A palestra de encerramento da NCTA Cable 2006 voltou ao tema do ano: o impacto das novas plataformas para a distribuição de conteúdo.
Naturalmente, a indústria do cabo nos EUA fez todos os esforços para mostrar que está pronta para enfrentar os novos desafios dos terminais portáteis, da mobilidade, dos novos comportamentos dos usuários.
De fato, não se pode dizer que o cabo esteja pronto para tudo o que está acontecendo, mas pelo menos os operadores se esforçam para dizer que estão tentando entender as coisas. Aliás, o que mais se ouviu na NCTA Cable 2006 foi a frase "precisamos entender".
Algumas ações concretas desse "precisamos entender" estão em prática. A Disney abrindo seus conteúdos de maior apelo na internet "para testes" é uma tentativa. As quatro maiores operadoras de cabo unidas à Sprint para uma joint-venture de US$ 200 milhões que vai desenvolver aplicações integradas para telefonia móvel e TV a cabo é outro esforço de compreensão.
Em resposta ao "Slingbox" (caixinha dessas que surgem para revolucionar conceitos: ela digitaliza conteúdos de TV na casa do usuário e os joga na internet, para que este possa acessar e controlar seus canais onde estiver), a indústria do cabo nos EUA já planeja o "switched video", que é basicamente a possibilidade de customizar para o assinante, ao máximo, seu conteúdo.
É também uma resposta a fenômenos como myspace.com ou youtube.com, em que as pessoas criam e distribuem seus próprios conteúdos. Esse "esforço de entendimento empírico" foi bem resumido por Greg Maffei, CEO da Liberty Media, no encerramento da Cable 2006: "Esse fenômeno do time-shifting dos DVRs, do local-shifting do Slingbox, do conteúdo produzido pelo usuário, tudo isso parece muito sério, então é melhor entender logo o que está acontecendo". Time shifting e local shifting são, basicamente, a destruição das amarras de tempo e espaço da distribuição da televisão.
Jogos pelas redes de cabo são, há dois anos, uma grande promessa para a indústria. Esse ano, parece que os operadores amadureceram em relação à necessidade de um padrão único de middleware que faça as caixas todas conversarem, pelo menos no que se refere aos produtos que possam dar dinheiro, e jogo dá dinheiro em qualquer lugar do mundo.
Mudanças em vista
Mas ficam algumas questões: a indústria de cabo nos EUA, há alguns anos, tem capacidade de fazer tudo o que a internet e as demais redes estão fazendo em termos de conteúdos customizados e mudanças de paradigmas.
"Por que simplesmente não pegamos todo o conteúdo que está disponível hoje e não colocamos em nossas redes de vídeo-on-demand que estão disponíveis hoje, de graça, vendendo publicidade? Não é exatamente isso que o usuário parece querer?", provoca Jeffrey Bewkes, chairman da divisão de entretenimento do grupo Time Warner.
Afinal, todos os indícios apontam para uma geração que quer consumir mídia "a qualquer hora, em qualquer lugar" (outro mantra, aliás, muito repetido), se possível pagando o mínimo possível, ou nada.
A lógica que impede que a provocativa proposta da Time Warner fique de pé é que ainda não existe modelos de negócio viáveis para isso. Os conteúdos youtube.com ou myspace.com, produzidos pelo próprio usuário, estão na internet, uma rede aberta e gratuita, mas sem compromisso com qualidade, com confiabilidade, com eficiência.
Os conteúdos premium da ABC/Disney que estarão disponíveis para download se pagam com grandes cotas de publicidade, que aliás subsidiam também todo o conteúdo não-premium, que não dá necessariamente tanto lucro (quando dá algum), mas que alimenta o resto do canal , tornando-o um produto comercialmente vendável para os anunciantes. Ninguém tem uma resposta sobre o que aconteceria com esse conteúdo se o modelo tradicional da televisão acabar.
Da mesma forma, as redes móveis estão incorporando conteúdos de televisão, mas subsidiadas pelas receitas geradas pelo uso da rede móvel. Quanto vai custar para o usuário assistir TV intensivamente no celular? Ele vai querer um longa metragem em uma telinha de duas polegadas e meia?
O que a Cable 2006 mostrou é que, pelo menos, os operadores de cabo nos EUA estão atentos para as mudanças, ainda que não estejam todos prontos para responder a ela.
A maior parte deles (38%) acredita, segundo a enquete feita entre participantes da palestra de encerramento, que a indústria da música é a mais afetada por tudo o que está acontecendo no mundo digital. 22% acham que o que vai sofrer o maior impacto é a TV feita de forma linear.
Já 14% acham que quem mais sofre o impacto é a indústria do cinema. Outros 14% acham que é a TV aberta e 12% acham que quem mais sofre são os produtores de conteúdo premium. Já quando perguntados sobre as mudanças de maior impacto, 39% dos profissionais aposta nas tecnologias de mobile video, 36% acha que é a alta definição quem mais terá impacto no mercado de mídia, e 16% acha que o maior provocador de mudanças serão os conteúdos feitos pelos próprios usuários. As respostas talvez comecem a surgir este ano.