Não é novidade que a formalização de acordos e negócios no "fio do bigode", tão comum na época de nossos avós e seus antepassados, está em desuso, sobretudo em uma sociedade pautada por relações cada vez mais complexas e envoltas em transações com inúmeras nuances, obrigações e contraprestações dos mais variados tipos.
Como consequência desta evolução de negócios, pessoas físicas e jurídicas – ao menos aquelas com interesse na redução de riscos e prejuízos – buscam formalizar documentalmente, de forma clara e juridicamente válida, cada uma de suas relações. Assim, em caso de descumprimento das obrigações reciprocamente assumidas, a instrução de uma eventual demanda judicial encontrará respaldo probatório concreto, facilitando o convencimento do juízo competente para decidir o litígio.
Não basta, contudo, a simples documentação. O direito exige, para sua validade, a observância de alguns pressupostos legais, principiológicos e elementares, principalmente quando há pretensão de constituir, através do pacto, um título executivo extrajudicial capaz de conferir uma celeridade à prestação jurisdicional do Estado, quando necessária, tornando desnecessária a ação de conhecimento prévia.
Sob a óptica legal, a execução de um contrato particular tem como sua principal exigência – se é possível um escalonamento – a assinatura do devedor e a ratificação dos seus termos por duas testemunhas – Art. 784, inciso III, do CPC –, usualmente, sem interesse direto no cumprimento de seus termos.
Bem verdade que, desde a publicação da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, e especialmente após a entrada em vigor do atual Código de Processo Civil, alguns julgados relativizaram a exigência de testemunhas para a validação de sua integridade, validade e autenticidade, quando o instrumento particular executado apresentar assinatura pelo sistema de chaves públicas, como se exemplifica através da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Recurso Especial nº 1.495.920/DF.
O fundamento invocado pelo STJ, naquela decisão, em síntese, comprova que o sistema de assinatura supra referido tem a vocação de garantir, através da própria autoridade certificadora, a identidade das partes e o teor do documento assinado.
O entendimento jurisprudencial, contudo, não confere a segurança jurídica necessária para a assertiva de que as testemunhas podem, sem sombra de dúvidas, serem dispensadas nos contratos particulares que visem a constituição de um título extrajudicial.
Para acabar com essa margem interpretativa, causadora de dúvidas e incertezas, foi sancionada, no último dia 13 de julho, a Lei nº 14.620/23, que dispõe sobre o Programa "Minha Casa, Minha Vida" e acrescenta ao artigo 784, do Código de Processo Civil, a seguinte redação: "Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura."
Uma medida legislativa inovadora que simplifica a criação de títulos executivos extrajudiciais, sem comprometer a segurança jurídica das partes envolvidas. Agora, não será mais necessário apresentar testemunhas para comprovar um acordo, desde que seja firmado através de plataformas de assinatura eletrônica confiáveis.
Felipe Antunes, Advogado e consultor de projetos do escritório Biolchi Empresarial.