A reciclagem energética, que consiste na transformação de resíduos sólidos (inclusive os não-recicláveis e orgânicos) em fontes de energias renováveis térmica e elétrica, tem sido cada vez mais utilizada em diversos países. Neste processo, os resíduos são queimados em um forno industrial em alta temperatura, fazendo com que os gases quentes sejam aspirados para uma caldeira de recuperação, onde é produzido vapor – que aciona o gerador. Em muitos casos, substitui a energia dos derivados do petróleo e gera menos gases do efeito estufa, associados ao aquecimento global.
Porém, a queima do lixo no Brasil ainda não é vista como uma prática correta e limpa, pois, em tese, libera gases poluentes durante a operação – um equívoco muito grande porque tecnologias disponíveis, já há alguns anos, permitem o controle dessas emissões atmosféricas. E, diferentemente da incineração, garante uma ação extremamente segura para o meio ambiente, durante e depois da queima.
Além dessa visão deturpada quanto à prática, a falta de investimentos, sejam eles de iniciativas privadas ou parcerias público-privadas (PPP), em tecnologias para a criação dessas usinas, é algo que preocupa e atrasa o sistema de reciclagem dos resíduos, impossibilitando a obtenção de grandes ganhos ambientais e sociais e a geração de riquezas por meio de um destino muito mais nobre, em vez do envio para os lixões – uma realidade triste e muito preocupante em nosso país.
Segundo dados da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (ANACE), o Brasil tem potencial de gerar cerca de 3% da demanda nacional por eletricidade por meio da reciclagem energética. Mas, infelizmente, essa prática é quase inexplorada no país, fazendo com que deixemos de aproveitar uma fonte ambientalmente sustentável e praticamente permanente. Já de acordo com a Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (ABREN), a tecnologia tem potencial de atrair R$ 145 bilhões em investimentos nos próximos 10 anos. As informações ainda revelam que, se uma fatia de 35% de todo o lixo descartado no país fosse destinada à geração de energia, o Brasil poderia produzir 1.300 GWh/mês.
Enquanto isso, quase 2.500 usinas do tipo operam no mundo, sendo a China a maior produtora de energia térmica a partir do lixo com 339 usinas e a Europa com 522 em operação – a Alemanha, por exemplo, aboliu os aterros sanitários em função da reciclagem energética.
As pessoas precisam entender que queimar não é destruir e, muito menos, ir contra a reciclagem. O grande desafio que enfrentamos é o equilíbrio econômico da cadeia de produtos, e o Brasil precisar agir, implementar tecnologias, investir e dar a devida atenção quanto ao descarte e destinação de resíduos. Falta conhecimento, investimento, responsabilidade ambiental e social.
Francisco Oliveira, engenheiro civil e mestre em Mecânica dos Solos, Fundações, Geotecnia e sócio diretor da EPAL Engenheiros Associados.