O assunto da vez em círculos tecnológicos, políticos e sociais – tem sido – por bons motivos – o avanço da inteligência artificial e suas consequências para a humanidade. A maior parte dos envolvidos parece concordar que se trata de uma tecnologia revolucionária, cujos efeitos são ainda incipientes e de difícil projeção. Já se percebe, porém, o surgimento de dois grupos opostos em suas previsões sobre o impacto de IA – de um lado os otimistas apaixonados; e de outro, os profetas do apocalipse.
O ser humano tem em sua essência a capacidade de criar, o que pode resultar em criações com diferentes impactos e objetivos – bons, ruins e neutros, dependendo inclusive de quem faz a avaliação. Foi assim com o fogo, a roda, a prensa de Gutenberg, a energia nuclear, os computadores e a internet, entre tantos outros. Cada um a seu modo, em seu momento, gerou oportunidades, glórias, riscos, dúvidas e (não ou!) desilusões. O fogo nos aquece no frio, nos protege de ataques de animais, mas mata outros seres humanos A roda acelerou o transporte civil mas também o militar. A energia nuclear é positiva por ser limpa, mas também perigosa pelo uso em armas e pelos riscos de vazamento e contaminação. Não há respostas simples para questões complexas.
A Inteligência artificial segue o mesmo caminho, ainda que não seja, propriamente, uma tecnologia nova – afinal, no meio acadêmico, o tema é pesquisado e discutido há algumas dezenas de anos. Em vários momentos, eventos de superação de máquinas sobre seres humanos pareciam anunciar um ponto de inflexão – como na vitória do Deep Blue (IBM) sobre Kasparov em 1997 ou do AlphaGo (Deep Mind, do Google) sobre Lee Sedol em 2016. Mas foi a chegada do ChatGPT (da OpenAI), em novembro de 2022, que soou o alarme para o mundo, demonstrando não apenas uso sistemático de lógica, mas também habilidade conversacional, possibilidade de criação e, para alguns, indicações preliminares de pensamento autônomo.
Estamos no começo, mas a preocupação é evidente. Segundo o levantamento feito em novembro de 2023 pelo US Census Bureau (equivalente ao nosso IBGE), apenas 4,4% das corporações norte-americanas utilizam inteligência artificial em seus bens ou serviços. Muitos acreditam que precisamos aproveitar esse momento inicial para conter e moldar a evolução da IA. No Fórum Mundial de Davos, a disseminação de fake news pela tecnologia foi apontada com a maior preocupação para esse ano de 2024. Outros temem pelo futuro do trabalho e até mesmo pela continuidade da vida humana. Não sou capaz de avaliar quão próximos estamos da emblemática AGI (Inteligência Artificial Geral, em sua sigla em inglês), que potencialmente poderia determinar o destino da nossa espécie, mas reconheço a importância e a premência de discussões domésticas e internacionais sobre regulação dessa nova e poderosa tecnologia.
Pessoalmente, não acredito que a IA deva ou possa ser subjugada. À medida em que a inteligência artificial se desenvolve e ganha tração, desejo e me animo com o esforço consciente de tanta gente em focar o potencial revolucionário dessa nova tecnologia no imenso rol de oportunidades que ela traz para o aperfeiçoamento, já no curto prazo, da qualidade da vida na Terra. Que se busque aplicá-la, de forma ampla e imediata, para solucionar problemas reais, aqui (sim, inclusive no Brasil) e agora. Bons exemplos não faltam!
Desde que surgiu, são muitas as aplicações da IA e várias delas já melhoraram a vida das pessoas. A inteligência artificial já está fazendo o bem pelo mundo de diversas formas. Seja na gestão de alimentos nos supermercados reduzindo o desperdício e a emissão de gases do efeito estufa ou evitando fraudes no sistema previdenciário brasileiro.
Na saúde humana, já há exemplos fascinantes. Por meio de processamento em escala de resultados de exames e outras informações, a NeuralMed otimiza o sequenciamento e as triagens, melhorando a qualidade e a extensão da vida dos pacientes, ao mesmo tempo em que reduz os custos do sistema de saúde. Não por acaso, sua solução já é adotada por planos de saúde, hospitais e fabricantes de medicamentos.
Na engenharia de materiais, o GNoME, também da DeepMind, recentemente anunciou a descoberta de 2,2 milhões de novos cristais, incluindo 380 mil novos elementos com alta probabilidade de serem estáveis. Esses resultados ocorreram em escala e velocidade inimagináveis, totalizando 45 vezes o volume de descobertas destes materiais ao longo de toda história da ciência. Os desdobramentos para novas tecnologias são praticamente infinitos.
Outros bons exemplos e boas oportunidades não faltam. Há muito ainda a se descobrir sobre a Inteligência Artificial e quero acreditar que ela chegou para fazer o mundo melhor, considerando, de forma realista, que seus avanços são inevitáveis.Que ela seja usada de forma consciente e positiva!
Marco Perlman, CEO da Aravita.