A WayCarbon e a ICC Brasil apresentam a terceira edição do estudo Oportunidades para o Brasil em Mercados de Carbono, com o objetivo de analisar os potenciais impactos do estabelecimento do mercado regulado brasileiro e do CBAM da União Europeia na competitividade do país.
Conforme nos aproximamos de 2030, prazo estipulado por muitas nações para corte de emissões, as políticas climáticas estão ainda mais visadas, debatidas e mais bem definidas ao redor do mundo. No final do último ano, a UE adotou um mecanismo de ajuste de fronteira de carbono (CBAM) visando substituir as alocações gratuitas dadas aos exportadores, evitar que empresas europeias transfiram sua produção para países menos restritivos ambientalmente e melhorar a competitividade de seus produtos, além de estimular exportadores de países como o Brasil a reduzirem suas emissões.
"Regular o mercado de carbono no Brasil nos protege de efeitos desfavoráveis do EU CBAM e nos torna mais competitivos, pois amplia nossa relevância no contexto global. O estudo subsidia a discussão do impacto de regular o nosso mercado e traz à tona a urgência de definirmos princípios que tragam vantagens à política climática mundial", afirma Henrique Pereira, COO da WayCarbon. Recentemente, a Comissão de Meio Ambiente do Senado aprovou o PL 412/2022, que regulamenta o mercado de carbono no país, e a discussão passa, agora, para a Câmara dos Deputados. "A aprovação representa um passo importante".
As definições criadas pelo EU CBAM podem impactar negativamente a economia brasileira com restrições e tributações, com perda de renda de até US$ 444,3 milhões com as exportações de produtos energo-intensivos, redução de 1,49% em relação a um cenário sem o CBAM. A precificação de carbono é uma ferramenta que pode ajudar organizações a incorporar o impacto financeiro das mudanças climáticas em sua tomada de decisão e, ao mesmo tempo, incentivar a redução de suas emissões. Dessa forma, quando países adotam políticas climáticas mais ambiciosas em resposta ao EU CBAM, a melhora como um todo é significativa, pois as reduções nas emissões globais tendem a aumentar. No entanto, enquanto os governos não aderem ao mecanismo, o EU CBAM aumenta a distância entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, pois protege o primeiro grupo, que não sofre queda nas exportações.
"O estudo, além de balizar a discussão sobre o impacto da regulação do mercado de carbono no país, destaca a importância do diálogo entre os vários setores da economia brasileira. As empresas do setor privado brasileiro devem assumir o protagonismo e contribuir intensamente para a definição dos fatores e princípios que nortearão o sucesso dessa regulação e garantir que quaisquer impactos negativos em nosso país de outros mecanismos adotados internacionalmente possam ser mitigados", explica Gabriella Dorlhiac, diretora executiva da ICC Brasil. "A ICC Brasil acredita que o avanço na implementação de um mercado regulado no país seja um fator importante para garantir que as empresas brasileiras, tanto as públicas quanto as privadas, mantenham ou mesmo aumentem suas vantagens competitivas nos mercados internacionais."
São apoiadores do estudo: Itaú, Ibá, Schneider Electric, KPMG, AES, Shell, Santander, Marfrig, Natura&Co, Tauil & Chequer Advogados, Trench Rossi Watanabe Advogados, Demarest
Setores brasileiros impactados pelo EU CBAM:
As exportações de diversos produtos para o bloco europeu sofrerão com o CBAM, pois, de acordo com a proposta, a cobrança de tarifas será baseada na diferença das emissões dos produtos importados em relação aos europeus. Entre as produções mais impactadas, estão: ferro, aço, alumínio, fertilizantes, cimento, eletricidade e hidrogênio. O Brasil está entre os principais exportadores para a União Europeia nos setores de ferro e aço, óleos e gorduras vegetais e animais, além de ser menos carbono intensivo na produção de energia e na agricultura.
No cálculo da pegada de carbono na produção de 1 tonelada dos produtos mencionados, o Brasil, segundo dados da Ecoinvent, soma:
- 2,14 tCO2e na produção de aço, (contra 2,18 tCO2e na média global);
- 3,04 tCO2e na fabricação de óleos e gorduras vegetais e animais, (contra 7,82 tCO2e na média global);
- 0,344 tCO2e na extração de petróleo e gás, (contra 0,385 tCO2e na média global)
Os dados representam vantagem competitiva para o Brasil em relação à pegada de carbono desses itens, já que a União Europeia não é autossuficiente nesses casos. Principalmente na fabricação de óleos e gorduras vegetais e animais, a produção brasileira é significativamente mais vantajosa. No entanto, a regulação do mercado torna-se fundamental para manter a competitividade.
Impactos socioeconômicos da regulação de carbono:
Os efeitos macroeconômicos de um CBAM dependem da forma como o instrumento é desenhado e analisado. Estudos de modelagem sugerem que o EU CBAM poderia resultar em um aumento no PIB da UE, de 0,2% até 2030 e de 0,4% até 2050, além de gerar cerca de 600 mil empregos adicionais. No Brasil, a introdução de mecanismos de precificação permitiria alcançar metas nacionais de mitigação com custos menores e afetaria diferentes agentes e setores da economia, principalmente os indicados anteriormente em que o país se destaca, além de estimular cobenefícios sociais, como inclusão social e geração de renda para comunidades locais, populações indígenas, ribeirinhas e/ou quilombolas.
A destinação dos recursos gerados teria impacto na transição justa, como explica Henrique Pereira, COO da WayCarbon: "O uso de receitas dos Sistemas de Comércio de Emissões, a depender da forma de como for delimitado, pode influenciar na transição justa e subsidiar populações em áreas mais vulneráveis, por exemplo".
Principais recomendações para regulação do mercado
Mesmo com o avanço do PL 412/2022, ainda são necessárias discussões de decretos, por exemplo, já que a lei trará princípios que precisam de aditivos que balizem o mercado. Sendo assim, o estudo traz recomendações para evolução do tema:
Governo brasileiro:
- Implementar um sistema de precificação de carbono regulado (ETS) que garanta que haja isenção ou redução das taxas impostas pelo EU CBAM para os produtos exportados.
- Estabelecer fases para a implementação do ETS de forma a: iniciar a implementação regulando os setores de combustíveis e indústria e ampliar o número de setores regulados; reduzir gradativamente o cap do ETS; incluir, inicialmente, compensações domésticas no ETS brasileiro dos tipos de projeto que forem elegíveis; e reavaliar periodicamente os impactos do ETS, a fim de garantir a efetividade da política de precificação de carbono.
- Reciclar eventuais receitas de forma efetiva e justa, a fim de compensar o efeito distributivo negativo sobre a renda dos mais vulneráveis e em setores que terão a competitividade afetada pelo mecanismo de precificação, bem como para a realização de investimentos em descarbonização ou projetos de P&D.
- Estudar a implementação de uma taxa sobre o carbono de produtos importados no país, concomitantemente ao estabelecimento do ETS no país, semelhante a outros mecanismos ajustes de fronteira.
Setor privado:
- Priorizar a descarbonização considerando como uma estratégia urgente a ser implementada, independentemente e paralelamente ao processo de criação de um mercado regulado no Brasil.
- Ampliar o esforço de redução e remoção das emissões de GEE investindo no desenvolvimento tecnológico e na inovação.
- Para o caso dos atores da oferta de créditos de carbono, investirem em projetos que incluam a participação e gerem renda para populações indígenas e tradicionais, visando à inclusão de compensações no mercado regulado brasileiro.
- Fortalecer o envolvimento do setor financeiro para aumentar a liquidez do mercado e as possibilidades de financiamento e mecanismos financeiros para projetos de descarbonização. Outros mecanismos financeiros devem ser desenvolvidos para reduzir o custo de capital dos entes regulados.