Carteiras de crédito: benefício para credores e devedores

0

As condições adversas da economia brasileira, com inflação, juros e inadimplência em alta, e os crescentes desafios mundiais pós-pandemia agravados pelos efeitos da guerra da Ucrânia, gera um problema para as instituições credoras, mais ao mesmo tempo é uma oportunidade de fazer caixa a partir da cessão desses créditos. 

Esta alternativa saudável para obter liquidez e reduzir o prejuízo ocasionado pela inadimplência, ainda é desconhecida e pouco celebrada pelo sistema financeiro. Além dos grandes bancos, historicamente os principais ofertantes desse tipo de ativo, outros segmentos começam a recorrer ao mercado de cessão de carteira de crédito como forma de lidar com dívidas vencidas e reforçar o caixa, como é o caso das fintechs, bancos digitais, varejo, saúde e educação. 

A tendência de diversificação de origens e volumes maiores se explica também pelo crescimento recorde e ritmado da inadimplência, gerando um cenário em que as dívidas só se acumulam e o dinheiro se torna ainda mais escasso. Por qualquer ângulo que se observe, os números do endividamento assumem proporções superlativas e, pior, em viés de alta. 

Para se ter uma ideia, o percentual de famílias endividadas no Brasil em outubro chegou a 79,2%, conforme Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor apurada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). O percentual de famílias com contas em atraso subiu para 30,3%. Pelo menos 10,6% delas revelam não ter condições mínimas de pagar seus débitos. Ainda, segundo o mais recente Mapa da Inadimplência e Negociação de dívidas no Brasil, divulgado pela Serasa, o total de CPFs inadimplentes alcançou a histórica marca de 68, 7 milhões de brasileiros. 

Fortes ou frágeis, recentes ou antigas, as dívidas que se acumulam são de toda a ordem, de cheque pré-datado ao cheque especial, desde cartão de crédito até os tradicionais carnês de lojas, de crédito consignado ao empréstimo pessoal, ou mesmo a prestação do carro, da casa e das contas mais básicas, como água, luz, gás e telefone.  

Nesse cenário hostil, as formas de recuperação de crédito oferecidas pelas empresas especializadas do setor que compram esses créditos que não forma pagos (NPL –Non Performing Loans), despontam como alternativa viável, uma solução que pode beneficiar tanto os consumidores quanto as empresas.  

Regulamentada pelo Código Civil Brasileiro no artigo 286, a venda de carteiras de crédito representa a transmissão de obrigações, em que o credor transfere uma dívida a outro e amplia o leque das variáveis de negociação do débito, como tempo de dívida, ticket médio, perfil do endividado, exigência ou liberação de garantias e outras possibilidades. 

Pode parecer paradoxal, mas entre a rocha e o rochedo a carteira de crédito atua como um poder moderador do endividamento brasileiro, equalizando uma negociação na qual todos podem sair de alguma forma beneficiados, desde o grande banco que vendeu a dívida com deságio até o mais humilde cidadão que pretende tão somente se livrar do incômodo nome sujo. 

A venda de carteiras de credito não performados ou performados, possibilita as empresas, por exemplo, que em vez de alocarem equipes, engordarem estruturas e despenderem esforços na cobrança de inadimplentes mantenham seu foco e sua energia apenas no core business.  

Outros benefícios da venda dessa classe de ativos são possibilidade de reduzir o risco do portfólio, obter liquidez imediata, melhorar o balanço e utilizar benefícios fiscais. 

As empresas que adquirem essas carteiras, contam com uma expertise na negociação, profissionais especializados e tecnologias avançadas, e assim acabam tornando mais leve, simples, ágil e eficiente o processo de cobrança. Focadas em originar serviços e recuperar crédito, podem disponibilizar descontos mais generosos e alargar prazos, adequando-se a orçamentos dos mais variados portes. 

Quem vende a dívida sem perspectiva de recebê-la protege a marca e continua investindo. Quem compra, fortalece a musculatura de negociação e faz a economia girar. Já o cidadão endividado, a ponta mais frágil da cadeia financeira, encontra na cessão da carteira de crédito uma possibilidade de limpar o nome, reorganizar as finanças pessoais, recuperar a dignidade e voltar a sonhar. 

O Brasil tem um estoque de dividas superior a R$ 2 Tri, o que gera um potencial expressivo de créditos a serem comercializados. Somado isso ao interesse dos investidores nesses ativos e ao ingresso de novos players no setor, podemos afirmar que a compra e venda de créditos vai crescer e vai alcançar empresas de diversos setores, tornado essa alternativa uma ferramenta financeira para obter liquidez, como já acontece nos países de economias avançadas. 

Ignácio Dameno, co-founder da Global NPL.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.