A batalha entre ChatGPT e DeepSeek: Segurança digital, proteção de dados, impacto de mercado e performance

0

A inteligência artificial (IA) se tornou o novo campo de disputa tecnológica e geopolítica entre Estados Unidos e China. No centro dessa guerra, dois gigantes se destacam: ChatGPT, da americana OpenAI, e DeepSeek, desenvolvido na China. O avanço da IA não é apenas uma questão de inovação, mas envolve segurança digital, proteção de dados, regulação, impacto econômico e eficiência computacional.

Com a chegada do DeepSeek, o mercado global de IA foi sacudido. Empresas ocidentais que antes dominavam o setor viram suas ações despencarem, enquanto reguladores passaram a examinar com mais atenção o impacto desses modelos no uso de dados pessoais. A grande pergunta agora não é apenas qual IA é melhor, mas quem conseguirá dominar esse setor estrategicamente vital.

A privacidade e a segurança dos dados são fatores críticos nessa disputa. Governos e empresas precisam garantir que os modelos de IA protejam informações sensíveis e respeitem regulamentações internacionais. Nesse sentido, ChatGPT e DeepSeek apresentam abordagens muito diferentes. A OpenAI, empresa por trás do ChatGPT, segue as principais leis de privacidade ocidentais, como o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia e a Lei de Privacidade da Califórnia (CCPA). Isso significa que os usuários têm maior transparência sobre como seus dados são coletados, armazenados e utilizados. Além disso, empresas e governos que utilizam o ChatGPT têm garantias de que seus dados não serão acessados sem consentimento.

Já o DeepSeek enfrenta desafios regulatórios significativos. Os dados dos usuários são armazenados na China, um país cuja legislação permite o acesso governamental a informações privadas sem necessidade de transparência ou consentimento. Essa característica gera desconfiança internacional e já resultou em investigações formais por parte da Autoridade Italiana de Proteção de Dados (GPDP), que suspeita que a DeepSeek viole o GDPR. Caso a IA chinesa não consiga provar que segue as normas europeias, poderá ser proibida de operar na Europa, um golpe severo para sua expansão global.

A própria política de privacidade do DeepSeek levanta questões preocupantes. Embora mencione que os usuários possam exercer "certos direitos" sobre seus dados, o próprio documento admite que o exercício desses direitos pode limitar funcionalidades da IA. Isso sugere que os dados coletados desempenham um papel central no funcionamento da plataforma, tornando mais difícil garantir anonimização e segurança completa. Além disso, a infraestrutura do DeepSeek já sofreu ataques cibernéticos e instabilidades, o que reforça dúvidas sobre sua capacidade de manter um ambiente seguro em larga escala. Enquanto a OpenAI conta com apoio e integração com empresas como a Microsoft, a DeepSeek ainda precisa consolidar sua resiliência contra ameaças digitais.

O impacto no mercado global foi imediato. A chegada do DeepSeek abalou não apenas o setor de tecnologia, mas também o mercado financeiro global. Sua estreia provocou uma queda drástica nas ações das principais big techs americanas, especialmente da Nvidia, cuja capitalização de mercado perdeu US$ 600 bilhões em valor. Isso representa a maior perda da história do mercado de ações dos EUA em um único dia. O motivo dessa reação drástica é o temor de que a China esteja se tornando competitiva na IA mais rápido do que o esperado. Se antes as empresas americanas dominavam o setor com folga, o DeepSeek demonstrou que a China pode inovar e competir em alto nível, mesmo com restrições tecnológicas impostas pelos EUA.

A resposta americana foi rápida. Sam Altman, CEO da OpenAI, e Larry Ellison, da Oracle, anunciaram um investimento de até US$ 500 bilhões em infraestrutura de IA nos Estados Unidos, visando garantir a liderança ocidental no setor. Esse movimento demonstra a importância geopolítica da IA, que passou a ser tratada como um recurso estratégico essencial. O DeepSeek também superou desafios impostos por sanções comerciais. Desde 2022, os EUA proibiram a venda de chips avançados para a China, dificultando o treinamento de IAs complexas. Mesmo assim, a DeepSeek conseguiu desenvolver seu modelo com um número significativamente menor de chips, provando eficiência computacional e inovação na otimização de hardware.

As diferenças entre os modelos se tornam mais evidentes ao analisarmos a performance. O ChatGPT é mais criativo e personalizável, sendo ideal para tarefas que exigem geração de ideias, escrita e interação humanizada. Sua capacidade multimodal (texto, áudio, imagens e vídeos) o torna uma ferramenta versátil para diversas aplicações. Já o DeepSeek é mais preciso e menos propenso a alucinações. Seu foco está na eficiência matemática, processamento de código e respostas factuais, tornando-o um concorrente de peso para aplicações técnicas e científicas.

Outro diferencial do DeepSeek é sua capacidade de entregar alto desempenho com menor consumo de recursos. Enquanto o ChatGPT precisou de cerca de 16 mil GPUs avançadas para treinar seus modelos, o DeepSeek conseguiu resultados comparáveis com apenas 2 mil GPUs de ponta e milhares de chips menos avançados. Essa abordagem reduz custos operacionais e facilita a adoção por empresas que não possuem grandes infraestruturas computacionais. Nos testes de benchmark, o DeepSeek superou o ChatGPT na resolução de problemas matemáticos complexos, alcançando 97,3% de acertos, contra 96,4% do modelo da OpenAI. No entanto, sua falta de suporte multimodal e limitações em personalização o tornam menos versátil para aplicações interativas.

O embate entre os dois gigantes não se restringe à tecnologia. Trata-se de uma batalha por controle de dados, influência geopolítica e domínio econômico. O ChatGPT mantém sua liderança no Ocidente devido à sua estabilidade, conformidade regulatória e maior gama de aplicações. Empresas e governos podem adotá-lo sem grandes preocupações com privacidade e segurança, tornando-o a escolha natural para setores regulados, como saúde e finanças. Por outro lado, o DeepSeek se mostrou um adversário formidável, especialmente por sua precisão, eficiência e baixo custo operacional. Se conseguir resolver seus desafios regulatórios e provar transparência na governança de dados, pode se tornar a principal alternativa ao ChatGPT, especialmente para empresas fora do eixo EUA-Europa.

Os próximos anos serão decisivos. A IA se tornou o novo campo de batalha entre Estados Unidos e China, e a resposta americana ao avanço da DeepSeek determinará o futuro da inovação global. O sucesso de um ou outro dependerá de quatro fatores críticos: conformidade com regulamentos globais de privacidade e proteção de dados, investimentos em infraestrutura e capacidade computacional, adoção por empresas e governos em larga escala e capacidade de inovação contínua e adaptação ao mercado.

E nessa batalha estratégica entre Leste e Oeste, o Brasil enxerga uma oportunidade única de aprendizado. Modelos como o DeepSeek, que provaram ser possível competir em IA com recursos limitados, servem como inspiração para o país. Motivado por essa abordagem, o Brasil busca criar suas próprias soluções tecnológicas, combinando a expertise global com um toque de inovação local. Como destacou a Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, o objetivo é transformar o conhecimento adquirido em um motor que impulsione a criação de modelos alinhados às demandas nacionais e às exigências regulatórias.

Essa visão arrojada não apenas fortalece a independência tecnológica do Brasil, mas também projeta o país como um protagonista no cenário global da inteligência artificial. A jornada inclui pilares estratégicos: construção de infraestrutura robusta, capacitação de talentos e atração de investimentos visionários. Ao se inspirar no sucesso do DeepSeek, o Brasil prova que criatividade e eficiência são ferramentas poderosas para vencer limitações e conquistar relevância global, mesmo diante de desafios econômicos e tecnológicos. A mensagem é clara: o futuro da IA no Brasil será guiado pela inovação e pela audácia de sonhar grande.

A inteligência artificial transcendeu o status de mera inovação tecnológica, tornando-se o principal instrumento estratégico na corrida pelo poder global. No tabuleiro dessa disputa digital, não se trata mais apenas de quem participa do jogo, mas de quem conseguirá moldar as regras e assumir o controle do futuro.

Walter Calza Neto, DPO do Corinthians.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.