Não é mais novidade que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) está em pleno vigor e desde 1º de agosto de 2021, passaram a ser aplicáveis também as sanções administrativas previstas na legislação.
Desde então, todas as empresas são passíveis de serem autuadas e sofrerem sanções administrativas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), a qual dentre outras atribuições, incumbe fiscalizar e aplicar sanções em caso de tratamento de dados realizado em descumprimento à legislação.
Portanto, com a possibilidade de aplicação das sanções, mais do que nunca as empresas devem se adequar à legislação de tratamento de dados para prevenir eventuais passivos pelo seu descumprimento. Entretanto, engana-se quem pensa que somente a ANPD terá competência para exigir a aplicação da norma: ela poderá ser exigida por várias outras entidades.
Diversas ações já tramitam na Justiça do Trabalho para garantir os direitos dos empregados pelo tratamento de seus dados nas relações de trabalho e estas ações podem ser ajuizadas diretamente pelo empregado contra seu empregador de forma individual, bem como por instituições que detêm legitimidade para defender coletivamente os direitos individuais dos trabalhadores.
No âmbito laboral, instituições como Ministério Público do Trabalho e Sindicatos dos Trabalhadores também possuem legitimidade para fiscalizar, instituir regras sobre o tema em suas negociações coletivas e principalmente propor ações judiciais para exigir o cumprimento da LGPD por intermédio do Poder Judiciário.
Caso Indústrias de Alimentação de Montenegro-RS
Recentemente, por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, julgou uma Ação Civil Coletiva proposta pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Montenegro-RS, em face da Cooperativa dos Citricultores Ecológicos do Vale do Cai Ltda, alegando possíveis descumprimentos da LGPD pela empregadora.
O Sindicato, autor da ação, alegou que a empresa compartilhava dados dos empregados com diversos outros controladores e operadores, sem as cautelas necessárias, que não havia indicação de encarregado pelos dados pessoais e, ainda, que o tratamento de dados seria compartilhado por intermédio da internet, deixando de respeitar a intimidade, privacidade e imagem dos empregados.
O processo foi julgado em primeira instância, tendo a juíza do caso reconhecido que a cooperativa não "demonstrou por nenhum meio a implementação de um único dispositivo da LGPD". Em consequência, os pedidos da ação foram julgados parcialmente procedentes para determinar que a empresa indique e nomine encarregado (DPO); que a reclamada implemente e comprove nos autos as práticas relacionadas à segurança e sigilo de dados, sob pena de multa diária de mil reais.
Esta decisão do TRT da 4ª Região é a primeira favorável em doze ações civis públicas ajuizadas pelo mesmo Sindicato no Estado do Rio Grande do Sul.
Tal decisão serve como alerta aos empregadores, pois ela legitima o Sindicato a exigir o cumprimento das regras da LGPD e demonstra que o cumprimento da LGPD, pelos empregadores, possui ampla margem de discussão, para além da esfera administrativa e que estes assuntos podem ser pauta recorrente de discussão em processos judiciais.
Além disso, a decisão deve servir como incentivo para que empregadores passem a cumprir e se adequar à LGPD, pois evidencia que a fiscalização e cobrança pelo cumprimento da norma não virá somente da ANPD, por meio de sanções administrativas, mas por entidades públicas e sindicais e dos próprios empregados, através de demandas e determinações intermediadas pelo Poder Judiciário.
Rafael Amaral Borba, sócio da BPH Advogados.