O Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMSUP), ligado à Secretaria de Estado da Saúde, com a presença do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anúncioou nesta seta-feira, 15, o recevimento de recursos no montante de R$ 20,2 milhões para a ampliação de Serviço de Tele-emergência e Tele-UTI do hospital. O Serviço consiste na orientação à distância, realizada por médicos do Incor especializados em atendimento de casos cardiológicos complexos, utilizando os recursos de imagem, som e transmissão de dados da telemedicina.
O diretor da Divisão de Cardiologia Clínica do Incor, Roberto Kalil, não tem dúvida de que, quando totalmente implantada, esta ação contribuirá efetivamente para a melhoria da qualidade do atendimento cardiológico de alta complexidade no Sistema Único de Saúde.
Segundo ele, num futuro próximo, mesmo no mais longínquo serviço de saúde do país, médicos poderão interagir em tempo real com os especialistas do Incor, resultando em mais agilidade e maior segurança no diagnóstico e na tomada de decisão sobre o melhor tratamento para cada caso.
“No curto prazo, o adequado cuidado ao paciente na ponta do sistema é fundamental para que consigamos diminuir o número de mortes por doenças cardíacas agudas como infarto, insuficiência cardíaca e arritmias e, no decorrer do tempo, a piora da qualidade de vida do paciente em decorrência da evolução da doença”, explica Kalil.
Como funcionará?
A implantação do projeto ocorrerá em três etapas. A primeira, de cerca de seis meses, e que deverá ter início ainda no primeiro semestre deste ano, será a da instalação da infraestrutura física, tecnológica e de recursos humanos do Serviço.
Consta também dessa fase, a inserção dos primeiros serviços que farão parte da fase-piloto do projeto: os prontos-socorros da Lapa e do Butantã, na Zona Oeste de São Paulo. “Estimamos que no primeiro ano o serviço esteja disponível para todo o Estado de São Paulo e, ao final de dois anos, para todo o Brasil”, afirma o dr. Múcio Tavares (diretor da Unidade Clínica de Emergência do Instituto) que, ao lado de Ludhmila Hajjar (diretora do Departamento de Pacientes Críticos do hospital), coordena o Serviço de Tele-Emergência e Tele-UTI Incor.
O ingresso das unidades de saúde no Serviço ocorrerá por indicação do Ministério da Saúde e Secretarias de Estado da Saúde. Mediante essa intermediação, as unidades admitidas receberão visita técnica da equipe do Incor para levantamento de necessidades de infraestrutura e de treinamento dos médicos, tanto para operar o sistema de discussão de casos clínicos pela Web, desenvolvido para o programa, quanto para executar o protocolo básico de diagnóstico e de tratamento da doença.
O sistema de discussão de casos clínicos é composto de equipamento de eletrocardiograma portátil, microcomputador com monitor de alta resolução, kit web, câmera full HD, microfone e headset. Possui ainda um software inédito, o MedCast, desenvolvido pelo Incor e pelo Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), que integra com segurança e privacidade as informações do paciente em ambiente Web, recursos tradicionais de telemedicina (webconferência com transmissão de dados, chat, som e imagem) com os de um call center, explica Marco Antonio Gutierrez, diretor do Serviço de Informática do Incor.
Com o MedCast em um computador ao lado da maca, o médico do serviço de emergência usuário preenche os dados da ficha médica do paciente, classificando também o grau de emergência do quadro. No Incor, o médico na estação de trabalho vê na tela do computador o aviso de chamada e a classificação de sua gravidade, de maneira que os casos mais urgentes sejam priorizados.
A partir da conexão, começa a transmissão de dados, imagens e voz numa webconferência entre os médicos, com o propósito de definir o diagnóstico e, se este for cardiológico, discutir a melhor conduta terapêutica.
Toda a discussão do caso clínico e as informações sobre o paciente são armazenadas em um banco de dados para consultas e análise futuras.
Treinamento
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morbidade, incapacidade e morte no mundo e no Brasil. A maioria das mortes por infarto ocorre nas primeiras horas de manifestação da doença (dor no tórax, sudorese etc.). Em termos percentuais: 65% dos óbitos acontecem na primeira hora e 80%, até 24 horas após o início do infarto.
A capacitação de profissionais para atendimentos de emergência e cuidados intensivos em cardiologia é uma das principais dificuldades para a assistência adequada ao paciente cardíaco, explica o dr. Múcio Tavares, coordenador do Serviço de Tele-Emergência e Tele-UTI Incor.
Os problemas, contudo, não param aí. Geralmente esses serviços não seguem protocolos de atendimento, segundo o que está estabelecido nos consensos médicos internacionais – ou seja, o passo a passo, consagrado pelos principais centros cardiológicos do mundo, do que deve ser feito (exames, procedimentos, intervenções) e do que deve ser ministrado ao paciente para que a sua vida seja salva, com o menor número de sequelas possível.
Tampouco possuem estrutura tecnológica e recursos humanos que permitam, por exemplo, realizar um exame básico como o eletrocardiograma em tempo adequado para diagnosticar um possível infarto – menos de dez minutos desde o começo do atendimento – e processar sua leitura de forma correta.
“Doença cardíaca mal diagnosticada resulta em tratamento ineficaz, maior incidência de morte e pior qualidade de vida para o paciente na evolução da doença”, diz a dra. Ludhmila, coordenadora do Serviço de Tele-Emergência e Tele-UTI Incor.
No Brasil, segundo ela, de 85% a 90% das pessoas com infarto agudo do miocárdio que são atendidas nos serviços médicos permanecem nessas unidades de saúde apenas para observação, quando já deviam estar sob tratamento intensivo, ou para tratamento de complicações decorrentes de diagnóstico tardio do infarto.
O fato resulta num péssimo prognóstico para o sistema de saúde do País. Isso porque as doenças cardiovasculares são tão mais dispendiosas quanto mais avançado é o estágio da doença. Um exemplo claro dessa relação perversa são os gastos com o tratamento da Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC), uma das sequelas mais comuns do infarto não adequadamente tratado.
Em 2011, a ICC foi a terceira causa de internação no Brasil e consumiu 2,6% de todos os recursos aplicados em saúde pelo SUS. Em 2011, o que se gastou com internação por ICC representou 27% (R$ 305 Milhões) a mais de tudo o que foi despendido em infarto agudo do miocárdio.