O que acontece quando o maior indexador de informações da história da internet resolve virar gente?
Essa é a provocação que o novo "Modo IA" do Google nos convida a fazer. O que antes era uma interface silenciosa à espera de comandos frios, objetivos ou separados por palavras-chave, agora se transforma em um organismo que responde, conversa, interpreta e até antecipa.
Não estamos apenas diante de uma mudança na forma de buscar. Estamos testemunhando um deslocamento de paradigma: o buscador, que por décadas nos treinou a navegar, agora quer nos escutar. E mais do que isso: quer responder com propriedade, personalidade e contexto.
No centro dessa virada está a ambição do Google de se tornar mais do que um intermediário, ele quer ser o próprio interlocutor. Ao invés de te levar até os links, ele lê, cruza, sintetiza e entrega o que chama de "resposta a nível de especialista". Uma resposta que não apenas substitui a jornada entre sites, mas que reconfigura o próprio sentido de presença digital.
E isso nos leva à pergunta inevitável: se o buscador agora conversa, como as marcas devem responder?
Durante anos, o marketing digital foi construído como monólogo disfarçado de diálogo. Falamos em "engajamento", mas medimos cliques. Falamos em "conexão", mas repetimos campanhas. Agora, quando o próprio motor da internet passa a funcionar em modo conversacional, não dá mais para sustentar essa performance unilateral.
O marketing que se sustenta nesse novo ecossistema não pode mais ser feito para agradar algoritmos, ele precisa aprender a dialogar com eles.
Se o Modo IA do Google escolhe suas fontes com base na clareza, profundidade e relevância, então não basta mais apenas estar na primeira página. É preciso fazer sentido. Sentido para humanos e para sistemas. Sentido para quem pergunta e para quem responde. Sentido para os agentes (porque sim, agora o jogo é entre agentes).
É nessa transição que o conceito de interoperabilidade entre inteligências ganha corpo. Quando o consumidor faz uma pergunta complexa ao Google, quem responde não é só o motor de busca. São os sistemas que alimentam o motor. São os sites, produtos, plataformas e marcas que souberam estruturar suas informações de forma legível para IAs. É uma nova forma de presença: não mais apenas visual, mas cognitiva.
Marcas que não compreendem esse novo pacto digital correm o risco de virar ruído. De serem citadas, mas não escutadas. De aparecerem como nota de rodapé em um mundo onde o conteúdo principal já vem pré-digerido pela máquina.
Esse futuro já está em beta. Ele responde perguntas com múltiplas variáveis, organiza conteúdos em tabelas, adapta formatos conforme o contexto, e ainda exibe anúncios com lógica de personalização. Não é difícil imaginar um passo adiante, no qual agentes de marcas e plataformas conversam diretamente, negociando espaço, otimizando experiências e antecipando comportamentos.
O marketing que virá não será mais feito apenas de campanhas, mas de conexões em tempo real, sustentadas por linguagem, memória e intenção. O próximo desafio das marcas não é serem vistas, mas serem compreendidas por agentes que operam com base em sentido, e não só em dados.
E mais: esses agentes não esperam passivamente por comandos. Eles observam, cruzam contextos e tomam iniciativas. São capazes de prever necessidades, sugerir soluções antes que o usuário perceba o problema, e agir em razão dele com base em padrões e preferências. Trata-se de uma virada radical no papel da interface, que deixa de ser uma ponte entre humano e sistema para se tornar protagonista na tomada de decisão. Nesse cenário, as marcas precisam aprender a conversar com quem decide por elas.
Se cada rede social, app e plataforma passar a ser regida por um agente, e se esses agentes conversarem entre si, então o marketing do futuro será um jogo entre inteligências. E nesse jogo, vence quem sabe dialogar.
Samir Ramos, co-founder e co-CEO smarters.