Como fomentar a criação de produtos digitais para impacto social positivo

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Os negócios de impacto social e o seu ecossistema têm se tornado cada vez mais robustos no Brasil com o surgimento de novas empresas e aceleradoras com foco socioambiental. Segundo a Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, "Negócios de impacto têm a intenção clara de endereçar um problema socioambiental por meio de sua atividade principal (produto/serviço)". Contudo, ainda existem poucas referências sobre como criar e gerenciar produtos de repercussão na sociedade, especialmente os digitais.

Um produto digital é um software que resolve um problema de um grupo de pessoas de maneira incrível. Por exemplo, os bancos digitais surgiram para resolver o desafio de fazer processos financeiros de maneira simples e sem burocracias. Mas, e problemas socioambientais como insegurança alimentar, defasagem na educação e desmatamento? A resolução desses problemas exige uma coordenação entre diversos atores da sociedade, e produtos digitais podem ser construídos para mitigar parte deles de maneira escalável.

Alguns casos de produtos digitais que surgiram nos últimos anos e impactam de forma positiva a sociedade são o Mapa do Acolhimento e o AprendiZAP.

O Mapa do Acolhimento procura resolver o problema de violência contra mulheres em situação de vulnerabilidade social. A solução consiste em uma plataforma web que conecta essas mulheres com advogadas e psicólogas voluntárias próximas a elas. Já, o AprendiZAP mitiga o problema de defasagem na aprendizagem de alunos de escolas públicas. Isso é feito por meio de um chatbot no WhatsApp que envia conteúdos, exercícios e oferece feedbacks sobre o desenvolvimento dos estudantes.

O que essas soluções têm em comum é a função de impacto social como prioridade. Segundo Marty Cagan, um produto digital é composto por três aspectos: usuários, negócio e tecnologia. No caso de soluções sociais, o segundo pilar é substituído pelo efeito, pois uma solução tecnológica de resultado na sociedade resolve a questão de seus usuários, gerando uma repercussão positiva na comunidade em que atua. A sustentabilidade financeira é importante, mas o lucro não é o objetivo principal, que pode ser sustentado por outros tipos de investimento, advindos de empresas privadas, fundações, mantenedores, doação de pessoa física, entre outras iniciativas.

Existem dois principais obstáculos que fazem com que esse tipo de solução ainda não seja comum: conhecimento tecnológico e cultura de inovação.

As organizações sociais têm times reduzidos e operam muitas vezes por meio de trabalho voluntário. Isso faz com que o setor não seja atrativo para pessoas desenvolvedoras de software, por exemplo, que são profissionais cada vez mais disputados pelo mercado. Isso resulta em um baixo conhecimento tecnológico nas organizações que estão trabalhando nesse tipo de produto, o que inviabiliza as ideias de construção de soluções digitais.

Além da falta de pessoas desenvolvedoras, a cultura de inovação ainda é um desafio nas organizações sociais. Uma premissa para inovar é a tomada de risco e, consequentemente, o erro. No contexto de negócios e instituições sociais, a margem para o erro é pequena por falta de recursos. A construção de uma boa solução digital requer testes para aprender rápido como construir uma iniciativa que realmente resolva o problema. Esse tempo de erros e aprendizados custa recursos escassos no ecossistema de impacto social.

Por outro lado, empresas têm times estruturados de tecnologia e produto e investimento para errar, aprender e, consequentemente, inovar. Assim nascem tantos produtos incríveis como bancos digitais, marketplaces, aplicativos de mobilidade, entre outros.

Uma pesquisa realizada pela Pipe Social em 2021 sobre negócios de repercussão na sociedade brasileira mostra que as principais necessidades das empresas participantes são dinheiro (44%) e mentoria (24%). Concluímos, então, que uma das formas de acelerar a criação de produtos digitais de impacto é o investimento não apenas financeiro por parte de empresas de tecnologia, mas, principalmente, transferindo conhecimento sobre tecnologia e produto para organizações do terceiro setor e negócios sociais.

Tal qual os exemplos que trouxe nesse texto, vemos que é totalmente viável e já contamos hoje com conhecimento suficiente para criar produtos de maneira escalável que solucionam problemas que impactam diretamente no bem-estar social e econômico da população. O que precisamos agora é ampliar a nossa atuação e dos demais players, unindo esforços por que ainda temos um longo caminho pela frente.

Débora Nunes, especialista em Produtos na Fundação 1Bi e responsável pelo AprendiZAP.

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