Ao contrário da maioria das regiões do globo – principalmente Europa e Estados Unidos –, que tiveram desempenho decepcionante no ano passado, o mercado brasileiro de software e serviços registrou expansão robusta. Enquanto no mundo o crescimento foi de 0,5% em 2010, o Brasil viu o setor crescer 21,3%, movimentando US$ 19,04 bilhões. Deste total, US$ 5,51 bilhões referiram-se à software, o equivalente a 1,8% do mercado mundial, e US$ 13,53 bilhões a serviços relacionados, com 2,2% do mercado global.
Apesar dessa marca expressiva, o país ainda assim está muito aquém do que se vê nos mercados de software mais pujantes. Pesquisa encomendada à IDC pela Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes) mostra que, embora o Brasil ocupe o décimo primeiro lugar do ranking mundial, o modelo adotado pelo setor vai na contramão das economias desenvolvidas. Um sinal claro disso é que hoje 70% do software consumido no país são importados.
Gerson Schmitt, presidente da Abes observa que o modelo atual no Brasil é baseado em serviços, que atende dois terços do mercado total, exige um número maior de profissionais e ainda apresenta uma produtividade econômica 30% menor. "Hoje apenas 30% do software consumido no mercado brasileiro é desenvolvido no país. Além disso, 80% das exportações do setor referem-se a serviços relacionados. Ou seja, estamos exportando mão de obra, homem/hora, em vez de software", acrescenta ele, ao enfatizar que esse êxito da área de serviços vem sendo alcançado graças ao fato de a indústria brasileira cobrar de 30% a 40% a menos pelos serviços em relação ao mercado internacional.
Os números falam por si só. Do total de US$ 1,74 bilhão exportado em software e serviços em 2010, 71% referiram a serviços. "De software mesmo foram somente US$ 110 milhões. Isso significa que estamos exportando mão de obra barata quando o país tem um enorme déficit de profissionais", alerta Schmitt, ao ressaltar que previsão é que em 2013 haverá a falta de 200 mil profissionais na área de software.
O presidente da Abes faz a ressalva que, embora serviços relacionados seja parte indissolúvel do setor de software, o Brasil tem competência para ser de outra forma. "Em nossa avaliação, insistir no crescimento de um perfil de exportação dominado pela venda de serviços representará um colapso setorial e insucesso do atual modelo, com a comoditização do seu mais valioso ativo vendido pelo menor preço possível na unidade homem/hora, abrindo mão da oportunidade de vender soluções replicáveis de alto valor percebido, com inteligência e capacidade de inovação como diferenciais competitivos", comenta Schmitt.
De acordo com ele, para passar a exportar em uma década 40% do que a Índia exporta atualmente em serviços – US$ 50 bilhões ao ano –, significaria multiplicar seis a sete vezes o atual volume de exportações brasileiras de serviços offshore de TI, para alcançar o patamar de US$ 20 bilhões até 2020. Neste caso, diz Schmitt, apenas para atender o segmento de exportação com a atual predominância de serviços, seriam necessários cerca de 400 mil profissionais.
Outro aspecto que deveria ser repensado, na opinião do presidente da Abes, é a prioridade que o governo brasileiro tem dado ao software livre. Pela primeira vez o estudo trouxe uma avaliação sobre a participação do software livre para o resultado total obtido pelo mercado nacional. O resultado é que, após uma década de apoio do governo federal e cerca de US$ 1 bilhão aplicado nesse modelo, a participação do software livre no mercado brasileiro em 2010 foi de apenas 2,95%, o equivalente a US$ 560 milhões. "Se retirarmos a participação do governo, que responde por cerca de 66% dos investimentos em software livre, ele praticamente desaparece do mercado", diz Schmitt. No entendimento dele, o próprio Portal do Software Público Brasileiro não tem cumprido seu papel. "Hoje mais de 50% dos downloads feitos no site são feitos por empresas internacionais, com grande procura por soluções por chineses e indianos."
Para o presidente da Abes, o software livre é importante, mas não pode haver um direcionamento do governo. "Não deve haver defesa nem do software de código aberto nem proprietário. Seria mais vantajoso para o Brasil se o governo fomentasse a proteção da propriedade intelectual e estimulasse o desenvolvimento de tecnologias com padrões competitivos de mercado", salienta Schmitt.
Segundo o estudo da Abes, atualmente o setor é composto por mais de 8,5 mil empresas, das quais 75% dedicam-se ao desenvolvimento, distribuição e comercialização de software. Destas, 94% são micro e pequenas empresas. Em termos de demanda, em 2010 a indústria e o setor financeiro representaram praticamente 45% do mercado consumidor. Em seguida, aparecem os mercados de serviços, comércio, governo e agroindústria. O governo, porém, foi o setor que apresentou o mais aumento nos investimentos, com variação positiva de mais de 27% em relação a 2009.
- Software