A evolução da identidade digital reutilizável e os impactos no mercado financeiro

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A identidade digital reutilizável (IDR) está no centro de uma onda global de inovação, reacendendo o debate sobre o controle de dados e o futuro dos serviços financeiros. Embora o Brasil tenha diversas iniciativas relacionadas à IDR, o uso no dia a dia pela população ainda é incipiente — cenário que começa a mudar com ações como a popularização do conceito de ID Wallet e credenciais verificáveis no site do Governo Federal.

Em diferentes partes do mundo, a IDR já avança em aplicações práticas. Países como Noruega, Islândia e Ucrânia vêm testando seu uso em áreas como emissão de atestados residenciais e diplomas digitais, por meio da iniciativa EU Digital Identity Wallet. Essa solução armazena dados pessoais de forma segura e permite autenticações simplificadas, contando hoje com quatro projetos-piloto de larga escala e a participação de cerca de 350 empresas e autoridades de mais de 26 países.

No Reino Unido, o governo estuda implementar a IDR para agilizar a abertura de contas bancárias, inspirando-se no modelo de identidade digital da Estônia, o e-ID. Implementado em 2002, o e-ID permite que cidadãos e residentes acessem uma ampla gama de serviços públicos e privados de maneira totalmente digital, utilizando um cartão de identidade com chip ou outras formas de autenticação eletrônica — com impacto significativo na eficiência dos serviços financeiros locais.

O Brasil, por sua vez, desponta como um ambiente propício à adoção de novas soluções digitais. Um exemplo claro dessa maturidade é o Pix, sistema de pagamentos instantâneos desenvolvido pelo Banco Central, que, até setembro de 2022, já havia incluído mais de 71 milhões de brasileiros no sistema financeiro. Em outubro de 2024, um novo levantamento mostrou que 90% da população adulta havia utilizado o Pix pelo menos uma vez, evidenciando a confiança em ferramentas digitais.

Nesse contexto, a identidade digital reutilizável começa a dar passos relevantes no país. O projeto coordenado pela Secretaria de Governo Digital, em parceria com o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD), prevê o uso de credenciais verificáveis em carteiras móveis, eliminando a necessidade de logins e senhas tradicionais para acessar serviços públicos. A iniciativa visa oferecer uma experiência mais segura e eficiente para o cidadão.

Além disso, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) defende que o desenvolvimento da IDR no Brasil deve seguir os princípios de Privacy by Design, com a emissão de diretrizes por órgãos públicos para orientar a implementação dessas soluções e assegurar a proteção dos dados pessoais.

Apesar do otimismo em torno da identidade digital reutilizável, a integração de sistemas e a criação de protocolos de interoperabilidade continuam sendo desafios globais que impactam o ritmo de implementação dos projetos. No Brasil, esses obstáculos são acompanhados pela necessidade de investimentos em segurança cibernética, pela falta de padronização entre os sistemas e pela ampliação do acesso à internet em regiões menos conectadas. Outro ponto crítico é a necessidade de integrar a IDR com documentos e registros já existentes, como a CNH e carteiras profissionais, para construir um ecossistema realmente funcional.

Para o mercado financeiro, a IDR representa uma revolução silenciosa, mas com efeitos transformadores. Instituições financeiras poderão adotar identidades verificáveis para aprimorar o onboarding de clientes, tornar processos como a abertura de contas, logins, atualização cadastral, alteração de dados sensíveis e senhas, concessão de crédito e verificação de identidade mais rápidos, seguros e menos custosos. A redução de fraudes, aumento da completude de formulários e da conversão de clientes, o fortalecimento da prevenção à lavagem de dinheiro e a personalização dos serviços bancários são algumas das vantagens que a IDR pode proporcionar ao setor.

Além disso, a IDR permitirá que bancos e fintechs otimizem a experiência do usuário, atendendo a uma demanda crescente por jornadas digitais mais fluidas, sem fricções como múltiplos logins, preenchimento de formulários repetitivos ou provas de autenticidade complexas.

A identidade digital reutilizável, portanto, é mais do que uma tendência: é uma transformação necessária que pode redefinir a relação dos brasileiros com os serviços financeiros. Para que seu potencial seja plenamente extraído, será fundamental a colaboração entre governo, setor privado e sociedade civil, com foco em segurança, interoperabilidade e proteção de dados pessoais. 

Marcelo Queiroz, Head de Estratégias e Novos Negócios da ClearSale.

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