Brasil Telecom não terá de ressarcir donos de linhas telefônicas, diz STJ

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A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Brasil Telecom, apesar de ser parte legítima para responder à ação civil pública, não terá de ressarcir consumidores que alegam prejuízos por adquirirem linhas da Telecomunicações de Mato Grosso (Telemat) com a promessa de emissão futura de ações da empresa ou da Telebrás.
A decisão segue entendimento do relator, ministro Luis Felipe Salomão, para quem o prejuízo experimentado pelos compradores, que receberam ações da tele local em vez de ações da Telebrás, decorreu de flutuações naturais do mercado de capitais.
Conforme destacou o ministro, o recurso julgado traz situação fática semelhante a dezenas de outros. "A análise de como vem se dando o deslinde dessas controvérsias evidencia a dispersão jurisprudencial sobre o tema no Brasil."
Enquanto no Rio Grande do Sul e Mato Grosso vêm se decidindo pela ilegitimidade passiva da Brasil Telecom, no Mato Grosso do Sul, a Justiça tem reconhecido não só a possibilidade de a empresa responder à ação, como a responsabilização dela pelos supostos prejuízos. O ministro Salomão classificou como "absolutamente indesejável" o dissídio jurisprudencial, porque nele está subjacente o "tratamento desigual a jurisdicionados com o mesmo direto alegado, na contramão dos mais caros alicerces do Estado Democrático de Direito".
Em voto minucioso, o relator resgatou, inicialmente, a farta jurisprudência do STJ no sentido de reconhecer a legitimidade do Ministério Público para propor ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos, sejam eles de natureza consumerista (como no caso) ou não.
Cisão parcial
Quanto à Brasil Telecom, antes de concluir pela legitimidade da empresa para responder por obrigações decorrentes de contratos celebrados pela Telemat, o ministro traçou um histórico do processo de privatização e reestruturação do sistema de telecomunicações no Brasil. No caso, o leilão da Telebrás tratou-se de cisão parcial, afirmou o ministro, já que a empresa que permaneceu em atividade atua ainda hoje no setor. Sendo assim, a Brasil Telecom é sucessora da Telemat, concessionária controlada pela Holding Tele Centro Sul – uma das 12 empresas resultantes da cisão parcial da Telebrás.
Analisando a legislação, o ministro destacou que o artigo 233 da Lei das S.A. (Lei n. 6.404/1976) resguarda o direito dos credores diante da cisão da companhia. O artigo permite que as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sejam responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem qualquer solidariedade, desde que não haja oposição por qualquer credor em 90 dias da data da publicação do ato de cisão.
No entanto, para o caso em análise, o ministro Salomão esclareceu que os termos e restrições à solidariedade entre a cindida e as incorporadoras constantes no protocolo de cisão (ou, como no caso, no edital de desestatização) pouco importam porque são inaplicáveis aos credores com título futuros da cindida, relativamente a negócios pretéritos.
O Ministério Público ingressou com a ação civil um ano depois que os papéis da Telemat foram emitidos ao compradores das linha telefônicas. Naquele período, o MP constatou desvalorização de 50% se comparados às ações da Telebrás. Porém, o ministro observa que poderia não ser assim. "Nos últimos 12 meses, as ações preferenciais da Telebrás amargaram queda de 54,74%", comparou, citando dados do site da Bovespa.
Entenda o caso
O Ministério Público de Mato Grosso ajuizou ação civil pública contra a Telemat. Na ação sustentou que, após o procedimento investigatório na Promotoria da Cidadania e Defesa Comunitária, impulsionado pelo apelo de um cidadão, constatou-se que, no ano de 1996, a empresa negociou 7,5 mil contratos de linhas telefônicas.
Segundo o MP, esses assinantes, ao adquirirem as linhas telefônicas, mediante pagamento de R$ 1.117,63, investiram na concessionária do serviço público de telecomunicações, sob a promessa de emissão futura de ações da empresa Telebrás. Porém, quando foram resgatar as ações, surpreenderam com a notícia de que as mesmas não eram da Telebrás, mas sim, da Telemat, cujo valor é bem inferior ao capital investido. Afirmou que, se fossem entregues ações da Telebrás, o comprador arrecadaria, à época, no mercado cerca de R$ 1.794, ao passo que os papéis da Telemat corresponderiam a apenas R$ 628.
O MP alegou que o contrato celebrado entre os consumidores adquirentes e a empresa contém, em sua cláusula IV, a possibilidade de entrega de ações da Telebrás ou somente da prestadora Telemat, com flagrante escolha unilateral da fornecedora. Assim, a tal cláusula seria abusiva e traria grande prejuízo aos promitentes-adquirentes. Por essa razão, pediu a nulidade daquela cláusula dos contratos celebrados em 1996 e a condenação da Telemat a restituir a cada um dos consumidores a diferença entre o valor das ações disponibilizadas e o montante investido na aquisição das linhas telefônicas, com os acréscimos legais devidos.
Decisão reformada
A 4ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá (MT) julgou procedente o pedido. A sentença foi mantida em grau de apelação ao entendimento de que seria nula, por abusiva, a cláusula que deixa ao arbítrio apenas de uma das partes a decisão acerca da espécie de ação a serem adquiridas.
Inconformada, a Brasil Telecom recorreu ao STJ sustentando ilegitimidade ativa do Ministério Público para ajuizar a ação. Alegou, ainda, sua ilegitimidade passiva, já que as obrigações pleiteadas foram assumidas antes da data da cisão e são de exclusiva responsabilidade da Telebrás, conforme edital de privatização. Por fim, argumentou que a obrigação seria alternativa, cabendo ao devedor a escolha da prestação e dela se liberando com o cumprimento de qualquer uma. Além disso, não seria conferido ao potencial acionista o direito de opinar sobre a forma de emissão das ações.

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