O aumento das tensões políticas entre os EUA, Rússia e China deve levar as empresas de tecnologia norte-americanas a enfrentar uma pressão prolongada e dificultar a realização de negócios nos dois países, que representam hoje os mercados em crescimento mais promissores para elas, alertou o presidente-executivo (CEO) da Cisco Systems, John Chambers, em uma entrevista ao jornal britânico Financial Times.
"Até que nossos países se entendam melhor, nós não vamos ver uma melhoria", disse Chambers, que deixará o cargo de CEO após 20 anos no comando da companhia e assumirá o posto de presidente-executivo do Conselho de Administração da empresa, a partir de 26 de julho. A entrevista foi concedida após a fabricante de equipamentos de rede divulgar o lucro trimestral, na quarta-feira, 13, que mostra o seu retorno ao crescimento estável, impulsionado principalmente pelas vendas nos dois países.
O colapso na demanda de TI em mercados emergentes tem sido um dos maiores temores da Cisco e de outras empresas de tecnologia dos EUA que, devido à volatilidade das condições econômicas e tensões políticas, estão enfretando uma retração acentuada nas vendas. "Embora alguns analistas inicialmente tenham alegado que a Cisco estivesse mais exposta, rapidamente se tornou claro que todas as empresas de TI norte-americanas enfrentaram as mesmas pressões", disse Chambers.
Lista negra do governo chinês
Em fevereiro, a Cisco e outras grandes empresas de tecnologia americanas foram incluídas em uma lista negra feita pelo governo chinês, que traz o nome das companhias que devem ter seus negócios dificultados no país. O governo pretende priorizar a compra de produtos feitos por fabricantes chineses ou por companhias "aprovadas".
No ano passado, por exemplo, escritórios do governo chinês em Pequim foram proibidos de comprar a última versão do Microsoft Windows, bem como o software de segurança da Symantec. Produtos da Intel e Citrix também estão entre os não aprovados. Já a Cisco, que contava com 60 itens na lista da Central de Compras Governamentais da China, em 2012, não teve nenhum de seus produtos aprovados para compra na relação de 2014.
A queda da demanda coincidiu com uma reação global após o ex-colaborador da Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês), Edward Snowden, ter vazado uma série de documentos que revelaram ao mundo o esquema de espionagem em massa do governo americano, entre eles um que acusava a empresa de cooperar com o governo norte-americano, fornecendo dados das comunicações de seus clientes mundo afora.
De acordo com os documentos, equipamentos da Cisco vinham com uma vulnerabilidade (backdoor), o que seria uma exigência do governo norte-americano, de acordo com matérias publicadas na imprensa internacional à época. Os documentos incluíam uma fotografia na qual agentes do governo americano apareciam abrindo um dos equipamentos da Cisco, enquanto aguardava para ser enviado a um cliente. A empresa negou todas as acusações.
Na quarta-feira, a Cisco informou que as encomendas de seus roteadores para internet, switches e outros equipamentos na China caíram 20% durante o primeiro trimestre, contribuindo para uma queda global de 6% nos países que compõem os Brics, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
"Outros países emergentes registram crescimento de 6%", acrescentou Chambers. "Enquanto os negócios da Cisco na Índia estão indo bem, no Brasil, estamos sofrendo com a desaceleração da economia. E as tensões políticas, que devem continuar, não melhoram as perspectivas na China e na Rússia", finalizou.