A sexta edição do Anuário de Competitividade Digital do IMD, que conta com a parceria do Núcleo de Inovação e Empreendedorismo da Fundação Dom Cabral (FDC), analisa a capacidade de 63 economias mundiais em explorar novas tecnologias digitais, que marcaram o século e redefiniram a estrutura das organizações. Nesse sentido, a análise da Competitividade Digital compreende as condições que os países criam para se adaptarem a esse novo contexto.
O Brasil perdeu uma posição e está em 52º, com piora no fator Prontidão para o futuro e estabilidade nos fatores Conhecimento e Tecnologia. O total de gastos públicos em educação (7º), Produtividade em P&D por publicação (8º) e investimento em telecomunicações (12º) são destaques positivos, enquanto a Experiência internacional da força de trabalho (62º) e transferência de conhecimento (61º) estão entre os piores resultados do País. A percepção dos executivos sobre a Agilidade Empresarial foi um dos fatores determinantes para a piora da colocação geral. O ranking de competitividade digital reforça a importância de um maior envolvimento da esfera pública e privada na agenda de construção de uma nação digital.
Desempenho Geral do Brasil no Anuário de Competitividade Digital 2022
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Tabela 1: Classificação geral do Índice de Competitividade Digital Mundial 2022
Fonte: IMD World Digital Competitiveness Ranking 2022
A Dinamarca lidera a atual edição do ranking, ultrapassando os Estados Unidos (2º). Suécia (3º), Singapura (4º) e Suíça (5º) seguem a sequência dos países líderes na agenda da competitividade digital. América do Norte, Europa e Ásia marcam forte presença no topo. Apesar da queda na média da performance dos países do Leste Asiático, revertendo a tendência de alta, a região e a América do Norte se consolidam como principais centros de inovação digital do mundo, enquanto a Europa Ocidental perde espaço. O destaque positivo foi conferido à Croácia (43º), avançando doze posições, enquanto Hong Kong (9º) teve a maior queda, com perda de sete, apesar de ainda continuar entre as 10 primeiras colocações.
O Chile (41º) se mantém como o país latino-americano com o melhor resultado, seguido pelo Brasil (52º), México (55º), Peru (57º), Argentina (59º), Colômbia (60º) e Venezuela (63º). Entre os Brics, a China (17º) segue na liderança, apesar de recuar de seu melhor resultado, apresentado em 2021, com piora no fator Conhecimento. Índia (44º), Brasil (52º) e África do Sul (58º) completam a lista.
Em razão do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, ambas estão excluídas dessa edição, pois os dados coletados podem não ser suficientemente robustos para a pesquisa. O estudo ganhou mais um país em sua lista, o Bahrain, que estreou em 32º.
Ranking da 6ª edição do Anuário de Competitividade Digital do IMD — (2022)
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Tabela 2: Ranking WYC 2022
* O número de economias analisadas passou de 64, em 2021, para 63 em 2022
A metodologia do estudo
A avaliação da competitividade digital tem como base 3 fatores:
- Conhecimento — infraestrutura intangível necessária para a aprendizagem e descoberta de novas tecnologias;
- Tecnologia — as condições gerais que possibilitam o desenvolvimento de tecnologias digitais;
- Prontidão para o futuro — o nível de preparo para explorar transformações digitais.
Para a elaboração do relatório, são realizadas pesquisas de opinião junto à comunidade empresarial nos meses de janeiro a maio e dados estatísticos são coletados anualmente em parceria com organizações nacionais e internacionais. A pesquisa qualitativa possui um peso de 1/3 na pontuação do ranking, enquanto os dados estatísticos representam um peso de 2/3 na classificação geral.
Segurança Cibernética e 5G são apostas para avanços
Cibersegurança ou Segurança Cibernética é a proteção das informações de um sistema eletrônico contra ataques cibernéticos. Em 2020, o Brasil sofreu mais de 88,5 bilhões de tentativas e ameaças desse porte, um aumento de 950% em relação a 2020, segundo levantamento da empresa de segurança cibernética Fortinet[1], que analisa e coleta dados diários desses incidentes no mundo. Na América Latina e Caribe, o total é de 289 bilhões. No subfator de Segurança digital, o Brasil perdeu uma posição e agora está em 59º.
O Ranking aponta que países do leste europeu, Ásia central e América do Sul são os que menos demonstram capacidade de segurança cibernética, enquanto Leste Asiático, América do Norte, África e Ásia Ocidental se encontram mais preparados ou menos expostos. Nesta edição, o estudo inseriu dois novos indicadores que permitem uma melhor análise do tema nas 63 economias, são eles: Capacidade de segurança cibernética do governo e Leis de privacidade.
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor há dois anos, estabelece diretrizes fundamentais para a coleta, processamento e armazenamento de dados pessoais. A legislação foi inspirada na General Data Protection Regulation (GDPR) da União Europeia e é um importante passo para garantir a proteção de dados de todos os brasileiros.
Para além da responsabilidade do governo, salienta-se o papel das empresas no fortalecimento de suas práticas de proteção de dados e na adequação às novas legislações vigentes. Um levantamento intitulado "Maturidade da Indústria — LGPD e Incidentes Cibernéticos"[2] realizado pela Fiesp e Ciesp revela que 36% dos ciberataques contra indústrias obtêm sucesso e 53,3% delas não possuem plano de resposta a esses casos.
Para especialistas do Centro de Mundial de Competitividade do IMD, as esferas pública e privada precisam unir esforços, investindo em talento, treinamento e educação, concentração científica e P&D, a fim de zelarem pela proteção da infraestrutura digital de ataques cibernéticos. A habilidade de empresas e governos de se protegerem dessas ameaças deve ser reforçada com uma estrutura regulatória que incentive a criação de mecanismos de proteção de dados.
Os países com maiores pontuações no subfator Governo digital e baixos resultados nos novos subfatores supracitados são mais expostos a ataques cibernéticos. Nesse contexto, a 47ª colocação em Governo Digital e 59ª em Segurança Digital são resultados preocupantes, apesar da boa performance brasileira nos dois novos indicadores: Capacidade de segurança cibernética do governo (25º) e Proteção de privacidade pela lei (29º). Catar, Arábia Saudita e Finlândia são os benchmarks em Segurança Digital. Entre os novos indicadores, Israel e Estônia lideram na capacidade do governo em mitigar ameaças de ataques cibernéticos, enquanto Portugal e Letônia ocupam as primeiras posições na proteção legal de dados do usuário.
5G
Para além da proteção da infraestrutura digital, sua evolução também exige investimento e preparo. Entre as novas tecnologias que prometem provocar grandes mudanças e ampliar a possibilidade do uso de novas ferramentas, está o 5G, uma nova geração da internet móvel que já é realidade nas principais cidades brasileiras. A alta velocidade de conexão, baixo tempo de resposta e estabilidade permitirão não apenas downloads de arquivos mais rápidos, como emprego também em tecnologias como a telemedicina, veículos não tripulados e melhorias da mobilidade urbana.
A Coreia do Sul, líder em tecnologia da informação e comunicação, foi o primeiro país a implementar a tecnologia de forma comercial. No Brasil, a previsão é que todas as capitais tenham acesso até o dia 27 de novembro de 2022 e que alcance todas as cidades com população acima de 30 mil habitantes até 2029, de acordo com o cronograma oficial da Anatel. Entre os melhores resultados do Brasil no estudo está o Investimento em telecomunicações (12º), o que demonstra uma boa coordenação entre empresas privadas do setor e agências reguladoras do governo, além do grande tamanho de mercado brasileiro.
A adoção do 5G no Brasil será crucial para melhoria nos indicadores de velocidade de banda larga (44º), tecnologia das comunicações (58º), e Management of Cities (60º). Em relação à velocidade de download da internet banda larga, o Brasil apresenta uma média de 59,6 Mbps, enquanto a média entre as 63 economias é de 96,6 Mbps.
A performance do Brasil no Relatório de Competitividade Digital 2022
O desempenho geral do Brasil configurou ao País a 52ª colocação. Entre os fatores, houve estabilidade em Conhecimento (51º) e Tecnologia (55º) e queda em Prontidão Futura (2021: 45º para 2022: 47º).
Conhecimento
Os três subfatores que compõem o fator Conhecimento são: Talento, Treinamento e Educação e Concentração Científica.
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Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2022 (nota de 0 a 10)
O País continua sendo um dos lanternas no subfator Talento (62º). Apesar de ter um dos maiores gastos em educação (7º), a qualidade dessa, avaliada por meio de programas internacionais de avaliação de estudantes, ainda se mantém muito abaixo da média dos países presentes no estudo. A baixa percepção do empresariado de que há estratégias de gestão das cidades que apoiem o desenvolvimento de negócios e a baixa atratividade de capital humano qualificado são pontos negativos na análise. No que tange à ausência de habilidades digitais e tecnológicas na educação básica, é possível compreender o resultado brasileiro ao analisar os dados do Censo Escolar 2020[3], em que 25% das escolas públicas relatam não ter acesso à internet. Entre as escolas que possuem acesso, 70% afirma que a baixa velocidade da conexão impossibilita o uso adequado da rede.
No Anuário de Competitividade Global do IMD[4], divulgado em junho de 2022, o Brasil se encontrava em 51º no indicador de Fuga de Cérebros. O País não apenas possui dificuldades em reter talentos, como também em atrair, traduzido pelo resultado em Pessoal estrangeiro altamente qualificado (60º).
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Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2021 (Nota de 1 a 10)
A variação positiva em Treinamento e Educação (de 58º em 2021 para 51º em 2022) foi o suficiente para tirar o Brasil dos 10 últimos colocados, apesar de ainda estar distante do ideal. O aumento da Proporção aluno-professor no ensino superior (44º) e os gastos totais em educação (5º) foram os destaques positivos. Isso, aliado à estagnação dos demais indicadores, possibilitou a variação de sete colocações no subfator.
A percepção do empresariado de que o treinamento de empregados é uma prioridade nas empresas (45º) foi o único indicador que sofreu uma variação negativa. A avaliação reforça a importância do papel das empresas em colaborar com a capacitação da força de trabalho.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2022 (Nota de 1 a 10)
O subfator Concentração Científica (25º) sofreu queda de quatro posições. Apesar disso, continua sendo o melhor resultado do Brasil. Segundo o Relatório do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), o País é o 13º maior produtor de conhecimento científico do mundo entre os anos 2015-2020.
Embora o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) tenha sido reduzido em 50% no período de 2014-2018, dados do Relatório de Ciências da Unesco de 2021[5] evidenciam um contínuo crescimento da produção científica. Contudo, especialistas alertam para um limite dessa resiliência.
Tecnologia
No fator Tecnologia, são apresentados os seguintes subfatores: Ambiente Regulatório, Capital e Tecnologia.
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*Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2021 (nota de 1 a 10)
No âmbito burocrático, o País permanece com um resultado insatisfatório no que tange à Legislação para abertura de um negócio (57º), apesar de subir uma posição. Uma das medidas observadas que visam solucionar esse impasse é a Lei Complementar 182/2021, conhecida como o Marco Legal das Startups. O objetivo do regulamento é modernizar o ambiente de negócios nacional para empreendimentos inovadores por meio da facilitação do registro de marcas e patentes e lançamento de produtos; segurança jurídica para o investidor-anjo e redução de processos burocráticos.
A concessão da implementação do 5G, quinta geração de internet, foi realizada em um leilão pela Agência Nacional de Telecomunicações e entidades do poder executivo. Os contratos formalizados incluem exigências que deverão ser cumpridas pelas empresas vencedoras. Nesse contexto, a legislação que rege os acordos entre as companhias e as agências governamentais, se executados conforme previsto, irão potencializar a dispersão da tecnologia 5G no País e favorecerem o desenvolvimento tecnológico brasileiro.
A variação positiva em Legislação para imigração de profissionais (de 36º em 2021 para 26º em 2022) representa a melhora na percepção dos executivos sobre o tema. A queda de nove posições em Direito de propriedade intelectual também é fruto da avaliação dos executivos.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2021 (nota de 1 a 10)
A chegada da tecnologia 5G e a necessidade de eliminar o "abismo digital" são um dos fatores que tendem a impulsionar o investimento em telecomunicações. Nesse sentido, o Brasil apresentou um grande salto no indicador Investimento em telecomunicações (de 21º em 2021 para 12º em 2022). Um levantamento realizado pela SmC+ Digital Public Affairs[8] projeta um investimento de R?25,3 bilhões no segmento até 2030 para implantação de infraestrutura. Além disso, a capitalização do setor de tecnologias da informação e comunicação (45º) e a avaliação de crédito do País (56º) apresentaram ligeira melhora e impulsionaram a variação positiva de duas colocações do subfator Capital. Contudo, a percepção do empresariado sobre a disponibilidade de Capital de Risco apresentou uma deterioração se comparado com demais países. Esse dado é preocupante para economias que querem se tornar cada vez mais digitais, pois inviabiliza a escalabilidade de novos negócios que poderiam trazer inovações ao mercado.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2022 (nota de 1 a 10)
Embora o Brasil tenha se mantido estável no subfator Contexto Tecnológico (51º), a forte queda nas exportações high-tech (de 29º em 2021 para 38º em 2022) é altamente preocupante não apenas para a balança comercial brasileira, mas para a estrutura produtiva do País. A perda de competitividade na produção desses manufaturados é um retrocesso no nível de complexidade econômica de um país.
A produção de manufaturados, além de gerar mais empregos e ter as maiores médias salariais em comparação com demais setores, é responsável por grande parte do investimento em P&D e se torna fundamental para a consolidação de competências em produtos com maior valor agregado. Dessa forma, a agenda digital de uma nação perpassa por uma política de incentivo ao setor industrial.
Ademais, a velocidade média da internet é um indicador que definitivamente será fortemente impactado pela adoção do 5G no País e no mundo, tendo em vista que essa tecnologia promete ser 100 vezes mais rápida (em condições laboratoriais). Para além do ganho de velocidade, será possível analisar nos próximos anos se a tecnologia também possibilitará a diminuição do "abismo digital", ampliando o acesso à internet, principalmente entre as populações mais carentes. Nesse sentido, observa-se uma melhora no indicador Usuários de internet (de 53º em 2021 para 49º em 2022; 724 e 760 usuários por 1000 habitantes, respectivamente).
Prontidão para o futuro
Em relação ao nível de preparo da economia brasileira para adoção das inovações digitais, o relatório analisa: atitudes adaptativas; a agilidade dos negócios e a integração das tecnologias da informação.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2022 (nota de 1 a 10)
Os indicadores acima buscam capturar até que ponto os indivíduos e as firmas em uma economia se ajustam às inovações. O componente Atitudes em relação à globalização (53º) foi o de maior variação negativa para o subfator Agilidade empresarial, recuando 11 posições em comparação com os dados de 2021. Esse componente é obtido por meio da pesquisa de opinião executiva. A globalização pode prejudicar empresas nacionais que não conseguem se adaptar para a competição internacional. Contudo, medidas protecionistas ameaçam a melhora constante da produtividade e práticas de inovação de empresas nacionais, além de inviabilizar o acesso às tecnologias digitais de ponta.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2022 (nota de 1 a 10)
O subfator Agilidade Empresarial mede a capacidade das empresas em responderem de forma rápida e eficaz às ameaças emergentes e aproveitar as novas oportunidades de mercado. A percepção do empresariado de que as empresas possuem essa capacidade piorou em relação ao último ano, com uma queda de 6 colocações se enquadrando em 50º. Neste subfator, todos os indicadores apresentaram variações negativas. Por conseguinte, o subfator também variou negativamente de 42º em 2021 para 52º em 2022.
A 60º posição sobre a percepção do uso de big data na tomada de decisão das firmas é um empecilho ao desenvolvimento de uma nação que busca incorporar as tecnologias de maneira eficiente e condizente com uma agenda digital. Para isso, as empresas devem treinar seus funcionários, introduzir ferramentas digitais e incorporar o uso dessas na rotina e cultura da empresa a fim de se tornar mais competitiva a partir de decisões mais assertivas.
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* Pesquisa de opinião realizada entre os meses de fevereiro e maio de 2021 (nota de 1 a 10)
A adoção da tecnologia da informação na esfera pública e privada é observada no subfator Integração de TI (43º), que obteve uma melhora de 6 posições. Nesse ano, foram inseridos os indicadores Capacidade de segurança cibernética do governo (25º) e Leis de privacidade (29º). O País se manteve na 47º em Governo Digital.
Apesar disso, espera-se que iniciativas como a elaboração da Estratégia de Governo Digital (EGD), documento atualizado a cada três anos com metas para transformação digital da administração pública federal, aproximem o País de um cenário de destaque no tópico frente às demais economias do mundo. Entre os objetivos da EGD estão a transformação de 100% dos serviços públicos digitalizáveis até 2022, oferecer meio de avaliação de satisfação padronizado para no mínimo 50% dos serviços públicos digitais, consolidação do portal único gov.br, entre diversas outras iniciativas.
Contudo, à medida em que se amplia o governo e demais infraestruturas no meio digital, é necessária uma estratégia de segurança e uma legislação que incentive a proteção de dados. Dessa forma, o País não estará tão suscetível às bilhões de tentativas de ataques cibernéticos que ocorrem anualmente e, assim, os dados dos indivíduos e firmas estarão protegidos.