O Pix foi (e tem sido) uma grande revolução em meios de pagamento. No Brasil, diferentemente de em outros países, o Banco Central adotou a paternidade desse arranjo de pagamento, e com isso criou condições para a universalização de seu acesso (por exemplo a não cobrança de tarifas das pessoas físicas). A tecnologia por trás do Pix é excepcional, permitindo com que transações ocorram de maneira instantânea 24 x 7.
A utilização de chaves é uma facilidade muito grande, uma vez que se pode usar, como exemplo, apenas o número do celular ou e-mail, sem maiores burocracias. Naturalmente que isso traz grandes desafios de infraestrutura, gestão de recursos e de segurança às instituições financeiras e instituições de pagamento, que são os grandes prestadores de serviços de pagamento dentro desse arranjo.
Aliás, é importante recordar da outra grande revolução nos meios de pagamento no Brasil, que veio por meio da Lei 12.865/13, que foi a que viabilizou a criação das instituições de pagamento. Quando se fala de Pix, temos que nos lembrar delas. São elas que têm provido um grande acesso da população em geral à "bancarização", mesmo não sendo bancos, e que têm grande participação também no Pix. O Pix e as instituições de pagamento, assim como os bancos, andam de mãos dadas.
Em termos de principais benefícios do Pix podemos citar então o custo reduzido (ou zero para pessoas físicas), a agilidade das transações, a disponibilidade ininterrupta, a possibilidade de as pessoas acessarem de maneira muito simples por meio de seus celulares.
Quando se fala em desbancarizados, há recentes exemplos de programas sociais sendo executados via Pix para a população em situação de vulnerabilidade.
Não se fala muito do Pix saque e Pix troco, que já se encontram disponíveis para uso pela população e cuja quantidade de transações e valores transacionados vêm subindo constantemente. Segundo estatísticas do BCB, em setembro de 2024 foram 1,3 milhões de transações, representando R$ 358 milhões, que é respectivamente 3,5 vezes e 6,7 vezes mais que há dois anos. Naturalmente que ainda são números pequenos quando se olha o universo do Pix, com 4,9 bilhões de transações num volume de quase R$ 2 trilhões (setembro de 2024).
Quando falamos em Pix, tudo é superlativo. E aí reside provavelmente a decisão do BCB de coibir, no médio prazo, IPs não autorizadas a oferecerem o Pix. Este é um movimento claramente voltado a um maior controle por parte do BCB sobre esse arranjo de pagamento, que deu muito certo e é um exemplo mundial.
As novas regras e seus desafios
Por maiores que sejam as exigências sobre uma IP não autorizada e participante indireta, em termos de controles e políticas de gestão de riscos, prevenção à lavagem de dinheiro e segurança cibernética, o risco está muito alto. O mesmo se dá com os participantes diretos, que possuem um dever de supervisão sobre os indiretos. Os volumes transacionados se tornaram demasiadamente grandes.
Dessa maneira, o BCB tomou a decisão de limitar a oferta do Pix, após um período transicional, apenas IPs autorizadas. Isso já ocorreu no passado, como sabemos, com as IPs emissoras de moeda eletrônica. Desde março de 2021, todas nova IP que queira oferecer contas de pagamento pré-pagas deve obter autorização prévia para isso, e não mais seguir uma determinada volumetria, a partir da qual a autorização era obrigatória. Muitas IPs emissoras de moeda eletrônica encontram-se ainda numa fase de transição que se estende até 2028.
De acordo com as novas regras, podemos dividir as IPs em três grupos:
As que já são participantes do Pix;
As que se encontram em processo de adesão do Pix;
As que pretendem apresentar pleito de adesão ao Pix até 31/12/24.
Todas elas deverão agora solicitar autorização para funcionamento ao BCB, de acordo com um calendário de datas definidas.
Segundo estatísticas do BCB, base novembro de 2024, há 867 participantes ativos do Pix, dos quais 69 IPs ainda não estavam autorizadas.
No que se refere às IPs em processo de adesão, há 22 para a mesma data-base. Trata-se de um universo importante de 91 instituições que deverão iniciar seu projeto de autorização para funcionamento.
Em resumo, essas IPs acima e mais quelas que apresentarem pleito de adesão ao Pix até 31/12/24 deverão, como condição para participação no Pix, solicitar autorização para funcionamento ao BCB, nos termos das Resoluções BCB ns. 80 e 81, ambas de 25 de março de 2021.
Mas as novas regras não param por aí. As IPs não autorizadas que são participantes indiretas do Pix já devem atualmente seguir rígidas regras que versam sobre suas estruturas de risco operacional e de liquidez, segurança cibernética e prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo. Além disso, elas terão que observar também o seguinte, na fase transicional:
Adequar seus processos de Contabilidade e contratar auditoria externa para atendimento ao Cosif (padrão contábil das instituições autorizadas pelo BCB), que passa por aspectos de elaboração, remessa de documentos contábeis e divulgação de demonstrações financeiras;
Reportas dados de clientes ao Cadastro de Cliente do Sistema Financeiro (CCS);
Obrigatoriedade de envio ao BCB de saldos contábeis diários e informações de operações de crédito.
Uma outra novidade normativa relevante, e que seguramente tem a ver com a solidez e capacidade de realizar os necessários investimentos em segurança, controles e governança, é o capital mínimo, que foi quintuplicado.
Para fins de participação no Pix na modalidade de provedor de conta transacional, as instituições, exceto cooperativas de crédito, deverão, a partir de 1/1/26, observar permanentemente limites mínimos de capital social integralizado e de patrimônio líquido de cinco milhões de reais.
Para as instituições reguladas, estar "no jogo" do Pix já não é bem uma opção. Ou você está, ou você fica fora do mercado, ainda mais com grandes novidades a caminho, como o Pix por aproximação e outras facilidades. O Pix caiu no gosto do brasileiro.
Diante disso, é fundamental que as IPs busquem iniciar seus processos internos para solicitação de autorização o quanto antes. A "virada" de chave das instituições não é apenas técnica, mas também cultural.
O processo de autorização é um projeto bastante relevante, que deve ser capitaneado pela alta administração, e é bipartite: envolve aspectos jurídico-regulatórios mas também econômico-financeiros, que devem ser preparados todos eles com bastante esmero e seriedade, pois passarão pelo crivo do BCB.
Luciano Fantin, sócio da The Sharp Fintech Consultoria.