empresas brasileiras pretendem contratar mão de obra já formada, ao invés de investir na formação de novos profissionais, como acontece nos outros países.
De uma forma geral, a gestão de pessoas deve assumir uma agenda com maior protagonismo no contexto brasileiro.
Algumas recomendações:
- Incluir a pauta sobre gestão de pessoas na agenda da diretoria executiva e conselhos das organizações brasileiras, buscando alinhar o perfil dos profissionais ao contexto tecnológico e desafios estratégicos vigentes.
- Reavaliar os investimentos esperados em treinamento e desenvolvimento de equipes, incluindo as novas tecnologias digitais como temas relevantes na qualificação de pessoal.
- Para os itens 1 e 2 acima, a compreensão que a velocidade do mercado tem sido superior ao tempo de formação de mão de obra em universidades tradicionais é latente, sendo um papel das organizações capacitar a sua própria mão de obra para o futuro do trabalho.
- Finalmente, além das agendas estratégicas e investimentos em treinamento de equipes, torna-se vital avaliar a própria mão de obra, com indicadores de resultado do conhecimento em projetos organizações. Isto é, o futuro do trabalho é uma combinação de novos conhecimentos em tecnologia e deve ser traduzido em saltos de produtividade para o ambiente de negócios.
Além disso, setores como tecnologia da informação, energia renovável, financeiro e agricultura estão em crescimento, impulsionados pela digitalização e pela transição verde. Segundo o estudo, há uma expectativa de que o setor de tecnologia da informação veja um aumento significativo na demanda por profissionais qualificados, especialmente em áreas como Inteligência Artificial, Big Data e cibersegurança. A agricultura também está em expansão, com o uso crescente de tecnologia para otimizar a produção e sustentabilidade, ainda mais, pela importante representatividade no saldo da balança comercial nacional.
Por outro lado, setores tradicionais como manufatura e serviços administrativos enfrentam declínio devido à automação e à adoção de novas tecnologias. O estudo destaca que aproximadamente 39% das habilidades existentes precisarão ser transformadas ou substituídas nos próximos cinco anos para atender às novas exigências do mercado de trabalho.
No Brasil, a requalificação e o aprimoramento profissional são cruciais para o próprio crescimento da produtividade dos negócios e da economia. Programas de capacitação estão sendo implementados em parceria com plataformas de aprendizado e outras iniciativas de treinamento com diversas organizações que participaram do estudo, visando preparar os trabalhadores para os desafios futuros.
O foco em desenvolver habilidades em áreas como pensamento crítico, criatividade e resiliência é visto como essencial para manter a competitividade no mercado de trabalho em evolução.
Considerações Finais
A edição de 2025 do Futuro do Trabalho fornece uma visão abrangente sobre as transformações esperadas no mercado de trabalho global nos próximos anos, destacando as macrotendências que influenciarão a criação e o deslocamento de empregos. A capacidade dos países de criar e manter um ambiente que sustente a competitividade dependerá de sua habilidade em adaptar suas políticas educacionais e de treinamento para atender às demandas emergentes.
Países que investirem em infraestrutura digital, promoverem a inclusão e acessibilidade à tecnologia, e apoiarem programas de requalificação e aprendizado contínuo estarão mais bem posicionados para o enfrentamento de desafios e o aproveitamento de oportunidades.
Além disso, a adoção de práticas de diversidade e inclusão será crucial para atrair e reter talentos em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo. A transição verde também desempenhará um papel fundamental, com países que liderarem em energia renovável e sustentabilidade obtendo vantagens competitivas significativas.
Os governos e empresas precisam colaborar para a criação de políticas que não apenas impulsionem o crescimento econômico, mas também promovam um mercado de trabalho resiliente e inclusivo. O investimento em habilidades tecnológicas e a promoção de ambientes de trabalho flexíveis serão cruciais para garantir que as nações possam competir e prosperar em um mundo em constante mudança.
No Brasil, o foco em requalificação e transformação digital será essencial para enfrentar os desafios e aproveitar as novas oportunidades de emprego.
Metodologia do Estudo
A metodologia do estudo envolve uma pesquisa ampla e detalhada com empregadores globais, tendo sido realizada entre maio e setembro de 2024, utilizando a plataforma Qualtrics, e contou com 38 perguntas distribuídas em 12 idiomas para capturar uma gama diversa de perspectivas sobre adoção de novas tecnologias digitais no ambiente organizacional. Para isso, foram coletadas as perspectivas de mais de 1.000 empregadores relevantes em um contexto pautado por aumento de investimentos em inteligência artificial (IA) e qualificação de mão de obra necessária para enfrentar os desafios atuais do ambiente econômico. Além disso, os dados foram complementados com informações de plataformas especializadas pelo próprio WEF e FDC.