Justiça usa Código Penal para combater crime virtual

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Apesar da inexistência de uma legislação específica para crimes eletrônicos, os tribunais brasileiros estão punindo internautas, crakers e hackers que utilizam a internet para a prática de crimes com a aplicação do Código Penal, do Código Civil e de legislações específicas como a Lei n. 9.296, que trata das interceptações de comunicação em sistemas de telefonia, informática e telemática, e a Lei n. 9.609, que dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programas de computador. Levantamento realizado por especialistas em Direito da internet mostra que atualmente existem mais de 17 mil decisões judiciais envolvendo problemas virtuais; em 2002 eram apenas 400.
Grande parte dos magistrados, advogados e consultores jurídicos considera que cerca de 95% dos delitos cometidos eletronicamente já estão tipificados no Código Penal brasileiro por caracterizar crimes comuns praticados por meio da internet. Os outros 5% para os quais faltaria enquadramento jurídico abrangem transgressões que só existem no mundo virtual, como a distribuição de vírus eletrônico, cavalos-de-Tróia e worms.
Para essa maioria, a internet não é um campo novo de atuação, mas apenas um novo caminho para a realização de delitos já praticados no mundo real, bastando apenas que as leis sejam adaptadas para os crimes eletrônicos. Segundo esses especialistas, o Código Penal engloba uma extensa gama de crimes digitais, tais como insultar a honra de alguém (calúnia – artigo138), espalhar boatos eletrônicos sobre pessoas (difamação – artigo 139), insultar pessoas considerando suas características ou utilizar apelidos grosseiros (injúria – artigo 140), ameaçar alguém (ameaça – artigo 147), utilizar dados da conta bancária de outrem para desvio ou saque de dinheiro (furto – artigo 155), comentar, em chats, e-mails e outros, de forma negativa, sobre raças, religiões e etnias (preconceito ou discriminação – artigo 20 da Lei n. 7.716/89), enviar, trocar fotos de crianças nuas (pedofilia – artigo 247 da Lei n. 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA).
No caso das legislações específicas, as mais aplicadas são as seguintes: usar logomarca de empresa sem autorização do titular, no todo ou em parte, ou imitá-la de modo que possa induzir à confusão (crime contra a propriedade industrial – artigo 195 da Lei n. 9.279/96), monitoramento não avisado previamente (interceptação de comunicações de informática – artigo 10 da Lei n. 9.296/96) e usar cópia de software sem licença (crimes contra software "Pirataria" – artigo 12 da Lei n. 9.609/98).
O STJ vem consolidando a aplicação desses dispositivos em diversos julgados. Nos casos de pedofilia, por exemplo, o STJ já firmou o entendimento de que os crimes de pedofilia e divulgação de pornografia infantil por meios eletrônicos estão descritos no artigo 241 da Lei nº 8.069/90 (apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive pela rede mundial de computadores ou internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente), e previstos em convenção internacional da qual o Brasil é signatário.
Mais do que isso, a Corte concluiu que, por si só, o envio de fotos pornográficas pela internet (e-mail) já constitui crime. Com base no artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os ministros da Quinta Turma do STJ cassaram um habeas-corpus concedido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que determinava o trancamento de uma ação penal sob o argumento de que o ECA definiria como crime apenas a "publicação" – e não a mera "divulgação" – de imagens de sexo explícito ou pornográficas de crianças ou adolescentes.
Em outro caso julgado, a Turma manteve a condenação de um publicitário que participou e filmou cenas eróticas envolvendo crianças e adolescentes. Ele foi denunciado pelo Ministério Público de Rondônia com base no artigo 241 do ECA, nos artigos 71 e 29 do Código Penal (crime continuado e em concurso de agentes) e por corrupção de menores (Lei n. 2.252/54: constitui crime, punido com a pena de reclusão de um a quatro anos e multa, corromper ou facilitar a corrupção de pessoa menor de 18 anos, com ela praticando, infração penal ou induzindo-a a praticá-la).
Os casos de furto e estelionato virtual também já foram devidamente enquadrados pela Corte. A Terceira Seção do STJ consolidou o entendimento de que a apropriação de valores de conta-corrente mediante transferência bancária fraudulenta via internet sem o consentimento do correntista configura furto qualificado por fraude, pois, nesse caso, a fraude é utilizada para burlar o sistema de proteção e vigilância do banco sobre os valores mantidos sob sua guarda. Também decidiu que a competência para julgar esse tipo de crime é do juízo do local da consumação do delito de furto, que se dá no local onde o bem é subtraído da vítima, entre muitos outros.

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