A geolocalização ou georreferenciação, consiste na possibilidade de localização de pessoas ou objetos, através da sua posição geográfica, captadas automaticamente por meio de dispositivos conectados à internet, satélite ou radiofrequência.
A sua utilização teve início na Guerra Fria, como estratégia para identificar tropas, mas hoje, com o avanço da tecnologia passou a ser utilizada em larga escala, na área de segurança, nas ações de marketing, na logística dos negócios, na gestão de ponto, no transporte, e também, como meio de prova.
Atualmente, quase todas as pessoas, tem, ao menos, um aparelho celular e fazem uso de aplicativos que permitem a localização, por essa razão, algumas empresas passaram a requerer a quebra do sigilo telemático, onde é possível a verificação do local que a pessoa se encontrava em determinado período com a finalidade de afastar o pedido de horas-extras ou mesmo de reconhecimento de vínculo de emprego.
O deferimento desse meio de prova ainda é controvertido, vez que a Constituição Federal, no artigo 5º, XII, garante a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, sendo ressalvado no caso das comunicações telefônicas, a sua quebra mediante ordem judicial, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Também a Lei n.º 13.709 de 2018, chamada Lei Geral de Proteção de Dados, dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, com o intuito de garantir e proteger direitos fundamentais, dentre eles a privacidade. A garantia da vida privada também é assegurada internacionalmente, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Para os que indeferem a geolocalização como meio de prova, a justificativa é que a exibição da geolocalização, durante longo período, revelando os lugares e horários que a parte esteve, vinte e quatro horas por dia, viola a privacidade e o direito ao sigilo telemático, além de ser desproporcional pelo fato da duração da jornada externa poder ser constatada por outros meios de prova.
Os que admitem esse meio de prova fundamentam no princípio basilar da Justiça do Trabalho, qual seja, o da primazia da realidade, onde o que se busca é a verdade real, independente do que está escrito e por essa razão, mesmo que no processo do trabalho o princípio da oralidade tenha um papel especial, seja pelo depoimento das partes ou pelo depoimento de testemunhas, ainda que realizado na presença do Juiz, o depoimento das testemunhas, podem apresentar falhas e muitas vezes não existir testemunhas. Considerando que o artigo 370 do Código de Processo Civil determina que caberá ao Juiz a condução do processo, ele pode de ofício ou a requerimento das partes, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, razão pela qual não haveria nenhum óbice à utilização do registro de dados, vez que seriam úteis para auxiliar na comprovação de fatos controvertidos.
Não obstante esse meio de prova tenha sido requerido com mais frequência pelas empresas a fim de afastar ou pedido de horas-extras ou até mesmo para demonstrar o cometimento de faltas pelo empregado, também seria possível o seu uso pelo empregado, em especial nos casos em que se alega a prestação de serviços no endereço da empresa e essa, em contestação nega a prestação de serviços, caso em que se inverte o ônus da prova e o empregado não possui outros meios de prova.
É inegável que a utilização desse meio de prova poderá contribuir muito para a efetividade do processo e principalmente para se alcançar a verdade real, princípio basilar da Justiça do Trabalho, mas, deve ser utilizado com parcimônia, e para se evitar violação aos princípios e ofensas aos direitos humanos, o ideal é que quando esta prova se fizer necessária, que o processo tramite em segredo de justiça, para que apenas as partes, seus advogados e a autoridade competente tenham acesso aos dados.
Sem dúvida, a possibilidade de utilização desta tecnologia na relação de trabalho é uma realidade que deve ser avaliada caso a caso e com cautela posto que, não se pode ter como objetivo a quebra do sigilo e sim, a busca da verdade que, no caso concreto, deverá contribuir para o resultado efetivo da demanda, caso contrário, a pretexto de uma prova essencial, haveria nítida violação a direitos e princípios constitucionais.
Jânia Aparecida P. dos Reis, advogada da área trabalhista do Cunha Ferraz Advogados.