Nos últimos anos, o mercado de trabalho se transformou em um canibalismo irracional. Todos olham para o organograma e pensam, a todo tempo, como subir para a vaga desejada — ou para qualquer vaga, desde que se suba —, seguindo a velha máxima de querer levar vantagem em tudo.
Claro que nem sempre foi assim. E a boa notícia é que talvez estejamos prestes a presenciar o sepultamento desse modelo.
O início do canibalismo moderno teve origem lá pelo fim dos anos 1980, início dos 1990, quando alguns fatos relevantes podem ter colaborado para isso: começo da globalização; a quebra de barreiras internacionais, que proporcionaram um maior acesso ao emprego, não importando a nacionalidade ou a do profissional, mas sua competência; e a chegada de uma nova geração ao mercado de trabalho menos idealista e muito mais focada no seu próprio umbigo do que no coletivo (por aqui apelidada de geração Coca Cola).
Estes fenômenos provocaram algumas distorções importantes. A primeira foi no banco das escolas. Anos atrás, a formação técnica no nível médio era muito valorizada e o primeiro emprego era praticamente garantido — a maioria dos profissionais iniciava sua carreira pela base da pirâmide.
Com o passar do tempo, isso mudou. E muito. Atualmente, todo mundo busca uma formação superior e, imediatamente após a sua conclusão, corre em disparada para fazer todos os cursos de latu sensu possíveis (e no menor espaço de tempo, claro). A consequência é que ninguém quer começar a carreira na base da pirâmide, mas, no mínimo, como gerente sênior.
Observe: o que um dia foi chamado de pirâmide organizacional, hoje tem a forma de um hexágono, uma enorme quantidade de pessoas no meio e poucas na base e no topo.
Tanto para o mercado de trabalho e quanto para as empresas, o resultado dessas mudanças trazem consequências devastadoras geradas pela falta de maturidade dos profissionais, sejam eles gestores ou não, por egoísmo ou mesmo medo de perder o emprego.
O fato é que a incapacidade de preparar herdeiros para assumirem o seu lugar gera um enorme entrave para a sua ascensão profissional e um terrível prejuízo para as empresas. E estas tem uma enorme dificuldade de preencher suas posições, principalmente as estratégicas.
O desejo e a necessidade de demonstrar a todos, principalmente à chefia imediata, que está super enrolado e que não tem tempo para nada, gera a falsa ilusão para muitos que atitudes como essa são garantia de emprego. Na verdade não são.
Uma simples mudança de postura, de sempre ocupado para sempre prestativo, poderá se transformar em uma excelente oportunidade de exercitar a competência da liderança e iniciar, ou até consolidar, uma excelente network. O herdeiro de hoje pode ser o chefe ou o gerador de negócio de amanhã, sabendo que o aumento da empregabilidade a cada dia está mais ligado a quem você conhece do que àquilo que você conhece. Este tipo de atitude só poderá ser positivo para todos.
Ser um propagador de hereditariedade, ao contrário do que muitos pensam, não é um risco à sua empregabilidade. Ao contrário, é um aumento das possibilidades de emprego, uma redução do risco das empresas para encontrar o profissional correto para a posição ideal, além de uma a enorme possibilidade da erradicação de chefias truculentas.
Da mesma maneira que a globalização e os padrões americanos de competitividade invadiram as terras tupiniquins no fim dos anos 1980, sendo os alavancadores desse novo padrão de competitividade, o sopro de esperança que a nova geração vem demonstrando nos últimos dias pelas ruas do Brasil, mostrando uma imensa união e cooperativismo, pode ser o início de uma nova fase. Diferente de 20 anos atrás, quando as gerações se fecharam em seu próprio mundo, não se preocupando com quem estava em volta, as gerações mais novas, que foram para as ruas, estão mostrando que a união e a cooperação mútua consciente é capaz de mudar o país.
Quem sabe esta nova forma de pensamento e atitude possa invadir as corporações, modificando a maneira de pensar e agir das pessoas? Neste momento, preparar seu herdeiro deixará de ser um risco de perder o emprego para uma certeza de aumento da sua empregabilidade.
*Alberto Marcelo Parada é formado em administração de empresas e análise de sistemas, com especializações em gestão de projetos pela FIAP. Já atuou em empresas como IBM, CPM-Braxis, Fidelity, Banespa, entre outras. Atualmente integra o quadro docente nos cursos de MBA da FIAP, além de ser diretor de projetos sustentáveis da Sucesu-SP.