A necessidade de rever os padrões de consumo da água é um alerta antigo, que se tornou real com a crise de abastecimento em alguns estados do país. As chuvas abaixo do esperado desde 2011 têm sido a explicação das autoridades para justificar a pior crise hídrica nos últimos 84 anos.
Segundo reportagem publicada no jornal Folha de S. Paulo, com 12% a 16% da água doce disponível na Terra, o Brasil é um país rico nesse insumo. Cada habitante pode contar com mais de 43 mil m³ por ano dos mananciais, mas apenas 0,7% disso terminam utilizados.
Nações como a Argélia e regiões como a Palestina, em contraste, usam quase a metade dos recursos hídricos disponíveis, e outras ainda, como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, precisam obtê-los por dessalinização de água do mar.
A participação da sociedade na tomada de decisões sobre os recursos hídricos é fundamental para um planejamento adequado do uso da água. Em 1993, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu 22 de março como o Dia Mundial da Água, já se apontavam os desafios relacionados à proteção desse bem essencial à vida humana.
No litoral do país, assim como nas regiões Sudeste e Nordeste, onde se concentram 70% da população, muitos centros urbanos já enfrentam dificuldades de abastecimento, agravados por secas como as que se abateram sobre São Paulo e sobre o Nordeste em 2012 e 2013. Segundo pesquisas, a possibilidade de faltar água nas torneiras do Estado de São Paulo é real e o sistema Cantareira só deve se recuperar a partir de 2016.
Um dos caminhos para um uso mais consciente da água, segundo especialistas, é o reuso. A água usada no enxague da máquina de lavar, por exemplo, pode ser reutilizada na descarga. Além disso, outra atitude necessária é o aproveitamento da água da chuva, inclusive com a construção de cisternas. Outro ponto fundamental é observar o consumo de produtos que utilizam muita água em sua cadeia produtiva.
Tempestade de dados
O período tradicionalmente chuvoso, que vai de outubro a março, foi caracterizado por uma estiagem atípica entre 2013 e 2014 em São Paulo. Em 2004 constava no documento da renovação da outorga do sistema à Sabesp, entregue pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) do Estado, um alerta sobre a insuficiência da Cantareira, sobretudo diante da excessiva dependência do sistema.
O comitê anticrise, formado por representantes da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Departamento de Água e Energia Elétrica de São Paulo (Daee), que monitora a seca, avalia que o sistema Cantareira tem 25% de chance de se recuperar a partir de 2016 – o que significa repor o volume morto e elevar a capacidade a 37%.
O volume morto é a reserva inativa do manancial, utilizada somente em situações de emergência. Esse volume está localizado abaixo dos níveis de captação.
No tratamento comum, a água passa por oito etapas: pré- cloração, pré-alcalinização, coagulação, floculação, decantação, filtração, cloração e fluoretação.
Sistema Alto Tietê, que abastece cerca de 4 milhões de pessoas na Grande São Paulo, também apresentou baixo índice pluviométrico, queda no nível das represas e alto risco de esgotamento.
Racionamento deve ser levado em consideração. O controle da demanda ainda é uma alternativa para minimizar o declínio dos níveis reservados.
Construção de novos reservatórios, como o sistema produtor de água São Lourenço, que ficará pronto em 2018, também é opção em longo prazo.
O aumento das chuvas em março e abril ajudou a recompor o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste, que são responsáveis por dois terços da geração hidráulica no Brasil, mas a situação não era tão crítica desde 2001, na véspera do último racionamento.
O Brasil é considerado um país que possui as maiores reservas de água do mundo, pertencendo em seus reservatórios a Bacia Hidrográfica do Guarapiranga que possui uma área de drenagem de 639 km² (63.911 hectares) e localiza-se a sudoeste da Região Metropolitana de SP, o estado de São Paulo contém outros reservatórios incluídos nos maiores mananciais da Região Metropolitana, como o Cantareira e o Billings.
As três categorias correntes de uso de água doce representam as seguintes porcentagens de consumo, com respeito às extrações anuais de água:
Uso em agronegócio 72 %
Uso em indústria 22 %
Uso doméstico (pessoal, familiar e municipal) 6 %
Demanda por água deve crescer 55% no mundo até 2050. Previsão faz parte de Relatório Mundial das Nações Unidas, que aponta também que, se nada for feito, as reservas para abastecimento devem encolher 40% até 2030.
Como a tecnologia pode trazer possíveis soluções para a crise hídrica
Naturalmente, são necessárias medidas estruturantes e obras de infraestrutura para que a situação da água seja aprimorada no país, mas soluções de tecnologia têm se mostrado muito úteis quando o assunto é água.
Algumas soluções já utilizadas ao redor do mundo mostram como diferentes aspectos da tecnologia tem sido aplicados para aumentar a eficiência na geração, distribuição e otimização no consumo da água.
Medidores inteligentes – O uso de medidores inteligentes no consumo da água, com peças de hardware desenvolvidas especialmente para tal, pode ser uma importante arma para conter a crise no desabastecimento. Estes medidores fazem a coleta de dados automática sobre o consumo, e podem apresentar relatórios e informações estatísticas em tempo real para o consumidor.
Nanotecnologia – A nanotecnologia também vem sendo estudada e utilizada para a purificação da água. Um time de pesquisadores do Instituto de Tecnologia da Índia criaram uma nanopartícula que atua no sistema de filtragem da água, e com o custo de apenas 16 dólares, têm a capacidade de remover componentes químicos da água, como chumbo e o arsênio.
Controladores de abastecimento – Controlar o abastecimento é uma das maneira mais eficientes de otimizar o consumo de água. Soluções de tecnologia utilizam termostatos e outros componentes que ajudam a economizar cerca de 8.800 litros de água por ano em residências e empresas. O sistema pode ser ajustado para um cronograma que atenda as necessidades de cada consumidor.
Análise de dados – O governo e as concessionárias possuem diversos dados sobre a distribuição e consumo de água. É importante garantir que estes dados estejam acessíveis a população para que instituições de pesquisa, empresas e desenvolvedores possam explorar os dados e criar soluções de análise que gerem insights úteis sobre a situação hídrica e possam servir como input para o planejamento e operação do sistema.
Leandro Faria, diretor da Datastorm, empresa do Grupo Stefanini.