As empresas de distribuição de energia elétrica estão com planos bem mais ambiciosos do que a simples operação de serviços de PLC (Powe Line Communications), uma espécie de banda larga pela tomadas elétricas. Elas cogitam a criação de uma smart grid, ou seja, uma rede convergente de telecom sobre a rede elétrica que pode impulsionar o setor de energia e transformar a rede em mais uma importante plataforma de convergência de serviços.
As distribuidoras imaginam que o PLC será o pontapé para a criação de um "setor elétrico digital", nas palavras de Pedro Jatobá, presidente da Aptel (Associação de Empresas Proprietárias de Infraestrutura e Sistemas Privados de Telecomunicações). Jatobá e o presidente da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidoras de Energia Elétrica), Luiz Carlos Guimarães, estiveram nessa segunda-feira, 15, com o diretor-geral da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), Nelson Hubner, apresentando as linhas gerais de suas ideias para o setor a partir do PLC.
Nesse momento, as empresas distribuidoras de energia esperam pela regulamentação da oferta do serviço – também chamado de BPL (Broadband Power Line) – por parte da Aneel. "A gente está caminhando para uma evolução: a implantação de uma smart grid de energia. O setor elétrico está no limiar de uma mudança muito forte. De se tornar um 'setor elétrico digital'", avalia o presidente da Aptel.
Projeto nacional
O plano defendido por Jatobá é que o governo adote um projeto nacional de transição tecnológica no ramo de energia – "assim como foi feito com a TV digital", afirma Jatobá – promovendo a "digitalização" em toda a cadeia de distribuição. Um projeto dessa magnitude, com perfil de política pública, depende de uma diretriz do Ministério de Minas e Energia e não somente da Aneel. Mas o primeiro contato foi feito com a agência reguladora para que ela não engesse o regulamento do PLC que está prestes a editar.
A principal reclamação das distribuidoras com relação ao regulamento em gestação continua sendo a proposta da Aneel de criação de um "concessionário de PLC", medida já criticada ao longo do processo de consultas e audiências públicas sobre o assunto no setor elétrico. A argumentação usada para eliminar essa espécie de intermediário também não é nova: a tese das distribuidoras de que a adoção dessas tecnologias tem efeitos positivos para a própria oferta de energia elétrica, com a melhoria dos mecanismos de controle e gestão da rede. "Uma tecnologia como essa pode acabar sendo imprescindível no futuro do próprio setor elétrico", reforça Jatobá.
Altos custos
Com o discurso de que a evolução tecnológica das redes terá impacto prioritário na melhora da oferta de energia – e apenas o "excedente" da capacidade será usado para a comercialização de outros serviços, como banda larga -, a Aptel acredita que o projeto de criar uma "smart grid" em telecomunicações tem potencial para decolar. O plano, no entanto, é absolutamente inviável sem a adesão do governo, com criação de linhas de financiamento no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para assegurar a execução dessa potencial política pública.
O problema é que os investimentos para uma rede de distribuição de telecom e energia como a do estado de São Paulo consumiriam nada menos do que US$ 1 bilhão aproximadamente. Uma projeção informal desses custos para toda a rede de distribuição do país colocaria o projeto na casa dos US$ 10 bilhões. O tempo de transição também não é curto.
A estimativa da Aptel é que esse "upgrade" na rede elétrica seja um projeto de médio prazo e levaria, no mínimo, 10 anos para ser concluído. Parâmetros para esses cálculos são encontrados na experiência internacional. A Itália, para atualizar tecnologicamente seus cerca de 30 milhões de medidores, levou quatro anos. No Brasil, existem hoje aproximadamente 70 milhões de medidores de energia elétrica.
O audacioso projeto ainda não foi apresentado formalmente para a Aneel e demais órgãos do setor. A Aptel estima que concluirá a proposta entre 30 e 60 dias. As expectativas são positivas também pelo potencial impacto no mercado de desenvolvimento tecnológico. Isso porque o Brasil é responsável por metade do mercado de energia elétrica da América Latina, sendo um catalisador de tendências nesse setor. "Uma decisão tomada aqui pode influenciar outros países", analisa Jatobá. Argumentação igual foi usada no projeto de escolha do modelo de TV digital no Brasil.
Impactos futuros
Mesmo com o insistente discurso de que a evolução tecnológica no setor elétrico tem como principal alvo a melhoria na energia, o potencial de um projeto como este para a diversificação de serviços pelas distribuidoras é inegável. "Seria muita cegueira não imaginar que a distribuidora pode diversificar sua oferta", admite Pedro Jatobá. Assim, a adoção de uma política de construção de uma smart grid no setor elétrico pode ser o início da criação de um novo player de peso na oferta de serviços de telecomunicações.
Por ora, a regulamentação emitida pela Anatel no ano passado permite que as distribuidoras ou suas subsidiárias obtenham uma licença de SCM (Serviço de Comunicação Multimídia) e iniciem a oferta de serviços de banda larga via PLC. Mas sem o regulamento da Aneel, as concessionárias de energia ainda estão amarradas. Ocorre que os testes feitos pela Copel (Companhia Paranaense de Energia) com essa tecnologia demonstram que as distribuidoras querem ir além da banda larga.
Em parceria com a Sercomtel – com a qual divide o principal acionista, o governo do Paraná -, a Copel tem oferecido a seus clientes na área de teste um "pacote" de banda larga com telefonia fixa. Na prática, a presença da Sercomtel é apenas para validar a oferta do ponto de vista legal e regulatório, uma vez que o telefone oferecido pela Copel também é via PLC. Junto a outras cinco distribuidoras – CEB (DF), Cemig (MG), Light (RJ), Celg (GO) e Excelsa (ES) -, a Copel compõe o lote das distribuidoras "pioneiras" nos testes com as tecnologias de modulação da rede elétrica para a oferta de serviços de telecom.
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