No dia 1º de junho, foi sancionada a Lei Complementar 182/2021 que instituiu o "Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador". Essa Lei estabelece uma série de medidas de fomento às startups, que envolvem desde a regulação de instrumentos de mercado até a criação de regras para utilização de fundos para estímulo à pesquisa.
Um elemento central da Lei Complementar é a consolidação do entendimento das startups como atores importantes na promoção da inovação do país, na medida em que se identifica nessas empresas emergentes o potencial de criação e desenvolvimento de soluções de ponta, que podem ser aproveitadas tanto pelo mercado como pelo próprio poder público.
Para avançar nesta frente, a Lei criou um formato de contratação, o "Contrato Público para Solução Inovadora" (CPSI), contemplando dois objetivos específicos: (i) o direcionamento do poder de compra do Estado para promover a inovação no setor produtivo; e (ii) o desenvolvimento e teste de soluções inovadoras para demandas práticas da administração, seguido da possibilidade de contratação para fornecimento, caso seja verificado o êxito.
Esses objetivos aproximam-se daqueles perseguidos pela Encomenda Tecnológica, prevista no Novo Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação, detalhado no Decreto 9.283/2018. No entanto, o CPSI diferencia-se da Encomenda ao não exigir que a solução contratada envolva risco tecnológico, o que amplia sua possibilidade de utilização, ao permitir o teste de tecnologias que já estão em estágio mais avançado de desenvolvimento, mas que ainda dependem de avaliações para a implementação em contexto específico.
Para a celebração do CPSI, são adotados critérios de seleção que priorizam o "potencial de resolução do problema", "o grau de desenvolvimento da solução proposta" e a "viabilidade e maturidade do modelo de negócio", que serão avaliados por comissão julgadora formada por pessoas de reputação ilibada e vasto conhecimento, incluindo professor de instituição de ensino superior.
Neste ponto, a Lei traz uma sinalização clara quanto à importância de se adotar parâmetros alternativos a uma avaliação pura e simplesmente do menor preço. Inclusive, após o julgamento, o procedimento prevê negociação para definir o formato de remuneração, que pode combinar preço fixo, reembolso de custos e vinculação a metas.
A previsão desta etapa faz com que o Contrato Público para Solução Inovadora guarde alguma proximidade com a dinâmica do Diálogo Competitivo, previsto na recente Lei de Licitações (Lei 14.133/2021), muito embora este último volte-se à contratação de soluções em estágio mais consolidado, não contemplando a fase de testes, e preveja uma fase mais ampla de negociação entre as participantes.
Em que pese os aspectos que diferem cada procedimento licitatório, há uma convergência para a adoção de mecanismos que permitam a seleção da melhor solução técnica para o problema identificado pela administração pública e de estratégias de estímulo a negociação, proporcionando condições econômicas mais vantajosas ao ente contratante.
Sendo assim, o Marco Legal de Startups preenche uma lacuna importante ao criar estratégia de contratação de inovação direcionada a soluções tecnológicas em estágio intermediário de consolidação, colocando-se como alternativa viável para empresas emergentes cujos produtos não são perfeitamente englobados pelos modelos da Encomenda Tecnológica e do Diálogo Competitivo.
Mariana Chiesa Gouveia Nascimento, advogada da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados e doutora em direito pela Universidade de São Paulo.