O Grupo Telefônica parece não estar nada satisfeito com o novo Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU III) apresentado pela Anatel em audiência pública nesta segunda-feira, 20. Apesar de a Telefônica ter saldo positivo nos cálculos apresentados pela agência – ou seja, a mudança das metas gera ganhos que superam os custos das novas obrigações para a empresa -, a equipe da concessionária tem criticado reiteradamente a principal meta de universalização que vigorará entre 2011 e 2015: a ampliação da capacidade do backhaul.
Há duas semanas, a concessionária levantou dúvidas sobre a natureza dessa rede em debate sobre o PGMU no Conselho Consultivo da Anatel. Na ocasião, os representantes da Telefônica questionaram porque a agência reguladora está impondo uma meta que não beneficiaria diretamente a telefonia fixa (alvo do PGMU), mas sim a oferta privada do Serviço de Comunicação Multimídia (SCM).
Na audiência de hoje, os executivos da empresa voltaram a tocar a mesma tecla, ainda que de forma sutil. A diretora de Assuntos Jurídicos Regulatórios da Telefônica, Camilla Tápias, disse que, da maneira com que o plano está redigido, há uma grande "insegurança jurídica". Um dos pontos criticados é a previsão, ainda não detalhada, de que a concessionária deverá oferecer backhaul por demanda dos interessados.
Para Camilla, essa indefinição de como será caracterizada a demanda é um problema. Na eventualidade de a Anatel decidir que todos os interessados devem ter acesso à rede, a diretora interpreta que o PGMU estaria extrapolando sua função. "A oferta pública de backhaul a todos os interessados em locais já atendidos foge do escopo da universalização. A concessionária tem a obrigação de levar a oferta onde não tem, mas não de atender a demanda de todos", protestou.
Prazos legais
Assim como as demais empresas, a Telefônica pediu mais prazo para o término da consulta, fixado para o dia 23 de setembro, para que estes aspectos possam ser esclarecidos. Em uma ameaça velada de levar o debate sobre o PGMU para a Justiça, a representante da Telefônica levantou outro aspecto polêmico mas, à primeira vista, de importância menor do que o escopo das metas em si. O ponto de atrito mais forte está no prazo entre a aprovação do PGMU III e sua entrada em vigor.
Caso seja aprovado pelo Conselho Diretor ainda neste mês, o novo PGMU estaria sendo apresentado plenamente às empresas como plano de obrigações para os próximos quatro anos apenas três meses antes de entrar em vigor. Acontece que a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) possui uma diretriz clara de que as novas obrigações devem ser levadas ao conhecimento das concessionárias pelo menos 24 meses antes de serem implantadas. Para cumprir o prazo legal, a Anatel deveria ter fechado o novo plano de metas até 31 de dezembro de 2008 já que ele entra em vigor no dia 1º de janeiro de 2011.
"A Telefônica está muito preocupada com o PGMU III", afirmou Camilla. "E agora, faltando menos de quatro meses para a entrada em vigor a Anatel apresenta um PGMU com novas metas?", questionou a diretora, lembrando que o descumprimento da previsão de antecedência de 24 meses pode ser questionado pela concessionária.
Banda larga no STFC
O advogado Floriano de Azevedo Marques também compareceu à audiência pública sobre o PGMU e fez críticas às metas de universalização do backhaul assim como a Telefônica. Marques tem hoje entre seus clientes a empresa Terra, do Grupo Telefônica, embora tenha se pronunciado no encontro dessa segunda em nome próprio. Para o advogado, especialista na área de telecomunicações, é perigoso a Anatel fixar obrigações para uma rede que é objeto de discussão na Justiça.
Lembrando a existência de uma ação do órgão de defesa do consumidor ProTeste que questiona a manutenção do próprio PGMU e, especialmente, a natureza do backhaul, Marques alertou que a expansão dessa rede por meio de obrigações impostas às concessionárias pode ter um preço alto para a própria Anatel. Se a Justiça entender que esta rede não é um elemento essencial para a oferta do serviço público, como afirma a Anatel, a União pode ser obrigada à indenizar as concessionárias pelas metas exigidas no PGMU III.
Mas o ponto-chave da intervenção de Marques é com relação à natureza em si do backhaul. "Parte do que se está querendo universalizar não cabe nos contratos de concessão", afirmou o advogado com relação ao backhaul. A declaração reforça a visão apontada veladamente pela Telefônica – e pela ProTeste em sua ação judicial – de que essa rede, na verdade, pertence ao SCM, um serviço privado e, portanto, não sujeito a metas de universalização.
Marques mostrou-se preocupado de o Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) virar um "serviço guarda-chuva", onde novas ofertas, como a de banda larga, vão sendo inseridas apesar de não haver previsão legal ou contratual para tal. Um aspecto conceitual foi levantado pelo advogado como indício desse problema: a Anatel fixar uma meta de expansão de rede ao invés de focar na oferta do serviço ao usuário, como fez nos PGMUs anteriores. A lógica oculta por trás da ressalva feita por Marques com relação à nova filosofia do PGMU III é que, se a Anatel fixar a obrigação com foco no serviço final, ficaria evidente que trata-se de oferta de banda larga e não de telefonia fixa, extrapolando o território de imposição de metas de universalização.
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