Publicado primeiro na Teletine – A Starlink chegou ao Brasil em maio do ano passado e, de lá para cá, já reúne 67 mil clientes por aqui – sendo 21 mil apenas na Região Norte, segundo a Anatel. A tecnologia tem conectado clientes residenciais, escolas, agências bancárias e chamado a atenção pela velocidade de crescimento, mesmo sem contar com uma estrutura local de vendas e suporte.
Apesar de já reunir uma comunidade fiel de fãs nas redes sociais, a companhia de Elon Musk também começa a acumular reclamações, principalmente por ainda não ter representação oficial no País – mesmo tendo autorização para atuar no Brasil desde janeiro de 2022.
TELETIME conversou com usuários da empresa no País para descobrir como o cliente final da Starlink está avaliando o serviço e se este entrega tudo o que promete ser. Além disso, analisamos as reclamações contra a empresa na Internet. Confira nas linhas a seguir.
Usuários
O engenheiro de telecomunicações André Bonomi é um bom exemplo de pessoa física que contratou o serviço. Assinou a Starlink pensando justamente na velocidade que teria ao instalá-la na fazenda da família em Cabeceira de Goiás (GO). Antes, a Internet contratada por lá (também via satélite), além de ter franquia de dados, só alcançava "1 ou 2 megas no melhor dos cenários". Hoje, com a Starlink, ele disse que observa até 200 Mbps de download. "Agora consigo, por exemplo, colocar sistema de monitoramento por câmera IP, que antes era inviável colocar por cima do serviço que eu tinha", contou Bonomi.
O produtor rural Pedro Guimarães também é outro exemplo de cliente satisfeito com a conectividade. A Starlink foi instalada em sua fazenda localizada próximo à Fercal, região administrativa de Brasília que faz divisa com o estado de Goiás. "Tendo um usuário ou dez, ela não perde estabilidade. Conecto com televisão pra usar Netflix e não atrapalha os outros que estão na Internet. É uma solução bem à frente do que a gente tinha antes", informou Guimarães ao TELETIME.
O publicitário Túlio Pires Bragança escolheu a Starlink para seu sítio em Córrego do Bom Jesus (MG). Antes, ele usava um serviço de Internet via rádio que lhe dava 1 Mbps de download – valor que não permitia a ele uma rotina de home office. Com a nova antena, ele observou até 200 Mbps de velocidade e ainda disse que não viu piora da qualidade do sinal mesmo durante chuvas fortes.Reclamações
A experiência dos usuários brasileiros, contudo, não é unanimidade. TELETIME monitorou as queixas de usuários contra a Starlink no Reclame Aqui, site que reúne reclamações de clientes contra empresas. O período observado foi dos últimos seis meses. Na plataforma, a empresa é classificada como "não recomendada", já que nunca respondeu qualquer reclamação. Isso se deve ao fato de que a marca não conta com representação oficial no País.
Aliás, "mau atendimento do SAC" lidera a lista de queixas. Foram pelo menos 54 clientes que reclamaram disso nos últimos seis meses. Um comentário comum observado foi o não retorno da Starlink pelos canais oficiais informados (que são estrangeiros). Isso nos leva ao segundo item com mais reclamações: a "cobrança indevida".
Muitos consumidores se surpreenderam ao serem debitados por uma mensalidade Starlink maior do que o valor informado no site. Atualmente, o plano padrão (standard) é anunciado por R$ 184 ao mês. Mas esse preço não inclui impostos e tributações exigidas pela legislação brasileira. Tendo como base a média de incidência dos impostos padrões (como ICMS, COF e PIS), o acréscimo seria de aproximadamente R$ 54.
Na prática, clientes da empresa estão desembolsando cerca de R$ 235 por mês – o que é visto por muitos como resultado de falta de clareza com as informações divulgadas. Além disso, o equipamento que o usuário deve comprar custa a partir de R$ 2 mil e não pode ser parcelado.
Apesar de ter relatado facilidade para adquirir o serviço, André Bonomi disse ao TELETIME que não achou o contrato da Starlink claro e sentiu dificuldade para encontrar algumas informações. "O que me deixa receoso é, de uma hora pra outra, eles mudarem as condições comerciais e colocarem um preço exorbitante. Porque aí você compra um equipamento muito caro que não serve para nada, a não ser navegar pela Starlink. Se subirem muito o valor, fica inviável. E eu não duvido que isso possa acontecer", contou.
Rápida, mas suscetível ao aumento de usuários
Atualmente, a Starlink dispõe de uma constelação com mais de 4,4 mil satélites em baixa órbita. Cada um deles fica numa altitude aproximada de 560 km, a partir do nível do mar. A quantidade de satélites e a proximidade com a Terra são elementos essenciais para entender o porquê da empresa conseguir entregar velocidade alta se comparada às rivais via satélite que utilizam soluções geoestacionárias. A rede de Elon Musk permite taxas de download que podem beirar os 200 Mbps, sendo que um levantamento de 2022 apontava velocidade média de 128,38 Mbps para a oferta e latência de 38 milissegundos (ms).
Hoje, nenhuma outra operadora de Internet via satélite no Brasil consegue entregar serviço semelhante ao da Starlink considerando a combinação de preço, velocidade e franquia. A tendência, contudo, é de que com o aumento de usuários no País, a Internet ofertada pela Starlink passa a enfrentar gargalos. Esse fenômeno já ocorreu em alguns mercados do globo, e alguns casos no Brasil. No ano passado, um relatório do Speedtest Intelligence mostrou quedas de velocidade entre 9% e 54% em países como Canadá, França, Nova Zelândia e Estados Unidos – e essa redução estava diretamente ligada ao salto no número de adesões ao serviço. Na região Amazônica há alguns polígonos de indisponibilidade do serviço.
Qualidade dos equipamentos
De acordo com a Starlink, a antena da empresa foi projetada e testada para lidar com uma série de condições desafiadoras, como neve, granizo, calor extremo e chuva forte. O manual do produto até ironiza, informando que não há resistência a "meteoros, dinossauros, ou outras forças extremas da natureza".
No Reclame Aqui, contudo, alguns usuários relataram problemas com os equipamentos. Dois clientes da Starlink ouvidos por TELETIME também observaram isso. Bonomi, por exemplo, enfrentou dificuldade para conectar o cabo à antena. "Não encaixava de jeito nenhum. Pesquisei na Internet e vi que um americano teve o mesmo problema e falou um truque de colocar um pedacinho de papel no conector. Eu fiz e deu certo, mas isso mostra que é um problema de design do projeto mesmo", contou.
O equipamento de Bragança também apresentou defeito. Ele descobriu ao acessar o aplicativo e notar um alerta de que os motores responsáveis por direcionar o prato da antena aos satélites não estavam funcionando corretamente. Mas ele informou que, ao entrar em contato com o suporte da empresa, se prontificaram a mandar uma antena nova. "Eu não diria que é um produto muito robusto não. Eu tenho medo [de quebrar], mas eu também não diria que é completamente frágil. Está no meio termo", disse o publicitário.
Falta de assistência no país
"Eu fiquei relativamente tranquilo porque eu vi que no site eles vendem as partes separadas. Então eu confiei na qualidade de um produto de uma empresa renomada", contou Bonomi, que não deixou de comprar a Starlink pela falta de assistência técnica oficial no Brasil. Ainda assim, essa ausência é motivo de insegurança para outros usuários.
"Hoje eu não considero um problema porque ainda está nova. Mas se tivesse, por exemplo, uma salinha aqui em Brasília, já ficaria muito melhor para os usuários", concordou Pedro Guimarães, em conversa com o TELETIME.
"Me preocupa um pouco, mas é assim… ruim com eles, pior sem eles", contou Bragança, cujo equipamento apresentou defeito, apesar do sinal não ter sido interrompido. "Imagina se minha antena tivesse parado de funcionar, eu ia ficar meses esperando. Isso aí pode melhorar muito", afirmou o publicitário – que comprou a antena em novembro do ano passado e só a recebeu em fevereiro deste ano. Atualmente, a empresa informa que a estimativa para os prazos de envio é de uma a duas semanas.
Adquirir a Starlink é um processo relativamente simples por meio do site da companhia. Basta informar o endereço e os dados do cartão de crédito. Todos os usuários ouvidos pelo TELETIME também elogiaram o aplicativo da Starlink. É através dele que se faz o processo de instalação e configuração da antena. O app também disponibiliza informações como obstruções, quantidade de dispositivos conectados, velocidade do sinal e um relatório com dados sobre o tempo em que a Internet ficou indisponível.Concorrência futura
Existem algumas iniciativas que prometem concorrer com a Starlink em um futuro próximo, mas a empresa ainda está sozinha no mercado residencial com uma constelação de órbita baixa. Possíveis concorrentes são Kuiper, da Amazon, que recebeu investimentos pesados para lançar 3.236 satélites ao espaço, e que deve iniciar pilotos de teste já no ano que vem.
Ao mesmo tempo em que cresce em popularidade, o valor do serviço da Starlink tem diminuido: em fevereiro de 2022 era anunciado a quase R$ 12 mil no primeiro ano de contrato, incluindo impostos, custo dos equipamentos e taxa de serviço (que era aproximadamente R$ 700 por mês no plano básico). Hoje, a mensalidade custa em torno de R$ 230, mais os R$ 2 mil cobrados pelo equipamento.Evento
TELETIME realiza, em parceria com a Glasberg Comunicações, o Congresso Latinoamericano de Satélites, no Rio de Janeiro, entre os dias 26 e 28 de setembro. Um dos temas do evento é justamente o impacto das constelações LEO no mercado de serviços ao consumidor (B2C) e no segmento empresarial (B2B). Entre as empresas confirmadas no Debate estão Viasar, HughesNet (as duas operadoras que participam hoje do mercado B2C de banda larga via satélite, e a Amazon Kuiper, que pretende lançar o serviço a partir do próximo ano. Mais informações sobre o evento pelo site www.satelitesbrasil.com.br