Atuo há bastante tempo no setor de alimentação fora do lar, mas como tenho formação e boa experiência profissional em TI, nunca deixei de acompanhar o desenvolvimento desta área. E, a cada ano, mais e mais a tecnologia tem transformado de forma contundente a maneira como vivemos, pensamos e realizamos negócios. Uma jornada irreversível de mudanças. Especificamente na área da alimentação, as alterações estão nas operações logísticas, na gestão da rede de franquias, nas próprias operações dos restaurantes, nos canais da demanda dos clientes e em toda a indústria fornecedora.
Agora, a hype é a tal da IA. Mas é essencial observar que a Inteligência Artificial é um tema recorrente já há alguns anos, ainda que as suas aplicações fossem visíveis apenas para quem atuava em tecnologia. De fato, começaram a ser mais conhecidas a partir da disseminação da análise de dados utilizada pelas empresas em seu dia a dia, das avaliações de desempenho (essa aplicação é conhecida por cada um quando avaliado pelo RH), às pesquisas de mercado, passando pela definição de metas e gestão de estoques e fornecedores.
Para o nosso segmento, um dos primeiros usos é na análise de dados, onde o uso de ferramentas de IA pode nos apoiar no estudo das preferências e demandas por produtos de nossos clientes em cada uma das regiões brasileiras onde atuamos. A junção destas análises com as informações de fornecedores e operadores logísticos poderá representar significativos aumentos de eficiência, permitindo redução de custos na ponta.
No entanto, se as áreas de marketing são fortes usuárias dos recursos de IA, o tema do momento, ChatGPT, emerge como o vilão, uma espécie de Darth Vader da tecnologia. A importância do ChatGPT vai além de uma palavra da moda, a novidade, que atua com base na leitura de textos da internet e orientação de humanos, pode ser revolucionária no universo do marketing digital. Entre outras utilidades, pode produzir conteúdos e ofertas personalizadas, focando a ação de marketing, melhorar em muito o atendimento dos clientes e otimizar planos de mídia, entre outras.
Darth Vader porque logo se instalou o debate não sobre o "se", mas o "quando" a IA irá tornar os humanos quase dispensáveis também nas atividades baseadas em criatividade. "Só nos restará o "happy hour", como disse um colaborador de nossa agência, "e mesmo assim porque os robôs não bebem". Santo exagero.
Uma IA muito bem alimentada de informações, com acesso aos bancos de dados dos melhores museus do mundo, poderá eventualmente repetir uma linda obra no estilo de Claude Monet, mas jamais será responsável pela criação de um novo Impression du Soleil Levant – Impressão do Nascer do Sol, considerada a primeira obra prima do impressionismo, e que mudou a arte para sempre.
No meu tempo de vida profissional tive a oportunidade de vivenciar a passagem do telegrama para a mensagem instantânea e dos computadores IBM1130 para os smartphones, vi a substituição do homem por robôs em atividades repetitivas ou brutais, estou vendo a sua substituição também em atividades de vendas e de escritório, mas não conheço nenhuma empresa, de qualquer porte, sem "gente", sem pessoas, sem cultura, sem decisões que não cabem em planilhas. O chamado "desemprego por tecnologia" mostra apenas o atraso da educação brasileira.
Não tenho qualquer receio quanto ao nosso futuro de humanos em um mundo cada vez mais tecnológico, prefiro simultaneamente evoluir com o conhecimento e ficar com a criatividade de Gilberto Gil:
Antes longe era distante
Perto, só quando dava
Quando muito, ali defronte
E o horizonte acabava
Hoje lá trás dos montes, den de casa, camará
De jangada leva uma eternidade
De saveiro leva uma encarnação
De avião, o tempo de uma saudade
Esse tempo não tem rédea
Vem nas asas do vento
Cláudio Miccieli, diretor de gestão da Rede Giraffas.