A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apresentou nesta segunda-feira, 5, uma proposta para eliminar brechas jurídicas que permitem que multinacionais não recolham impostos nos países onde operam, o que tem causado perdas de bilhões ao ano aos fiscos nacionais.
O projeto denominado Base Erosion and Profit Shifting (BEPS) obriga as empresas a revelarem seus esquemas de planejamento tributário agressivo. Trata, na realidade, da primeira reforma das normas fiscais internacionais em quase um século e será apresentada na quinta-feira, 8, aos ministros das Finanças do G20, que se reúnem em Lima, no Peru.
Se aprovada, a proposta representará um duro golpe para os gigantes do Vale do Silício, que vêm travando uma autêntica queda-de-braço com os governos europeus ao lançarem mão de estruturas fiscais legais, mas que têm estado sob crescente pressão política, particularmente na Europa. Um caso emblemático é a Irlanda, que se tornou um refúgio fiscal de empresas multinacionais que encontraram formas para evitar legalmente cobranças de impostos nos países onde está a maioria de seus clientes.
O Google e o Facebook, por exemplo, reduzem bilhões de suas cargas fiscais todos os anos ao mandar os lucros, por meio da Irlanda, para caixas postais em paraísos fiscais como Bermuda e as Ilhas Cayman, o mesmo ocorre com o LinkedIn que usa a Irlanda como rota para a Ilha de Man.
Economia digital
As novas regras não têm como alvo somente as empresas de tecnologia, mas empresas em geral que desfrutam de um regime fiscal especial porque geram receitas significativas em muitos países europeus, mas pagam relativamente pouco imposto de renda. Entretanto, as empresas de tecnologia são as que mais têm feito lobby para procrastinar a aprovação das novas regras, que terão um impacto tributário na economia digital. Mas, uma vez o programa em vigor, serão compelidas a pagar impostos. As novas regras também devem provocar mudanças estruturais na Amazon.com e na Apple, embora todas elas, inclusive Facebook e Google, sustentem que pagam os impostos devidos.
Executivos de várias empresas de tecnologia dizem que já estão considerando abdicar dos paraísos fiscais offshore, e declarar seus lucros em países como França, Alemanha e Reino Unido.
Embora a proposta represente um consenso entre os países membros da OCDE, ela terá de ser promulgada por meio de tratados fiscais, o que traz o risco de as autoridades fiscais nacionais interpretarem as novas regras de acordo com seus interesses. Tanto que alguns executivos de tecnologia externaram o temor de que as novas regras possam ser aplicadas de forma diferente por cada país. Isso poderá levar a novas disputas entre países sobre como tributar o lucro, inclusive disputas legais entre empresas e autoridades fiscais sobre quanto pagar.
Fim das brechas fiscais
No início deste ano, por exemplo, o Reino Unido implantou o que chama de imposto sobre lucros desviados, em antecipação das novas recomendações da OCDE. Os defensores do imposto dizem que ele está em linha com o programa da OCDE, mas um funcionário da organização advertiu à época de sua implementação que a abordagem do Reino Unido poderia minar seu plano multilateral.
A Irlanda também anunciou que, até 2020, eliminará progressivamente uma das brechas fiscais mais utilizadas, apelidada de "double Irish", a qual permite que empresas com operações no país paguem royalties de propriedade intelectual de uma filial irlandesa registrada em separado. A subsidiária, embora constituída na Irlanda, normalmente tem o seu domicílio fiscal em paraísos fiscais que não cobram imposto de renda.
Assim, muitas empresas de tecnologia, como Google, mantém uma única sede em um país com vantagem fiscal onde recolhem as receitas obtidas com clientes de outros países. Essas empresas não declaram essas receitas porque se beneficiam várias exceções no âmbito de tratados fiscais correntes. É exatamente esse tipo de estrutura que levou a uma briga entre Google e França.
A Amazon, que é alvo de uma investigação fiscal na União Europeia, é a primeira gigante da tecnologia a mudar sua estrutura. No início deste ano, a empresa começou a recolher impostos sobre as receitas obtidas com clientes em vários países da Europa, incluindo o Reino Unido, Alemanha e França, em vez de canalizar tudo para o paraíso fiscal de Luxemburgo. Com informações de agência de notícias internacionais.