Nos últimos anos, o aumento da ocorrência de incêndios florestais e o avanço do desmatamento têm se tornado questões de grande preocupação ambiental e social em diversas regiões do Brasil e do mundo. O impacto devastador desses eventos não se limita apenas à destruição da biodiversidade, mas também afeta diretamente a qualidade do ar, o equilíbrio climático e a economia de comunidades que dependem dos recursos naturais. Nesse contexto, a Inteligência Artificial (IA) se apresenta como uma ferramenta poderosa para a prevenção, predição e combate eficaz a incêndios e desmatamentos, além de ser um recurso estratégico para a otimização da distribuição de recursos financeiros e operacionais.
A prevenção de incêndios e o controle do desmatamento requerem vigilância constante e a capacidade de prever com precisão quando e onde esses eventos podem ocorrer. A IA, por meio de algoritmos avançados de aprendizado de máquina e análise de big data, pode transformar completamente a maneira como monitoramos e prevemos essas ocorrências. Ao integrar dados de satélites, sensores terrestres, câmeras e drones, é possível analisar informações em tempo real sobre mudanças na vegetação, clima, umidade do solo, direção do vento e outros fatores ambientais que podem contribuir para o surgimento de focos de incêndio.
Esses sistemas inteligentes são capazes de aprender padrões históricos e identificar as condições ideais para a eclosão de incêndios, muitas vezes com horas ou até dias de antecedência. Dessa forma, as autoridades podem tomar medidas preventivas, como a mobilização de brigadas de incêndio, bloqueios de estradas, evacuação de áreas de risco e até mesmo o controle preventivo de queimadas em regiões estratégicas. Em relação ao desmatamento, a IA pode utilizar imagens de satélite de alta resolução para detectar desmatamentos ilegais em áreas protegidas, analisando a degradação da cobertura vegetal em tempo real e emitindo alertas automáticos para as autoridades competentes.
A predição de incêndios florestais e desmatamentos também pode se beneficiar de modelos de IA que levam em conta dados socioeconômicos e comportamentais. Por exemplo, em áreas com forte pressão de expansão agrícola, onde há um histórico de incêndios provocados para a limpeza de terrenos, a IA pode identificar padrões de risco associados ao comportamento humano, permitindo que políticas públicas sejam orientadas de forma mais precisa.
Outro grande desafio enfrentado por órgãos de combate a incêndios e desmatamentos é a distribuição eficiente de recursos, sejam eles financeiros ou operacionais. Quando múltiplos focos de incêndio surgem em diferentes regiões, a tomada de decisões sobre onde e como alocar as equipes de combate, os equipamentos e o financiamento adequado pode ser complexa. Nesse sentido, a IA pode desempenhar um papel fundamental na otimização da logística de combate.
Sistemas inteligentes baseados em IA podem processar rapidamente um grande volume de dados para determinar, por exemplo, quais áreas estão sob maior ameaça e quais incêndios apresentam maior potencial de se alastrar com mais rapidez. Esses algoritmos podem considerar variáveis como a densidade da vegetação, a proximidade de centros urbanos, a direção e a velocidade dos ventos, e até mesmo os recursos já disponíveis em campo. A partir dessas análises, as autoridades podem tomar decisões mais assertivas sobre o deslocamento de brigadas de incêndio, o envio de aeronaves para controle aéreo e a realocação de recursos para áreas prioritárias.
Além disso, em termos financeiros, a IA pode ajudar na alocação de orçamentos de forma mais eficaz, destinando mais recursos às áreas que realmente precisam de investimentos maiores, seja para a prevenção de incêndios, seja para o combate direto a focos já existentes. Isso ajuda a evitar o desperdício de recursos e garante que regiões de maior vulnerabilidade tenham a assistência necessária.
A tendência é que, nos próximos anos, a IA se torne ainda mais integrada à gestão ambiental, não só em relação ao combate a incêndios e desmatamentos, mas também em várias outras frentes de conservação ambiental. A combinação de tecnologias como internet das coisas (IoT), drones autônomos e sistemas de monitoramento inteligente pode criar uma rede de proteção altamente eficiente para áreas de floresta, parques nacionais e outras zonas de preservação. Essas redes, associadas a sistemas de IA, seriam capazes de detectar e agir contra ameaças em tempo real, praticamente sem a necessidade de intervenção humana.
No entanto, é importante ressaltar que o uso da IA para a preservação ambiental não substitui a necessidade de políticas públicas robustas e de um esforço conjunto entre governos, organizações não-governamentais e o setor privado. O desmatamento e os incêndios florestais têm raízes complexas, que envolvem interesses econômicos, sociais e culturais. A tecnologia, por si só, não resolve esses problemas, mas é uma ferramenta que pode ser usada de forma estratégica para aumentar a eficiência e a precisão das ações de combate e prevenção.
A Inteligência Artificial já demonstrou seu potencial transformador em diversas áreas, e no combate aos incêndios e desmatamentos não é diferente. Sua capacidade de prever, monitorar e otimizar a resposta a esses eventos pode significar a diferença entre a preservação de ecossistemas valiosos e a devastação irreversível. À medida que essas tecnologias evoluem, será essencial garantir que estejam acessíveis a todas as regiões, especialmente as mais vulneráveis, e que sejam integradas a um plano mais amplo de preservação ambiental, com a participação ativa de toda a sociedade. O futuro do nosso planeta pode depender da sinergia entre a inteligência humana e a artificial.
Fernando Pinto, professor de Sistemas de Informação Gerenciais e doutor em Administração – Coppead/UFRJ.